Rodolfo Capler
Em 2015, David Brooks, colunista do The New York Times, publicou The Road to Character (em português, “O caminho para o caráter”), livro magistral que aborda o modo como a sociedade contemporânea concebe o conceito de pecado. Brooks, apesar de não se considerar religioso, defende a ideia de que a noção de pecado é essencial para que se tenha uma visão honesta da natureza humana.
Segundo o colunista, “hoje a palavra “pecado” perdeu o poder e fantástica intensidade. É geralmente mais usada no contexto de sobremesas que engordam. A maior parte das pessoas nas suas conversas cotidianas não fala muito sobre o pecado individual”. Infelizmente, a ausência da noção de pecado individual reflete na má construção do nosso caráter. Isso porque, de acordo com a tradição da espiritualidade cristã -que se respalda na Bíblia Sagrada e no pensamento de Agostinho -,o pecado é congênito no ser humano. Logo, o mal não se localiza em gênese, nas estruturas da sociedade – desigualdade, opressão, racismo, e por aí adiante – mas dentro do peito humano.
Tal entendimento nos torna responsáveis diante de nossas ações, pois, desde tempos imemoriais, as pessoas granjearam glória com grandes conquistas externas, porém construíram caráter lutando contra os seus pecados internos. As pessoas tornam-se sólidas, estáveis e dignas de respeito próprio porque derrotaram ou pelo menos lutaram contra os seus “próprios demônios”.
Sendo assim, o conceito de pecado é uma peça necessária em nossa mobília mental e com ele o método tradicional de construir caráter é edificado. A noção de pecado não é cara apenas ao discurso religioso; é também necessária para o bom andamento das relações sociais. Caso contrário, o mal tão presente no mundo se banaliza, como já nos alertara Hanna Arendt.
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Rodolfo Capler, teólogo, escritor e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP; e-mail: [email protected]