José Renato Nalini
Será que somos tão pouco originais e criativos que até as nossas fake News não são mais novas? Há uma patética repetição de fake olds. Matéria requentada, superada, anacrônica e, o pior ainda, falaciosa.
Argumentos surrados utilizados com desenvoltura em discursos oficiais. Como se os destinatários todos fossem ingênuos, impressionáveis ou imbecis.
Aquilo que se usava para denegrir o ambientalismo, rechaçado por dendroclastas insensíveis, continua a se abrigar em escusas esfarrapadas, diante do desastre em que se converteu a tutela ambiental brasileira.
Procurou-se invocar um sentimento emocional e sedutor, como a soberania, para afirmar que a floresta é nossa e ninguém tem nada com isso. Na linha de que a melhor defesa é o ataque, acusações contra nações estrangeiras. Já destruíram suas florestas, não têm legitimidade para defender as nossas. Chegou a nossa vez de exterminar a natureza.
Alguém ousa defender os indígenas? Como, cara pálida: os americanos não acabaram com os pele-vermelhas? Os espanhóis não dizimaram incas, maias, astecas e outras etnias? Podem deixar que também sabemos acabar com os nossos indígenas.
Num artifício de verdadeira mágica, também serve a tática de proceder a cálculos fantasiosos, mediante articulada soma de mata preservada, áreas indígenas, glebas protegidas, parques nacionais, unidades de conservação, RPPNs, reserva legal e áreas de proteção ambiental. Sobrepondo-se todas essas parcelas do território, chega-se à situação absurda de que a proteção ecológica é superior à dimensão territorial da República.
Triste papel reservado a pessoas presumivelmente escolarizadas e que se prestam a tal pregação, sabe-se lá a troco de que, embora o interesse deflua claramente de quem patrocina tal propaganda enganosa.
O cúmulo das “old news” é negar que haja desmatamento, que as chamas não estão a consumir a Amazônia, o cerrado e – pasmem! – o Pantanal mato-grossense. É tudo conspiração orquestrada de quem não quer ver o Brasil – celeiro do mundo – a sustentar o planeta com a superprodução de seu agronegócio.
A mesma fonte produziu ensaio para provar que a fauna do canavial é mais rica e exuberante do que aquela que ocupa a vegetação nativa. Tudo naquela concepção bem ecológica para demonstrar que a queimada da palha de cana-de-açúcar não prejudicava a saúde humana.
As versões de nada valem contra os fatos. Estes são incontroversos e resultam de constatações empíricas e realizadas com rigor científico. De pouco ou nada vale exonerar o responsável pelo INPE. Nem paralisar operações de combate ao garimpo ilegal. Nem ofender nações estrangeiras, ironizar a adolescente que mostrou ao mundo que “o rei estava nu” e protagonizou memorável luta para defender as gerações do amanhã.
A esperança brasileira é a reação do setor econômico. Os Fundos que administram trilhões e que devem ser cortejados para despejar recursos num Brasil em frangalhos, já advertiram que não destinarão verbas para um país devastador. Mais animador ainda é a conjugação de esforços dos três maiores bancos, apreensivos com o status brasileiro no ranking dos mais inclementes em relação ao ambiente. Hoje, nosso país está no pódio dos “párias ecológicos”, expressão recentemente utilizada por insuspeitos pensadores, que não podem ser acusados de integrar as ONGs conspiradoras.
Os Bancos sabem das coisas. Enxergam ao longe. Quando se arregimentam e querem resistir a essa perseverante ignorância, é sinal de que nem tudo está perdido.
O sistema bancário é mais ouvido do que os cientistas, que já estão roucos de tanto admoestar a insensatez. Sua voz é mais forte do que a de todos os ex-Ministros do Meio Ambiente, angustiados e perplexos ante insanidade tamanha.
O Parlamento, que recupera a preponderância ontológica na formatação de Montesquieu, tem representantes capazes de identificar o delírio e de conter o desvario. Falta a atuação mais presente da sociedade civil, da Universidade, da juventude, do Terceiro Setor que transformou o mundo e mostrou que a interlocução entre povo e os múltiplos fatores de poder não precisam, inevitavelmente, dialogar com a teimosia burra.
O planeta hoje é outro. Ficou menor e mais frágil. O aquecimento global interessa a todos. Sepultou de vez o ultrapassado conceito de uma soberania alheia a compromissos assumidos por um Estado e que não podem estar sujeitos às vicissitudes de um governo transitório.
Salvar o futuro é obrigação de todos. Daí a legitimidade de qualquer cidadão que se preocupe com seus filhos, netos, bisnetos e com aqueles que, só virão posteriormente, se tivermos coragem agora de dizer “Basta!”.
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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL); foi presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo