Adelino F. de Oliveira
Agreve dos servidores municipais de Piracicaba fez história, demarcando um intenso e belíssimo show da democracia. Os servidores ergueram a voz, ousando afirmar, em um contexto de regressão de direitos, o lugar central dos direitos de cidadania! Os cartazes, as palavras de ordem, as músicas, os ritmos, os diálogos, os discursos, os megafones, as crianças brincando, os sorrisos trocados, as vozes plurais, os corpos em movimento, os olhares vibrantes e os corações cheios da mais profunda esperança deram o tom de uma mobilização que tomou a cidade, ocupou noticiários, as mídias e redes sociais em torno de um amplo debate sobre democracia, direitos e liberdade.
A greve representou o contundente grito de insatisfação geral em relação à política neoliberal, com a concepção de Estado mínimo, que tem dado o direcionamento das ações da atual gestão no município. A política de desmonte dos serviços públicos e a desvalorização dos servidores já alcançaram um nível insuportável. A greve significou esse grito de basta! Uma greve com pauta ampla, que além de reivindicar uma correção salarial justa, capaz de repor minimamente perdas acumuladas, também denunciou o processo de sucateamento e desmonte dos aparelhos públicos da cidade. Nunca foi uma mobilização apenas por salários, mas também pela qualidade dos serviços públicos prestados à população.
Os servidores, reunidos no Centro Cívico, demonstraram que a democracia ainda está viva, de maneira intensa e vibrante. A greve, além do debate em torno das reivindicações como reposição salarial e condições dignas de trabalho, formatou também um espaço de discussão de ideias, de proposições fundamentais, de diálogo democrático. Em cada manhã os servidores, renovados pelas energias de uma luta coletiva, encontravam-se para repensar a cidade, em uma aula aberta de democracia participativa e de defesa dos direitos de cidadania.
Nem toda decisão legal é também justa. Considerando os serviços públicos como essenciais, o poder judiciário arbitrou pelo fim da greve. Esse é o ponto: os serviços públicos são realmente essenciais. Devem, portanto, ser valorizados e reconhecidos pelo bem social que produzem. A decisão do judiciário pode se colocar como um documento importante, ao revelar que os serviços públicos não podem ser negligenciados. Mas não basta o reconhecimento meramente teórico, é urgente que a gestão municipal promova a valorização em forma de salário, em condições dignas de trabalho e qualidade dos serviços à população.
No limite, a greve colocou em pauta o debate sobre a concepção de sociedade que deve prevalecer, defendendo uma cidade aberta, tolerante, atenta aos direitos humanos. Os trabalhadores se organizaram em defesa de seus direitos, como também em defesa de uma cidade profundamente democrática, comprometida com os princípios da justiça e do direito. A greve ensinou que os rumos da cidade e a gestão da coisa pública não podem ser pensados de maneira arbitrária por homens em seus gabinetes fechados, sem ouvir os anseios e as demandas da população.
Os servidores municipais fizeram história, construindo uma greve que já se tornou emblemática nacionalmente, firmando-se como um importante símbolo de resistência e luta. Fazendo justiça ao nome do Centro Cívico, os servidores públicos de Piracicaba deram um verdadeiro show de democracia e cidadania, semeando os bons frutos da ética e da justiça social. O tempo se abre para novos projetos! A greve foi um marco, tornou-se histórica! Os servidores são o sujeito da história que, a partir de um movimento direcionado, transformaram a forma de ler e entender a cidade, perspectivando um ambiente aberto, diverso, onde o autoritarismo, o mandonismo e a imposição definitivamente não cabem!
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Adelino Francisco de Oliveira, professor no Instituto Federal, campus Piracicaba. Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião. E-mail: adelino.oliveira@ifsp. edu.br. Mídias sociais: @Prof_Adelino_