Vacinação em massa já

José Machado

 

O Brasil está em transe e desgovernado. Despedaçado pela pandemia, pelo desemprego, pela miséria e pela fome de muitos, o país vive o drama de não ter governo.

Sim, não temos governo. O que aí está é uma ficção. Pior, é uma aberração.

A Inglaterra iniciou a vacinação em massa do seu povo para imunizá-lo da Covid 19. Outros países já estão preparados para igual iniciativa e devem deflagrá-la nos próximos dias. A ciência e os laboratórios, públicos e privados, trataram de desenvolver a medicação e ela, em várias versões, já está sendo disponibilizada para produção em massa. Impõem-se aos governos providências de planejamento: certificação sanitária, provisão orçamentária, contratação da produção, logística, espaços físicos, equipes especializadas, calendário, comunicação e mobilização social. Enfim, essas coisas que estamos cansados de saber porque já há histórico de situações parecidas e metodologia desenvolvida.

Aqui no Brasil, o SUS já demonstrou capacidade de dar conta do recado e não é bicho de sete cabeças enfrentar o desafio de imunizar o povo brasileiro por essa ótica. Então, onde reside o busílis?

O busílis no Brasil está na bagunça generalizada em que o país mergulhou, na qual o interesse público está submetido à lógica de poder de um governante que renega a ciência; que é prisioneiro de uma estúpida convicção anti-comunista, e de alinhamento servil aos Estados Unidos de Trump, que o faz repudiar qualquer parceria com a China; que reduz toda ação governamental ao critério da sua vitória em 2022; enfim, que não tem a menor ideia do que seja ser estadista.

Todo o esforço de articulação e planejamento de combate ao coronavírus deveria estar sob a égide do governo federal. Isso requereria capacidade de o mesmo tomar a iniciativa convocatória e estabelecer diálogo e parcerias com os governos estaduais e municipais, com vistas a obter o melhor desempenho possível. Isso não aconteceu ao longo dessa trágica crise sanitária que o país vive, o que nos faz contabilizar os mais elevados números de contágios e de óbitos. E não aconteceu porque o projeto de poder do atual presidente, contaminado por sua visão estreita e torpe, o impede de ter uma convivência democrática e republicana.

A queda de braço que o presidente trava com o governador de São Paulo é emblemática. Ambos são candidatíssimos à Presidência da República em 2022 e a disputa entre eles em torno do tema da vacinação contra o coronavírus compromete o interesse superior do povo brasileiro. O governo de SP, sob os auspícios tecnológicos do Instituto Butantã, contratou a aquisição da vacina chinesa e já lançou a programação da vacinação em massa no estado, a ser iniciada no início do próximo ano, antes mesmo que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA tenha dado a devida certificação. Esta agência, por seu lado, que deveria ter uma atuação independente, dá mostras de que vacila e está submetida ao tacão do Palácio do Planalto, cuja posição contra a vacina chinesa, por razões nomeadamente ideológicas e geopolíticas, é conhecida.

Enquanto o governo federal se mantém preso às suas esdrúxulas convicções, bate cabeça e paralisa o país, outros governos estaduais, como o do Maranhão, desesperados, tomam a iniciativa de se socorrer no Supremo Tribunal Federal, a fim de terem autorização para comprar a vacina, seja ela qual for, mesmo sem a certificação da ANVISA. O governo de São Paulo certamente também irá bater na porta do STF porque a ANVISA pode bloquear a iniciativa de vacinação desse governo, já programada. É o caos.

Um segmento significativo da sociedade brasileira declara que não se submeterá à vacinação. Muitos alimentam o preconceito contra qualquer vacina, em qualquer tempo e circunstância, por convicção arraigada, e muitos assumem que não se submeterão especificamente à vacina chinesa, internalizando insanamente na consciência a semente ideológica disseminada pelo próprio presidente da república. Contudo, há uma maioria esmagadora dos brasileiros que nutre desesperadamente a esperança de que a vacina chegue logo, pois não suporta mais o trauma psicológico da solidão social, de não poder acarinhar os familiares e de abraçar os amigos, de não poder tocar os negócios e a vida em geral, já muito difícil especialmente para os mais pobres.

A vacinação em massa é um imperativo do qual a sociedade brasileira não pode abrir mão e pelo qual deve lutar sem tréguas.

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José Machado, economista, foi prefeito de Piracicaba e deputado federal e estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT)

 

 

 

 

 

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