João Salvador
Quando se diz que uma tragédia se repete depois de longos anos, desmantela a tese do aquecimento global ou das mudanças climáticas. Se o fenômeno é cíclico, vai se repetir, porém, com a previsibilidade, basta soar o alarme com antecedência para evitar ou, pelo menos, amenizar nova tragédia.
O inchaço das grandes metrópoles, quando desordenado, os mais carentes são empurrados, sem a mínima infraestrutura, para a periferia e encostas, que, normalmente, são formadas por rochas impermeáveis, de origem basáltica, cobertas com uma pequena camada de terra, formada pela intemperização dessas rochas ao longo do tempo. O solo sendo raso, diante de chuvas pesadas e contínuas, satura-se rapidamente e o deslizamento é inevitável, causando o assoreamento dos mananciais. Esses corredores ou acumuladores de água, com um volume além da cota de inundação, o excedente se extravasa, dando margem as inundações a jusante.
O que carece, na realidade, é um planejamento sério, um engajamento entre o poder público e técnicos competentes, em parceria com as universidades, para que sejam estabelecidos mapas geográficos, geotécnicos e hidrológicos, controlando o uso da ocupação dos solos, com atenção maior às áreas de riscos, como várzeas e encostas, para que não haja grande interferência humana.
Saibam que a natureza leva centenas de anos para pulverizar uma rocha e formar as camadas de solo, sujeitas a se perderem pelos deslizamentos. Quando a rocha é desnuda, novo ciclo de intemperização recomeça, levando outras centenas de anos para formar uma nova porção de terra cultivável.
Nas áreas inundadas, a água pode demorar tempo para baixar de nível, porque o lençol freático — água subterrânea — também fica alto, tornando a infiltração da água de superfície mais lenta. Nas cidades planas e alagadas, a impermeabilização, pela camada asfáltica, dificulta também a infiltração da água. Basta dizer que 600 mililitros de água chovida é equivalente a 600 litros de água por metro quadrado, um “mundaréu” de água. Diante das tragédias, o momento não é propício à exploração política e ecoterrorista, com troca de farpas entre os adversários. O momento deve ser de solidariedade, de união, da ação dos governos federal, estadual e municipal, no que urge a ser feito, sem contar com a participação de civis e militares, empresários e judiciário, em consonância com a voluntariedade do povo. Como qualquer ser vivente tem o direito à vida, todos devem ser resgatados, ninguém ficar para trás, apenas a lamentação pelas vidas perdidas.
_____
João Salvador, biólogo e articulista