Dirceu Cardoso Gonçalves
Deplorável. Essa a única palavra que nos ocorre dizer sobre a crise entre a atriz Larissa Manoela e seus pais. Não conhecemos e nem temos interesse de nos imiscuir na contenda e muito menos em sua motivação. Até porque são acontecimentos de foro íntimo que deveriam ter sido guardados no âmbito familiar, não para a busca de soluções, mas, pelo menos para evitar o superdimensionamento da desinteligência. Colocados aqui do lado de fora, sem conhecer detalhes do relacionamento dos membros da família e nem a situação do bolso deles antes da decolagem da menina para o o estrelato, seria leviandade tomar um dos lados. Só dá para considerar que, a partir de determinado momento, começaram os desentendimentos que, em pouco tempo se tornaram públicos e hoje alimentam programas de TV de abrangência nacional, colunas de fofocas e até as páginas de publicações ditas conservadoras. Afinal, a mocinha da estória é uma personalidade e, como tal, atrai o acompanhamento público de seus passos, coisa que não ocorre com pessoas anônimas, mesmo quando vivenciam problemas iguais.
Mas, convenhamos. O noticiário revela uma verdade desconfortável. Com ou sem razão – as três personagens dessa indigesta narrativa estão sofrendo. Perderam – oxalá não seja definitivamente – o carinho e a afeição das criaturas mais importantes de seu círculo pessoal. A filha observa que os pais não foram satisfatórios ou corretos ao cuidar do patrimônio amealhado com sua arte, a mãe vai ao extremo da emoção e pede que a filha esqueça ser ela sua mãe. Não dá para duvidar que todos estejam sofrendo e a tendência a assim permanecerem enquanto não se encontrar um ponto final para a desinteligência. Quando isso deverá ocorrer, ninguém, hoje, é capaz de prever com relativa verossimilhança.
Quem como eu e meu grupo de contemporâneos, já viveu algumas décadas, já viu muitas famílias naufragando na incompreensão normalmente gerada pela divisão do patrimônio. Quando faltam os patriarcas – que começaram e construíram tudo, as novas gerações entram em luta sob o signo da desconfiança de uns sobre os outros e, logicamente, na sensação de estarem sendo roubados. Evidente que no caso da atriz é o contrário. Seu trabalho foi que montou a fortuna e a certa altura houve o desentendimento com os pais que – certo ou errado – administraram tudo conforme a própria cabeça. É de se lamentar, mas devemos lembrar que no caso de Larissa sabemos do problema porque ela é uma figura pública que gera audiência ao ter seu caso esmiuçado. Mas problemas patrimoniais existem em maior número do que imaginamos. Não é só artistas e detentores de grandes fortunas; Conhecemos famílias pobres, que andam de fusquinha e moram em casas modestas que, mesmo assim, foram severamente perseguidas por parentes e conhecidos interessados em delas arrebatar o pouco que têm. Nos fóruns de todo o país existem muitos processos com essa motivação e o pior é que, em determinados casos, por falta de defesa ou de recursos para a defesa, os legítimos donos ainda acabam esbulhados pelos interesseiros.
Tenho a certeza de que todo leitor conhece pelo menos um caso de esfacelamento de famílias – tradicionais, modestas, ricas, pobres – pouco importa a sua situaçãom que acabam atracadas pelos achacadores que, sem qualquer razão, tentam lhes tomar o que construíram e, principalmente, o que herdaram. No caso de Larissa e dos pais o final deve ser diferente porque, mesmo supondo que pai e mãe apropriaram-se de seu patrimônio, a solução é uma questão de tempo porque a filha é herdeira natural dos pais e, nessa hipótese, tudo a ela voltaria na falta deles. Mas, mesmo assim, o ideal seria colocar água na fervura; encontrar verdadeiros amigos que pudessem os aconselhar e acabar com a desavença para a atriz voltar a “ter” pai e mãe, eles a possuir a filha de volta e, na medida do possível, voltarem a se respeitar e amar. Todos os pais investem tudo o que podem – e muitas vezes mais do que podem- para alavancar o desenvolvimento do filho na atividade para que leva jeito. Assim é com jogadores de futebol, artistas e outros. Larissa não nasceu atriz. Seus pais investiram tudo o que puderam para ela se colocar competitiva no meio escolhido. Além de gastar o próprio dinheiro (e até emprestado) para colocá-la compatível com o caminho escolhido, ainda deixaram os próprios afazeres para se tornar seus administradores e protetores em diferentes segmentos exigidos pela carreira. Logo, excetuando-se os deveres de relacionamento pais-filhos – é lamentável o que hoje está ocorrendo. A atriz, hoje de sucesso, jamais deverá esquecer o passado e principalmente os esforços e sacrifícios dos pais pela sua construção profissional. É evidente que deve ter voz ativa para decidir o próprio futuro, mas é uma injustiça esquecer o passado de construção. Baixem a bola todos e tentem recuperar o convívio familiar e não se esqueçam que, a totalidade dos seres humanos tem problemas, mas o ideal é seguir o velho conselho: roupa suja se lava em casa. Não permitam que a emoção os afaste pois q1uando vierem a compreender mais nuances da vida poderá não haver condição de recuperar o tempo perdido…
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Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves, dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo; e-mail: [email protected]