“Vem celebrar, é festa no terreiro!”

Rafael V. Proette

 

Eu não sei por onde começar. Eu, realmente, não sei. Como de costume, anotei no meu caderno muitos pontos a desenvolver neste texto, mas não sei se vou conseguir. Fui tomado por uma emoção indescritível, que me fez chorar do começo ao fim do Ensaio; e que não tem me permitido um raciocínio necessário para escrever. Eu ainda estou, inexplicavelmente, muito emocionado..
É claro que falar de cura, neste momento em que estamos, emociona qualquer um. Depois de dois anos lutando contra inimigos invisíveis (e visíveis, também), cantar rituais de qualquer tipo de cura, chega a cada pessoa de um jeito diferente. Foram dois anos em que buscamos a cura física, mental, emocional, espiritual. E buscamos na fé, na ciência, na arte. Este é um tema atual, com um samba poderoso. Ahh esse samba… como eu posso ser indiferente a ele? É preciso muito cuidado para falar de espiritualidade, de cura através do espiritual. É preciso a sensibilidade de entender qual o lugar que isso ocupa. É acima de nós, é necessário muito respeito. E os compositores deste samba fizeram isso com maestria ao pedir a benção a Obaluaê e evocar “o povo de Aruanda”. É impressionante o quanto esse samba se tornou maior do que já era. Emoção parecida, eu só sinto quando estou de frente a uma entidade. A sensação era a mesma. Certamente, o “povo de Aruanda” estava por lá…
Da Comissão de Frente à última ala que entrou no Anhembi… tudo estava perfeito. Os bailarinos, de roupas brancas, transmitiam tanta paz. As alas coreografadas, que remetiam a gestos de Orixás. O quadro de casais, cada um com suas características, mas igualmente impecáveis. Um destaque especial para Pedrinho e Sandy por tanta segurança na Avenida; Pedro, que risca aquele Anhembi com uma facilidade impressionante e traz o dom da dança em suas veias; Sandy, tanta delicadeza e leveza, parece que flutua. A Ala “Inclusão Social”, que é o próprio gesto de amor citado no samba.
É impossível não comentar o trabalho espetacular do mestre Rafa, à frente da sua Bateria com Identidade. Me lembro de, no ano passado, assistir a trechos dos ensaios, que eram postados em redes sociais. Eram alguns segundos que já me faziam imaginar como tudo ficaria depois de pronto. Mestre, diretores, ritmistas… eu não sei o quanto vocês ensaiaram, mas acredito que incansavelmente. Só queria dizer que valeu a pena, tá? As bossas, as paradinhas da bateria, trouxeram ainda mais intensidade para esse samba.
A entrega da Comunidade contagia a quem assiste, talvez porque seja um sentimento que todos nós compartilhamos. Não havia diferença entre quem estava entre as faixas amarelas e quem estava nas arquibancadas. A emoção estava presente dos dois lados, o sorriso entre lágrimas, também. Era uma celebração, uma oração, um ato de fé, de agradecimento por estar lá… tendo a chance de comemorar. Foi o final feliz que todos nós esperávamos.
Quando a ala “Amantes da Madrugada” passou por mim, eu me arrepiei. Aquelas pessoas eram o mais fiel retrato dos versos: “o povo cantando em oração, a alma e o brilho no olhar”. Eles eram esse povo que tem alma e brilho no olhar. Pra fechar uma ideia do carnavalesco Paulo Menezes que trouxe as bandeiras da torcida furacão pra fecha desfile.
É, Rosas de Ouro, o samba tem mesmo o dom de curar!
Eu ainda estou extasiado…
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Rafael Vinicius Proette, componente da escola de samba Sociedade Rosas de Ouro, líder comunitário

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