José Renato Nalini
A partir de um dos raros consensos brasileiros, o de que a educação é a mais importante causa a ser enfrentada, surge a questão: ensinar o que?
Quando se entregou ao Estado a missão primordial de educar, aceitou-se o risco de uma padronização do ensino. A moldagem do alunado por uma visão paternalista ou de qualquer outro viés autoritário. Valores que interessam ao transitório chefe do poder são estimulados numa gestão e rechaçados em outra.
Ainda quando a cargo de governos socialistas, essa concepção de que a escola pode formatar indivíduos com determinadas características é elitista. Para implementá-la, é necessário o uso de novas táticas, o que “acarreta a criação de novas hierarquias de peritos técnicos, os ‘engenheiros da alma humana’, criadores e formadores deliberados do ‘novo homem’”, como enxergava Isaiah Berlin. Para esse pensador, isso equivaleria à “vida do formigueiro, com todas as suas consequências – a mecanização, a alienação, a desumanização de sociedades inteiras, manipuladas por persuasores ocultos (e às vezes nem tão ocultos); e o despotismo tecnocrático ou comercial”.
O pleito por uma sociedade mais humana é legítimo. Uma educação que permita à criança e ao jovem desenvolver suas potencialidades em busca de plenitude, sempre com o nítido interesse de aprimorar o convívio. Uma educação que ensine a respeitar o próximo, a se condoer com o sofrimento alheio, a ter comiseração, compaixão, muito mais do que a vaga empatia.
Toda a humanidade está imersa numa única e idêntica viagem. A mudança fatídica de rota afetará a todos. O aquecimento global é um fenômeno bem democrático: afeta a todas as espécies de vida que se desenvolveram neste planeta.
Se governantes despreparados, insensíveis ou mal-intencionados não dão aos apelos da ciência o interesse devido, se não querem observar a normatividade que já levou o Brasil aos píncaros do reconhecimento internacional, uma educação de qualidade será o melhor antídoto à reiteração de más escolhas.
A educação do século XXI não pode continuar a ser o adestramento de mentes infantis criativas, para inculcar nelas a única valia da memorização e privá-las de pensar por si próprias. É muito fácil melhorar o Brasil: basta que a cidadania assuma as rédeas da educação, assunto de extrema seriedade e que não pode permanecer à mercê das vontades oscilantes do governo.
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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL); foi presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo