Memória – Achados do Arquivo: o largo tem história e não apenas de pescador

Cartão Postal de Piracicaba, sem informações de data, com a imagem de um pescador no Rio Piracicaba, elaborado pela então Coordenadoria Municipal de Turismo. CRÉDITO: Arquivo Histórico da Câmara

 

Na semana do Dia do Pescador, a série Achados do Arquivo rememora o projeto de lei que denominou o largo mais famoso da cidade

 

 

Em 4 de agosto de 1949, o então presidente em exercício Guilherme Vitti recebe um ofício do prefeito Luiz Dias Gonzaga com os seguintes dizeres:

 

“Para aprovação dessa ilustre Câmara, tenho o prazer de passar às mãos de Vossa Senhoria, um projeto de lei desta Prefeitura, dispondo sobre a denominação de Largo nesta cidade.

 

O projeto de lei mencionado pelo então prefeito era o de número 29/1949 e dizia respeito ao largo mais tradicional e mais piracicabano no que dispõe à religião, política, resistência e cultura da cidade:

 

“Art. 1º – Passa a denominar-se Largo dos Pescadores o logradouro situado no início da rua Morais Barros, onde esta encontra a Rua do Porto”.

 

Mais interessante do que a lei em si, é o projeto que a gerou, pois são nesses projetos que se pode identificar as intenções dos proponentes por meio das justificativas. Foi o que Luiz Dias Gonzaga fez:

 

“A ideia, manifestada verbalmente, já encontrou eco em nossa imprensa, que a considerou uma feliz homenagem da cidade aos homens da rua do Porto que se dedicam à pesca. Quanto ao local, é dos mais próprios, sendo mesmo tradição que ali, no barracão fronteiro ao antigo prédio do Clube de Regatas, outrora se reuniam os pescadores para a venda do peixe. Com a justificativa supra espera, pois, esta Prefeitura a aprovação dessa ilustre Câmara.”

 

Para ratificar o que justificara acerca do apoio da imprensa, o Luiz Dias Gonzaga jogou a rede e anexou junto ao projeto uma pequena reportagem datada em 16 de julho daquele ano. A manchete trouxe a seguinte frase: “Realiza se hoje no rio Piracicaba a tradicional Festa do Divino – Inteiramente calçada a rua Morais Barros – O Largo dos Pescadores.

O texto da matéria se inicia com os seguintes dizeres:

 

“No velho e poético cenário da rua do Porto, será realizada hoje á tarde mais uma festa do Divino Espírito Santo, solenidade que os imigrantes portugueses trouxeram das ilhas dos Açores e que se arraigou em varias cidades do nosso e de outros Estados, constituindo para elas uma das mais interessantes e carinhosas tradições. Piracicaba sempre cultivou essa tradição, esmerando-se os ‘festeiros’ em fazer da Festa do Divino uma grande manifestação de fé e religiosidade do nosso povo”.

 

A matéria continua dando destaque para a rua Morais Barros, com o seguinte subtítulo: “Inteiramente calçada a rua Morais Barros”,que naquela gestão de Luiz Dias Gonzaga, havia sido calçada com paralelepípedos até a beira do rio, “apresentando agora um aspecto mais urbano e bonito”.

 

E segue um outro destaque, seguido da abertura de mais um subtítulo, agora para o “Largo dos Pescadores”, que até aquele momento, era conhecido e reconhecido por todos, mas que ainda não havia sido denominado oficialmente pelo poder público.

O texto começa da seguinte maneira:

 

“O pequeno largo no qual tem inicio a rua Morais Barros também foi calçado e recebeu o adequado nome de Largo dos Pescadores, escolha do próprio sr. Luiz Dias Gonzaga, prefeito municipal que oportunamente proporá a Câmara a aprovação desse nome, que deverá ter o beneplácito de nossos edis, pois foi uma denominação feliz e representa uma homenagem da cidade aos homens da rua do Porto que se dedicam á pesca, rude e ingrato trabalho para nos prover desse valioso alimento que é o peixe.”

 

Seguindo os trâmites internos da Casa Legislativa, o projeto de lei recebeu o parecer da então Comissão de Comércio, Indústria e Obras Públicas, cujo o conteúdo se resumia em:

 

“A Comissão de Comércio, Indústria e Obras Públicas tem o prazer se pronunciar-se favorável ao Projeto de Lei […] Não seria mais feliz a iniciativa do Sr. Prefeito Municipal, porquanto aquela denominação vem de encontro a uma velha tradição daquele local que serviu de ponto de concentração aos pescadores para a venda de seu produto em tempos idos. É justíssima e das mais merecidas a homenagem que se quer prestar à humilde, mas nobre classe dos pescadores piracicabanos.”

 

A Câmara pescou com êxito o projeto de lei, pois os vereadores, fisgados pela ideia e não querendo ficar como peixes fora da água, discutiram e aprovaram em 1ª e 2ª discussão com dispensa de nova redação, e em 26 de setembro de 1949 o presidente da Câmara Aldrovando Fleury Pires Correa encaminhou ofício com a redação em anexo para Luiz Dias Gonzaga sancionar e promulgar a Lei 80 de 27 de setembro de 1949.

Outrora conhecido como Largo do Porto, foi ali que a então povoação de Piracicaba, a partir do ano de 1784, se estabeleceu e iniciou seu progresso, iniciando-se a partir da mudança de margem para o lado “de cá do Rio logo abaixo do salto, onde [há] terreno mais commodo para o dito estabelecimento”.Assim era chamado, por estar junto ao porto em que as embarcações que subiam o rio paravam antes do salto que impede a navegação. Ali, os barcos eram carregados e descarregados. Era o ponto de ligação no trajeto Itu-Araraquara.

Foi ali, no largo, que gerações de pescadores se desenvolveram, criaram suas famílias, fizeram suas histórias. Foi ali, próximo ao rio, que milhares de piracicabanos por décadas buscavam seu peixe de cada dia.

Atualmente o Largo dos Pescadores transborda toda essa história em sua diversidade religiosa, cultural, social e política. É ali que acontece a tradicional Festa do Divino, o Festival Cural, Festa do Pastel, bem como outros eventos culturais, sociais, bem como manifestações políticas.

ACHADOS DO ARQUIVO – A série “Achados do Arquivo” se pauta na publicação de documentos do acervo do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo, ligado ao Departamento Administrativo. A iniciativa do Setor de Documentação em parceria com o Departamento de Comunicação Social, com publicações no site da Câmara às sextas-feiras, visa tornar acessíveis ao público as informações do acervo da Casa de Leis.

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