Armando Alexandre dos Santos: a história de quem estuda e ensina História

Armando Alexandre dos Santos – Crédito: Divulgação

JOÃO UMBERTO NASSIF

Licenciado em História e em Filosofia (Centro Universitário Claretiano, Batatais, 2010 e 2017). Pós-graduado lato sensu em História Militar (Universidade do Sul de Santa Catarina, 2015). Doutor pela Universidade de Alicante (área: Filosofia e Letras; programa: Transferências Interculturais e Históricas na Europa Medieval Mediterrânea, 2018). Professor do curso de Graduação em História e do Programa de Pós-Graduação (lato sensu) em História Militar da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). Jornalista profissional (MTb 36.265). Membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (2009), do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (1994) e da Academia Portuguesa da História (2016). Membro do Grupo de Pesquisa do CNPq “Arte, Filosofia e Literatura na Idade Média” coordenado pelo Prof. Dr. Ricardo da Costa (UFES). Utiliza literariamente, a par do seu nome civil, os pseudônimos “A. de França Andrade” e “Alex Monteiro de Castro”. É membro da APL Academia Piracicabana de Letras e do IHGP —  Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba. O Professor Dr. Armando Alexandre dos Santos tem uma produção que reúne apuradas pesquisas e um impressionante volume de obras: cerca de 100 livros publicados, 50 artigos científicos, e aproximadamente 1.000 artigos publicados em jornais de renome. Exímio palestrante. Cativa a plateia desde suas primeiras palavras.  Em A Tribuna, há vários anos, escreve a coluna “Educação & Afins” todos os sábados. (Mais detalhes de suas obras e trajetória são encontrados no site Currículo Cesar Lattes, no endereço eletrônico http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4493450J )

Incansável, Armando Alexandre dos Santos está lançando mais um livro em que resgata parte da História do Brasil. Em um trecho do prefácio, elaborado pelo Príncipe Rafael de Orleans Bragança, temos o texto: “o livro que agora é publicado procura resgatar a figura histórica de Dom Luiz de Orleans e Bragança, que nasceu em Petrópolis no ano de 1878 e que entregou a sua alma a Deus, com apenas 42 anos de vida, no ano de 1920, no exílio, em Cannes.

Dom Luiz era filho da Princesa Isabel e do Conde d´Eu e ficou conhecido como o Príncipe Perfeito. Lutou na Primeira Guerra Mundial e contraiu uma doença terrível nas suas trincheiras. Morreu ainda jovem para cumprir o seu dever. O senso do dever e um profundo amor aos princípios ressaltam da leitura das páginas deste trabalho. E é justamente o senso do dever e o amor a uma grande causa que precisam ser cultivados, nos nossos dias, pela juventude brasileira.

Os exemplos são uma excelente forma de suscitar nos jovens o desejo de se dedicar aos grandes ideais. Assim, considero bastante oportuna a recordação dessa figura histórica que o Prof. Dr. Armando Alexandre dos Santos, após rigorosa pesquisa, oferece aos brasileiros.

Felicito o Professor Armando, que durante tantos anos tem consagrado a sua inteligência na produção de uma obra importante para a História do Brasil e, muito especialmente, para aqueles que amam a nossa Pátria.

Recomendo a leitura desse livro a todos os brasileiros, em especial os jovens, que desejem conhecer a vida exemplar do príncipe e soldado do qual tenho orgulho de ser bisneto.

Rafael de Orleans e Bragança

 

 

Hoje, Sua Alteza Real o Príncipe Dom Rafael de Orleans e Bragança, quarto na linha de sucessão ao Trono e à Coroa do Brasil. Nascido na Imperial Cidade de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro, a 24 de abril de 1986, o Príncipe Dom Rafael Antonio Maria José Francisco Miguel Gabriel Gonzaga de Orleans e Bragança é o terceiro dos dois casais de filhos do Príncipe Dom Antonio de Orleans e Bragança, terceiro na linha de sucessão ao Trono, e de sua esposa, a Princesa Dona Christine de Ligne de Orleans e Bragança, além de sobrinho do Príncipe Dom Luiz de Orleans e Bragança, Chefe da Casa Imperial do Brasil.

Seguindo a tradição do ramo brasileiro da Dinastia Bragantina, Sua Alteza foi batizado na Igreja da Imperial Irmandade de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, no Rio de Janeiro, tendo por padrinhos seu tio, o Príncipe Dom Francisco de Orleans e Bragança, irmão de seu pai, e sua tia, a Condessa Philippe de Nicolaÿ (nascida Princesa Sophie de Ligne), irmã de sua mãe. Foi criado em Petrópolis, junto aos seus irmãos: o saudoso Príncipe Dom Pedro Luiz, a Princesa Dona Amélia (atualmente, Senhora James Spearman) e a Princesa Dona Maria Gabriela de Orleans e Bragança.

Após concluir seus estudos na Cidade Imperial, o Príncipe Dom Rafael ingressou no curso de Engenharia de Produção da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, bacharelando-se em 2010. Desde então, trabalha em uma grande empresa multinacional do ramo de bebidas, tendo atuado profissionalmente no Rio de Janeiro, em São Paulo e, atualmente, em Londres, capital do Reino Unido. Fluente em português, francês e inglês e compreendendo bem espanhol e alemão, o período em que viverá na Europa muito ajudará Sua Alteza a encontrar uma esposa dentre as Casas da realeza e da alta nobreza do Velho Continente, de acordo com as melhores tradições da Família Imperial Brasileira.

O Príncipe Dom Rafael também tem viajado por todo o Brasil, a fim de conhecer nosso País a fundo e travar contato com brasileiros das mais diversas origens, em preparação para o papel que a Divina Providência e a História lhe reservaram para o futuro – a Chefia da Casa Imperial do Brasil e, se for da vontade de Deus e do povo brasileiro, a posição de Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil –, sempre demonstrando total fidelidade aos princípios monárquicos, cristãos e morais que lhes foram passados por seus pais, avós e tios.

A Primeira Guerra Mundial, enquanto vivida, observada e analisada por um brasileiro que dela participou ativamente como voluntário: o Príncipe D. Luiz de Orleans e Bragança  (1878-1920).

Segundo filho do Marechal Gastão d’Orleans (Conde d’Eu) e da Princesa Isabel, teve uma vida breve, mas intensa e cheia de acontecimentos marcantes. Tinha 11 anos quando a proclamação da República determinou o banimento da Família Imperial, de modo que sua formação foi realizada em uma Academia Militar austríaca. Além de militar, destacou-se como intelectual, tendo publicado diversos livros, alguns dos quais premiados e que lhe garantiram considerável prestígio nos meios cultos europeus e brasileiros. Entre 1908 e 1914 desenvolveu intensa campanha pela restauração monárquica no Brasil, sobretudo atuando por meio de uma intensa correspondência e divulgando manifestos políticos. A campanha política do

jovem príncipe exilado granjeou-lhe simpatias em muitos meios intelectuais e militares e chegou a produzir um sentimento de insegurança em alguns círculos políticos da República. É bem possível que revelações de revelações de grande importância venham a público quando forem abertos – se é que algum dia o serão – os arquivos do Dr. Simplício de Mello Rezende (1873-1932) – distinto advogado e homem de letras que, embora nascido no Piauí, viveu quase toda a sua vida em Manaus, onde atuou como correspondente político e homem de confiança do príncipe exilado.

Armando Alexandre dos Santos reúne em sua obra o rigor científico, transmitindo com uma linguagem próxima ao grande público, onde descreve com o sabor jornalístico, e a perspicácia de ambos, historiador e jornalista. Um resgate de inestimável valor.

Armando, o seu interesse pela História tem uma explicação em um país como o nosso, onde o historiador é visto quase como uma figura exótica?

E de extrema importância observarmos que os erros que cometemos hoje já foram cometidos no passado. Se tivéssemos uma visão histórica séria, evitaríamos de repetir esses erros. Há professores das mais diversas áreas, e em especial de História, que narram “historinhas”, que são mais folclóricas do que reais, e essas narrativas o aluno leva para o resto da sua vida. É muito mais cômodo dar aulas contando “fatinhos engraçados”, atraem mais a atenção do aluno, deixando de lado uma pesquisa com fundamentos de formação moral, cívica, legitima do país em que vivemos. São “fatinhos” sem importância, que desviam o interesse dos grandes acontecimentos. Grandes vultos da História são seres humanos, sujeitos a acontecimentos banais, que ocorre ao homem comum, porem esses fatos não devem sobrepor a importância histórica daquele momento, ou daquele indivíduo. Infelizmente é comum alguns utilizarem-se desse sensacionalismo barato para criar algum tipo de comoção.

Como pedagogo qual é a sua opinião a respeito de profissionais, muitos excelentes, que pelo fato de conhecerem profundamente a matéria que lecionam, relegam as técnicas de ensino ministradas pela pedagogia?

Você tocou em um ponto muito interessante. Isso ocorre muito também quando o profissional escreve um livro em estilo acadêmico iço. Ele tem que pagar pela edição do livro. Que será mais um a constar em seu currículo. Em contrapartida, há jornalistas que escrevem um livro sobre História, que não é a especialidade dele. Porém usando a técnica de escrever do jornalista vendem 200.000, 300.000 exemplares. É muito comum quem publicou um livro acadêmico ficar enciumado. O professor de História, o historiador, fica sentido: “Como ele que não conhece o assunto vende 300.000 exemplares e eu que sou um especialista não consigo nem editar o meu livro. É por causa da linguagem. Se o professor se dirigisse ao grande público ele teria facilidade em vender o seu livro. Só que existe um bloqueio no meio acadêmico, eles têm horror a linguagem popular, a uma linguagem adequada à compreensão do público. Isso é coisa do Brasil! Na Europa não é bem assim. Grande historiador francês tem programas de televisão e uma vez por semana fazem programas históricos profundíssimos, destinados ao grande público!

Qual é a importância do estudo da História?

Quem ignora a História está condenado a repeti-la. Essa frase é profundamente verdadeira. Um historiador francês, já falecido, tinha um programa onde toda semana ele criava uma entrevista com um personagem histórico. Ele ia fazendo as perguntas e o personagem histórico ia respondendo as perguntas dele, sempre com frases tiradas dos documentos antigos. Ele montava um diálogo tal, que o público tinha a impressão de que o personagem estava sendo entrevistado por ele; Para o grande público era uma atração extraordinária. Por que os professores do Brasil não fazem isso também? Ficam naquela linguagem acadêmica, rebuscada, uma linguagem que só outro que é do mesmo ramo consegue entender! E depois se lamentam porque não tem leitores.

Isso é um pouco de esnobismo?

É esnobismo! Claro que é! Muitas vezes vamos consultar um profissional e ele pratica uma linguagem técnica sem nenhuma necessidade. O desnível de vocabulário entre as partes, os termos específicos, são gritantes! Muitas palavras poderiam ser expressas de forma conhecida pelo leigo.  Cada profissão tem o seu jargão próprio, isso é normal. Mas quando se vai falar com alguém que não é do meio, tem que mudar a linguagem, senão fica ininteligível. Não sou contra essas expressões técnicas porque são muito precisas. Elas muitas vezes são indispensáveis para a compreensão em profundidade de um tema jurídico, por exemplo. Só que na hora do profissional falar com seu cliente ou ele troca em amiúdes, ou não adianta! Lembro-me de certa vez em um tribunal de júri, o juiz questionou o réu: “Por que não acionou o inculpado? ”. O réu arregalou os olhos e não entendeu. O advogado dirigindo-se ao juiz perguntou-lhe: “ Vossa Excelência permite que eu me dirija ao réu interpelando-o? ”. O juiz diante da situação permitiu. O advogado dirigiu-se ao réu e perguntou-lhe: “- Por que você não botou ele no pau? ”. O réu não sabia o que era acionar, inculpado.

O que nós precisamos para que a História seja respeitada pelo brasileiro?

Primeiro que seja conhecida. Se não for conhecida objetivamente, em toda a sua grandeza, em toda a sua expressão, em toda sua força movedora dos espíritos, ela não vai ser valorizada. Ela precisa ser divulgada, nesse sentido, tudo que valoriza Tradições Brasileiras devem ser valorizados.

Há casos de documentos históricos, particulares ou públicos, que foram destruídos acidentalmente ou intencionalmente?

Em alguns casos pode ser a eliminação de provas. Assim como também pode ser falta de compreensão das coisas. Às vezes, a pessoa não vê o alcance histórico de alguma coisa que ela fez.

A falta de “elegância” de alguns funcionários públicos que ocupam cargos relevantes, é uma motivação para sepultar determinadas histórias o mais breve possível?

Claro!

A formação do professor de História é meio rasa?

É meio rasa e meio técnica também. A História é essencialmente uma ciência humana. Portanto envolve amor e ódio. Quando a gente interpreta um fato histórico. Quando se analisa um fato histórico, quando interpretamos um fato Histórico, quanso analisa um fato Histórico, sentimos ao mesmo tempo simpatia e antipatia, de certas coisas nós gostamos, de outras não. A História quando é bem entendida é algo que envolve profundamente a pessoa que escreve e a pessoa que a lê. Portanto é algo vivo. A História não é uma mera “decoreba” de datas e fatos como muita gente imagina. A História é muito mais rica!  Tem que haver por parte dos historiadores uma compreensão de que esses aspectos devem ser destacados. Há uma inglesa, já falecida, que viveu no Rio de Janeiro e depois viveu em Portugal Chamada Elaine Sanceau. O nome é francês, mas ela era inglesa. Ela escreveu 20 ou 30 livros sobre a época das navegações em Portugal. São livros muito sérios, baseados em documentação muito sólida, mas são livros que lemos como se estivéssemos lendo um romance! Ela era uma historiadora de formação jornalística, ela tinha feitp o curso de jornalismo e ela sabia mostrar os aspectos psicológicos dos personagens. Sem adulterar nada a História, sem inventar coisas que não estavam nos documentos. Ela conseguiu escrever de tal forma que o leitor entra na vida de cada personagem. Os livros dela são fascinantes! Eu mesmo editei dois livros da Elaine Sanceau. Isso faz com que a História fique viva, fique interessante. Existe uma linha, uma tendência. Existe uma linha, uma tendência, historiográfica relativamente nova, que começou a entrar nos últimos quarenta anos, chamada Nova História Cultural, é uma linha que se liga a linha historiográfica dos anais da França, mas é uma linha que valorizou os aspectos culturais, passou a analisar como tema histórico não certos fatos, mas certos costumes, longamente conservados através dos tempos.  Por exemplo, a História da Morte no Ocidente. Começa a analisar a morte desde o Império Romano até hoje. Ou então a História da Culinária. A História do Riso. A História da Medicina. Padrões Estéticos da Antiguidade e da Vida Presente, como foi mudando o critério de beleza. Você vê que é uma abordagem histórica inteiramente rápida, mas extremamente viva. Quem lê se interessa! Ainda recentemente adquiri um livro: “História do Banho e da Limpeza Corporal no Ocidente”. É extremamente específico, mas é muito interessante. Livros desses podem vender muito! Por que não se escreve mais? Se você é aluno de um mestrado de História e quiser fazer uma dissertação sobre um tema tão longo, a primeira coisa que o orientador irá dizer será: “Não amplie demais o tema! Faça um recorte no tempo! Se vai abordar o banho, faça um estudo entre entre 1440 e 1460! Pegue um documento da época, que fale disso, e desenvolva só nesse documento. Não amplie demais porque você vai se perder. Isso é o contrário do que deveria ser! Tem que ampliar para poder ter a perspectiva.

Com relação ao seu livro, recém-lançado, “DOM LUIZ na Grande Guerra”, com prefácio do Príncipe Dom Rafael de Orleans e Bragança, é um resgate histórico. Dom Luiz lutou pela França?

Ele lutou pelos aliados. Ele tentou lutar pela França, não foi permitido porque a legislação francesa discriminava os príncipes, por serem descendentes de antigas famílias que tinham reinado na França, na República Francesa não podiam ser funcionários públicos, nem servir nas forças armadas, nem sequer votar em uma eleição. Por isso, quando a guerra estourou, ele se apresentou ao presidente da República Francesa, Raymond Nicolas Landry Poincaré, e se ofereceu para lutar. O Presidente da República foi muito amável, disse-lhe que agradecia muito o oferecimento, mas que estava impossibilitado de atender. E recomendou a ele que procurasse o Exército Britânico, e se inscrevesse no mesmo. Lutavam pela mesma causa da França. Ele lutou no Exército Britânico.

Essa documentação chegou até a família de que forma?

Uma parte dessa documentação é dos arquivos da própria Família Imperial do Brasil. Há documentos que foram usados no livro provenientes de outras fontes: Instituto Geográfico Brasileiro, Museu Imperial de Petrópolis, na Fundação “Dona Isabel, a Redentora, situada no Rio de Janeiro, pesquisei na Unicamp, as fontes são várias, sendo que a principal é a documentação encontrada nos arquivos da Família Imperial Brasileira, aos quais eu tive acesso.

Sua Alteza Real o Príncipe Dom Rafael de Orleans e Bragança, que fez a apresentação do livro, é o que do Príncipe D. Luiz de Orleans e Bragança (1878-1920)?

É bisneto de Dom Luiz, trata-se de um jovem de 32 anos de idade, atualmente está passando uma temporada na Inglaterra, ele representa a esperança do Movimento Monárquico. O futuro está com ele.

Ele é solteiro?

Ele ainda é solteiro. Ele é na realidade o quarto na linha de sucessão. Tem dois tios mais velhos, depois seu pai e em seguida ele. Como todos os outros já têm mais de 70 anos, o futuro está com ele. O pai dele, Dom Antonio, que é um grande artista, no fim do ano passado, completou 70 anos de idade. Ele teve a vida ameaçada gravissimamente por causa da Covid-19, mas conseguiu escapar. Dom Rafael tem irmãs, a família prossegue. Se por acaso ele falecer a linha de sucessão tem outros ramos. A Linha de Sucessão do Império foi fixada na Constituição de 1824: a linha, a precedência, dentro de cada geração, primeiro os príncipes, depois as princesas, por ordem de idade. Havendo uma falta, na deficiência de um ramo, sobe na linha genealógica, desce na seguinte, tudo isso é muito claro. A Constituição de 1824 foi muito precisa, para evitar dúvidas.

Sob o seu ponto de vista, qual é a importância de um príncipe ou de um rei para o Brasil?

Esse tema renderia mais uma outra entrevista! Seria outro assunto: “Por qual razão eu defendo a Monarquia! ”. Fundamentalmente, a Monarquia é um regime em que a Nação se estrutura em bases familiares, enquanto a República vê a estrutura da Nação em bases de repartições públicas, é uma visão completamente diferente. Na Monarquia, a Nação é constituída por famílias, em uma República ela é constituída por indivíduos isolados dentro do Estado. Cada um responde diretamente ao Estado. Por outro lado, em uma República, a chefia de Estado é objeto de disputas.  Há uma luta para chegar à Presidência da República. Enquanto em uma Monarquia não existem lutas, existe uma designação da História, da Natureza, quem é que vai ser o herdeiro e esse herdeiro é preparado longamente pata ocupar e desempenhar a sua função a bem do País. Ou seja, a chefia do Estado não é objeto de disputa, mas é objeto de união. Veja na Inglaterra, ninguém disputa ser rainha. Na Família Real Britânica há episódios dolorosos, há maus eventos, tudo que é humano que nós conhecemos. Mas a figura da rainha, enquanto representativa do próprio Império Britânico, passa por cima de tudo isso. Essa era a função que Dom Pedro II tinha no Brasil. Havia disputas partidárias, havia debates políticos, havia esse sadio entrechoque de opiniões, tudo isso havia. Mas pairava sobre tudo isso um fator unitivo que tinha algo em paternal. Isso que falta nas Repúblicas.

Os gestos falam por si?

Recentemente, o Leandro Karnal publicou um artigo onde disse que estava assistindo ao seriado The Crown, ele dizia: “Eu ainda não sou monarquista, mas estou cada vez menos republicano”. O Leandro Karnal ficou profundamente impressionado com uma cena. A Princesa Elizabeth estava dormindo e foi acordada no meio da noite, ela percebeu que alguma coisa muito grave tinha acontecido, ela se agasalhou e desceu para ver o que tinha acontecido. Quando chegou embaixo, encontrou a sua avó, quando ela se aproximou da avó, a avó se inclinou e beijou a mão dela. Bastou esse gesto e ela compreendeu que o pai dela tinha morrido e ela era a nova rainha. Um simples gesto pode ter todo o significado! Outro fato que impressiona muito é quando o Rei da França Luiz XVI é guilhotinado, ele estava preso com a esposa Maria Antonieta, com os filhos, em condições sub-humanas. Ele foi levado para ser guilhotinado e a rainha ficou com os filhos. Imagine a tristeza, o desamparo, o profundo drama, a rainha tinha 38 anos de idade, estava com os cabelos totalmente brancos, por causa da tensão, pressão, de repente se ouve ao longe os tiros de canhão, o rufar de tambor, por esse barulho a rainha percebeu que o Rei tinha sido guilhotinado. O que ela fez? Ela se levantou, ajeitou um pouco o cabelo, foi até o filho dela, que era um menino de 9 a 10 anos, se inclinou diante dele e beijou a mão do menino! Aquele era o novo Rei! Dentro do drama. Dentro da tragédia, tinha se passado a tradição hereditária. Com toda a naturalidade, com toda a normalidade, e dentro de um ambiente de tragédia. Essa continuidade das Monarquias faz falta na República! Na República, cada vez que se tem que eleger um novo Presidente, é uma briga de faca! Todos os podres, todas as fraquezas humanas, até mesmo todos os crimes do candidato, são expostos durante a campanha eleitoral. Depois ele é eleito, como você vai esperar que ele seja respeitado como seria um Príncipe Herdeiro? Alguém pode dizer: “Mas se é um Príncipe que vai herdar porque é o mais velho, de repente ele é incapaz, tem um outro que é mais capaz, não é melhor escolher o mais capaz? Há um autor espanhol, muito espirituoso, que diz o seguinte: “As escolhas da natureza sempre são as sábias do que as escolhas humanas”. As escolhas humanas sempre envolvem paixões, portanto elas são perturbadas por esses interesses mesquinhos que todo homem tem, todo mundo tem. As escolhas da natureza geralmente são mais imparciais e geralmente dão mais certo. Esse autor dá um argumento que depois de formulado, não tem mais resposta. Ele dá o seguinte argumento: “Nenhuma mulher escolhe o próprio pai. Toda mulher tem o pai que tiveram. Foi a natureza que indicou o pai de cada um. Mas todas as mulheres escolhem o próprio marido! O que é mais frequente: haver maus pais ou maus maridos?” Maus pais existem, mas são poucos, é muito mais frequente haver maus maridos! A escolha humana é muito mais frágil do que aquilo que foi designado pela natureza!

Voltando ao livro recém-lançado qual foi a tiragem?

Essa primeira tiragem foram 1.000 exemplares, mas já está esgotando. Está à venda no site www.livrariapetrus.com.br e www.ambientecostumes.com.br ou pelo telefone (11) 3331.4522. Ontem foram despachados 10 volumes para Portugal. A trajetória de Dom Luiz de Orleans e Bragança é a de um idealista, que tinha o senso do dever, não mediu sacrifícios desde que entendesse que era obrigação deles praticá-los.

Ele era casado?

Ele era casado com uma princesa de origem italiana, Dona Maria Pia. Tiveram três filhos, o mais velho Dom Pedro Henrique, há alguns anos escrevi a vida do filho foi um aquarelista, casou-se com uma princesa alemã, tiveram doze filhos. Dom Luiz teve um outro filho que faleceu ainda muito jovem, com 20 anos de idade. Teve uma filha que se casou e deixou descendentes na França.

Atualmente você é o escritor que mais tem conhecimentos sobre a Família Real Brasileira?

Sou um dos escritores! Seria muita pretensão da minha parte dizer que sou o maior.

Mas que tem mais obras publicadas sobre a Família Real Brasileira?

Isso sim, certamente.

Você é recebido pela Família Real regularmente?

Sim, isso é uma honra que eu tenho. Fiz parte do secretariado do Príncipe Dom Luiz, conheci o pai dele, Dom Pedro Henrique, quando eu ainda era adolescente. Cuidei dos seus arquivos, dai vem o meu conhecimento da matéria. Estudei muito. Li muito. É um assunto que sempre me fascinou.

Você chegou a tomar refeições com eles?

Sim, muitas vezes. Até em viagens eu os acompanhei.

Qual é o comportamento deles a mesa?

Extremas simplicidade e educação!

A alimentação era trivial?

Sim, a mais comum. Eles tiveram muitas dificuldades econômicas na vida. A vida não foi fácil para nenhum deles.

A história do laudêmio aiba existe?

Existe, mas é de um outro ramo da família, não é o ramo principal. É a enfiteuse de Petrópolis, o novo Código Civil não permitiu que fossem criadas novas enfiteuses, mas respeitou as antigas. (A enfiteuse é instituto do Direito Civil e o mais amplo de todos os direitos reais, pois consiste na permissão dada ao proprietário de entregar a outrem todos os direitos sobre a coisa de tal forma que o terceiro que recebeu (enfiteuta) passe a ter o domínio útil da coisa mediante pagamento de uma pensão ou foro ao senhorio. Assim, pela enfiteuse o foreiro ou enfiteuta tem sobre a coisa alheia o direito de posse, uso, gozo e inclusive poderá alienar ou transmitir por herança, contudo com a eterna obrigação de pagar a pensão ao senhorio direto). O Novo Código Civil não permite que sejam criadas novas enfiteuses. Mas respeitou as antigas. Que são da Família Imperial, muitas Eclesiásticas, muitas enfiteuses eram fazendeiros que doavam uma fazenda para a Igreja. A Igreja construía o templo, e cedia as casas em volta do templo no regime de enfiteuse. Até hoje permanece, há cidades inteiras. Depois tem os terrenos da Marinha também. Existem muitas propriedades na extensa faixa do Litoral Brasileiro, A propriedade do imóvel é da Marinha. A pessoa que está ocupando o imóvel chama-se enfiteuta. Exercem todos os direitos de proprietário, só que o título está em nome da Marinha. Isso no Brasil todo. As ilhas oceânicas também obedecem essa regra. Na prática, os titulares desses imóveis, podem vender, podem comprar, apenas quando fazem uma alienação, tem que pagar o laudêmio. Que é uma porcentagem muito pequena, mas que em uma cidade como Petrópolis tem um significado bastante considerável.

O Príncipe caminha normalmente pelas ruas?

Caminhamos juntos muitas vezes.

Ele é tratado como Príncipe?

Eu sempre, como respeito, os tratei como Dom Luiz, Dom Bertrand, Dom Antonio, Dom Rafael. Mesmo porque a particula Dom pelos velhos costumes luso-brasileiros é parte integrante do nome. Eu sempre tive e sempre terei, em relação a eles, uma manifestação de respeito muito grande, o respeito não impede que uma sadia familiaridade, uma sadia expontaneidade. A cerimonia não é contrária à expontaneidadade nem à intimidade. Pode-se ser cerimonioso e ao mesmo tempo ser afetivo, ser próximo.

Você era tratado também como Dom?

Não! Claro que não! Eu sou plebeu! Meus quatro avós eram camponeses! Cada um de nós tem o seu papel, Todos nós somos filhos de Deus.

Luís Filipe Maria Fernando Gastão, Conde d’Eu (Louis Philippe Marie Ferdinand Gaston,  casado com D. Isabel Cristina Leopoldina de Bragança, filha do último imperador do BrasilDom Pedro II esteve em Piracicaba?

Esteve hospedado no Palacete do Barão de Serra Negra, um imponente prédio situado na Rua São José esquina com a Rua Alferes José Caetano. Local que mais tarde viria a ser a sede da Prefeitura Municipal de Piracicaba, por muitos anos, até que foi demolido para dar lugar a um estacionamento de veículos. Em Piracicaba havia um grupo de famílias ilustres da cidade que eram muito ligadas à Família Imperial. A família do Barão de Serra Negra, Dr. Torquato da Silva Leitão, família Camargo, família Silva Gordo, eram famílias muito ligadas à Familia Imperial. Com a República, o foco voltou-se para Prudente de Moraes. Itu também tem um passado Monarquista e um passado Republicano muito marcantes. Itu recebeu o nome de Cidade Fidelíssima, título dado por D.Pedro I e D.Pedro II. D. Pedro II quando estava em Portugal, com idade avançada, dizia que gostaria de voltar ao Brasil para conhecer as duas únicas províncias que ele não visitou. Ele tinha viajado muito pelo Brasil.

Existe algum grupo Pró- Monarquia em Piracicaba?

Existe aqui em Piracicaba o “Círculo Monárquico Barão de Rezende” do qual eu faço parte. Todas as semanas eu escrevo, no Jornal de Piracicaba, a minha coluna é do Círculo Monárquico.

Pode ser a semente de um partido político?

Partido político, não. O Príncipe sempre foi muito taxativo nessa linha. Partido, como o próprio nome diz, vem de parte e o próprio da Monarquia não é a parte, mas o todo. O princípio Monárquico envolve a todos. Se falarmos de partido Monárquico já estamos excluindo pessoas. A Monarquia é algo muito mais amplo.

Você já está trabalhando no próximo livro?

Estou trabalhando em duas apostilas de História: uma de Historiografia e Teoria da História e a outra de História Medieval, para uma faculdade em que leciono.

Provavelmente se tornara um livro?

Claro que sim!

Tem uma faceta sua que nós não conversamos, o seu conhecimento da arte militar.

Eu fiz uma especialização em História Militar. Sou predecessor no curso de pós-graduação em História Militar na Universidade do Sul de Santa Catarina. Sempre fui civil, não tenho formação militar. Tenho sim um grande interesse pela História Militar. Sou especialista em História Militar.

Quando você fala de História Militar, fala de estratégias, armas, aborda todos os aspectos referentes a mesma?

Abordo tudo. Antigamente se entendia História Militar como relato das batalhas e conflitos armados. Hoje em dia, a História Militar focaliza todos os conflitos humanos. Entre pessoas, entre grupos, entre sociedades, Estados, com isso tem uma dimensão econômica, social, política, diplomática, cultural, tudo isso é muito amplo e envolve todos os conflitos humanos. O lado militar, de batalha, e aspecto de um conjunto muito mais amplo. Hoje a História Militar tem essa atitude.

As próprias armas evoluíram.

Também, claro. Um exemplo é a Guerra do Vietnã. Se você for contemplar do ponto de vista militar quem ganhou foram os Estados Unidos. Morreram muito mais vietcongues do que norte-americanos. Todas as áreas conquistadas pelos vietcongues eram rapidamente retomadas pelos norte-americanos depois de bombardeios maciços. Os Estados Unidos foram derrotados, não pela força das armas, foram derrotados pela propaganda, pela diplomacia, pela psicologia, por uma série de outros fatores. A mídia norte-americana é que foi contrária a guerra. A guerra do Vietnã não foi decidida pelo Vietnã, foi decidida pelos Estados Unidos! Foi uma guerra de propaganda! Isso permite Isso por exemplo permite que se faça uma análise de um fenômeno como a Guerra do Vietnã, em uma profundidade muito mais ampla. A Guerra do Vietnã foi tão antipatizada pela mídia de esquerda norte-americana que veteranos de guerra, que tinham recebido medalhas como heroísmo, iam às portas do Capitólio e jogavam as medalhas no chão em sinal de desprezo. Com todos os efeitos desse tipo de propaganda não é possível ir mais longe. A guerra muitas vezes se decide longe das armas. O  Sun Tzu, aquele chinês que escreveu a arte da guerra, ele dizia que o bom general não luta vencendo uma batalha, ele luta fazendo o adversário perdendo a vontade de lutar.

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JOÃO UMBERTO NASSIF – Jornalista e Radialista – e-mail: [email protected]

 

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