João Salvador
Quem contrai a dengue pela segunda vez, o sistema imunológico pode entender que se trata de uma infecção igual à anterior, mas, se provocada por um sorotipo diferente do vírus – existem quatro tipos –, a resposta imune é ineficiente.
O assunto é muito sério porque o Brasil se aproxima do recorde histórico de casos de dengue e o pico ainda não foi atingido, enquanto que os mosquitos ainda esvoaçam em onze unidades da federação. Por essa razão, é preciso gritar nos ouvidos dos alheios e passivos, para que diante dos casos graves de dengue, se associem aos agentes de orientação para o controle dos mosquitos. É inadmissível desdenhar e nada fazer para eliminar os criadouros desse perigoso hematófago.
Esse alvinegro zebrado não dá trégua. De voos rasteiros, sempre atraídos pelo dióxido de carbono exalado do solo e pelos vasinhos sanguíneos da derme humana, chegam ao ponto de sucção. Ele pousa nos seus hóspedes de maneira sutil, sem muito alarde e sua picada é quase imperceptível, indolor, com uma leve coceira, na pior das hipóteses, uma erupção cutânea. Por voar baixo, sua decolagem se concentra mais nos pés, pernas e tornozelos.Tem uma boa autonomia de voo, que o permite deslocar para uma relativa distância. Acessa os lugares mais altos, através de elevadores e escadas, de carona em sacolas e na roupa dos que escalam os degraus.
O “capitão do mato” de outrora, hoje possui um título de “cidadão indesejável”, como uma das piores pragas urbanas. Em razão do desmatamento, escolheu o ambiente urbano para zunir, onde encontrou fartas unidades de “hemonúcleos de sucção”. Injeta na derme da vítima sua agulha, com a qual enche sua bolsa de sangue, para nutrir o seu banco de ovos, que ao eclodirem, novos vetores são formados. Aliou-se ao desleixo dos cidadãos de precário grau de consciência, que permitem sua proliferação na água contida em pneus, vasos de flores, piscinas sem cloro, nas casas sem ocupação ou em construção, pela a falta de limpeza de caixas d’água, de calhas entupidas, e, ainda, pelo desleixo com o quintal, com recipientes, às vezes imperceptíveis armazenadores de água.
Depois da desova, as fêmeas, na fase adulta, quando contaminadas, continuam a disseminar a doença. Os ovos do mosquito podem resistir a um longo período de aridez e o seu transporte para os lugares mais longínquos, se faz pela impregnação nos materiais transportados. Por essa razão, não basta apenas jogar a água de recipientes sem lavar bem as bordas internas.
As notificações sobre a dengue em Piracicaba são alarmantes, com aumentos diários de casos, já com quatro óbitos registrados e mortes suspeitas. Por isso, a prevenção deve ser implacável.
Nas medidas de controle, repercutidas na imprensa, também fornecidas pelos agentes da Secretaria da Saúde, sugerem que cada um faça a sua parte, até por denúncias. Em um ambiente de zunidos não se resolve no tapa, nem com uma cortina de fumaça, mas com repelentes e a aspersão de inseticidas seguros.
Sem larvas não tem mosquito e sem mosquito não tem dengue. Portanto, elimine os criadouros e peçam aos seus vizinhos que também o façam. Uma picadinha não dói, mas na seringa de absorção sanguínea desse díptero, pode trazer consequências gravíssimas, como dor de cabeça terrível, dores abdominais, prostração, náusea e vômitos, febre, fadiga, desidratação grave – beba muita água –, transtornos respiratórios, diarréia, queda da pressão arterial e sangramento espontâneo nas mucosas. Mas o pior de todos os sintomas é, indubitavelmente, a possibilidade de um “dengoso” vir a óbito pela complicação do quadro. Qualquer suspeita, pelos sintomas clássicos apresentados, o melhor mesmo é correr para ser socorrido. Não existe a cura para a dengue, apenas há como “remediar”, tratar os sintomas, sob a orientação médica.
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João Salvador, biólogo e articulista