Quem tem medo da democracia?

Adelino Francisco de Oliveira

 

Não é preciso temer a democracia! Às vezes a sociedade parece ter medo da democracia. Há um receio de que, sem uma direção firme e centralizada, todos iriam se desviar, levando a organização social ao caos. Como se as pessoas tivessem que estar sempre sob intensa vigilância, com a liberdade tolhida. É preciso ressaltar que a democracia é, além de tudo, uma força criativa, propulsora de novas possibilidades. Isso pode assustar, especialmente os setores conservadores, que buscam concentrar poder.

O medo da democracia é alimentado, sobretudo, por aqueles que almejam um poder absoluto, sem espaço para interlocutores nem contestações. Os autoritários temem a democracia. Os que anseiam por se tornarem ditadores também detestam a democracia. Todos os projetos pessoais de poder, sem compromisso com o senso de cidadania, de autonomia popular, de bem coletivo obviamente desprezam a democracia. Historicamente a direita, com seu projeto de exploração e opressão, sempre foi profundamente antidemocrática.

Interessante que a democracia muitas vezes pode passar a ser combatida inclusive por aqueles que, justamente, apresentam-se como defensores dela. São aquelas lideranças que se projetam acima da vontade popular. Como se o povo tivesse sempre que ser guiado, conduzido, orientado. É a visão política que reduz o povo à condição de mero rebanho, considerado incapaz de ter alguma perspectiva de autonomia.

O centralismo democrático, estruturando a luta política a partir de uma forte e inconteste orientação central e burocratizada, foi uma referência no contexto de se entender que as massas livres se desviariam facilmente do projeto revolucionário. Essa é uma concepção que esteve em disputa no campo da esquerda, mas que ainda atrai seguidores. Há um paradoxo, se a centralização de decisões pode trazer uma linha mais coesa e revelar certa unidade, ela também pode tolher a ousadia, a criatividade, a força de ações espontâneas, capazes de impulsionar e provocar as mudanças almejadas.

As forças políticas mais criativas e comprometidas com a transformação social despontaram sempre na defesa da ampliação de liberdades democráticas. Os próprios partidos políticos, ao menos aqueles que se colocaram em oposição ao regime ditatorial, buscaram se constituir a partir do fortalecimento de uma democracia interna. Essa é uma questão central para os partidos do campo da esquerda: criar mecanismos que possibilitem garantir e ampliar a democracia interna partidária, avançando em representação na diversidade.

A democracia é sempre uma força de renovação, que lança a sociedade e suas instituições, inclusive partidárias, para dinâmicas abertas e inusitadas. A democracia não pode ser reduzida a um mero conceito abstrato, sem base na realidade social. Postular à democracia guarda consequências sociais e políticas reais. Quem tem compromisso com o ideal de justiça e direito não precisa temer a democracia. O fundamental é sempre aprofundar e intensificar a formação para a cidadania política, de maneira a dar cada vez mais condições teóricas para que o povo possa avançar e aprimorar as concepções em torno de um mundo profundamente democrático.

Só teme a democracia aqueles que acalentam projetos pessoais de poder e dominação. Transparência, ética e equidade são pressupostos para debates abertos e democráticos, livres de esquemas de manipulação, vislumbrando a vontade geral. A cidadania ativa desvela-se como um caminho para se avançar em direção à democracia de alta intensidade, com plena participação popular. A democracia é socialmente pedagógica, ensinando o primado dos consensos, das construções mais coletivas, do senso de pertencimento.Esse é o caminho!

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Adelino Francisco de Oliveira, Professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião; [email protected]; @Prof_Adelino_; professor_adelino

 

 

 

 

 

 

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