Padre Di Lascio
“Quando setembro vier” é uma belíssima música que está registrada no mais profundo de nossa memória afetiva. A arte da música nos transporta para o reino da imaginação, nos move num serpenteamento cósmico e, enchendo-nos de sonhos e fantasias cria em nós uma vontade imensa de viver e de encontrar a felicidade nesta nossa trajetória terrena.
Quando nos deixávamos levar pelo som dessa musica e nossos pés ligeiros deslizavam pelos salões de baile, na companhia de quem tinha conquistado nossos corações, era como se um impulso mágico nos arrebatava, e nos levava a crer, convencer-se mesmo, de que o amor existe e vale a pena viver e fazer de tudo para encontrá-lo.
Setembro é o mês da primavera. Tempo que traz de volta a esperança e nos enche de alegria e vontade de viver. À aura de mistério e magia deste mês, vem agora juntar-se a Campanha Setembro Amarelo, uma conclamação para nos movermos no trabalho de prevenção contra o suicídio.
Segundo as estatísticas da OMS a cada 40 segundos, ao redor do mundo, uma pessoa se suicida. No Brasil, os observadores chegam à constatação de que esse número é de uma centena por dia. O suicídio é o ato culminante a que chega uma pessoa que busca na morte um meio de pôr fim aos problemas que a atormentam.
Diversas são as motivações que levam as pessoas ao suicídio. Entre as mais comuns: o sentimento de culpa, o remorso, a decepção, a depressão, a ansiedade, o medo, o vazio existencial, a humilhação e por aí vai… A pessoa perde o estímulo para tocar a vida em frente, acaba por se isolar de tudo e de todos e entra em paranóia. Um assalto de pensamentos desconexos, conflitantes, que não trazem resposta alguma, roubam a paz e o discernimento e levam a pessoa ao desespero.
Esse grave problema é de responsabilidade de todos nós, como cidadãos. Todos fazemos parte do tecido social que se move e vive pela gratuidade e interdependência uns dos outros. Ninguém sobrevive isolado como uma ilha e por questão de ética e moral, ninguém tem o direito de ser feliz sozinho.
A realidade que vemos é outra: uma sociedade-avestruz, em que grande parte dos indivíduos vive com a cabeça voltada para si mesmos, mergulhada nos aparelhos eletrônicos, e as atenções voltadas para o seu próprio umbigo.Uma total alienação e indiferença frente à presença desconhecida do outro.
Então percebemos que grande parte da massa populacional não vive, mas se faz refém sob o domínio dos ídolos do poder, do prazer e do ter. São criaturas fracas, indolentes, ignorantes e vitimas da síndrome da baixa autoestima. Culpadas e revoltadas por não se enquadrar entre os grupos “privilegiados”, que detêm o “status social” não atendem os critérios que os façam ser aceitos e valorizados no grupo social dominante e opressor.
Assim sendo, essa sociedade marginal, discriminada, cria seres humanos infelizes por não usar “tal ou qual” marca de produto de consumo, ou por não possuir os padrões de beleza e estética ou por não poder ostentar nada daquilo que os faça ser aceitos e aprovados na sociedade “padrão”.
A vida nos escolhe. E isso nos é comprovado pela trajetória milagrosa e desafiante do ciclo vital desde o primeiro momento pós-fecundação. Essa maravilhosa migração de milhares de espermatozóides que disputam, numa corrida frenética e de bravura, o alvo a ser conquistado: o óvulo maduro à espera do encontro para ser gerada uma nova vida. Temos aí a vitória de um Campeão da Vida.
Sabemos pela ciência que estuda o comportamento humano, que em 90% dos casos o suicídio pode ser prevenido. É uma grande verdade! Quantos desafios e ameaças de morte tivemos que enfrentar nessa trajetória da fecundação ao nascimento, para sairmos vitoriosos: tentativa de aborto, violência sofrida pela mãe, abandono, enfermidades, ameaças, dificuldades na hora de nascer… E outros perigos ameaçadores.
A vida que herdamos tem que seguir e cumprir a sua missão rumo à eternidade. Passamos por esta Terra como peregrinos na Escola da Vida. Carregamos o dom da imortalidade durante esta peregrinação. Sofreremos inúmeras ameaças de morte, mas, em cada fase da vida aprendemos a enfrentar esses monstros que nos atormentam ou que querem impedir o nosso crescimento e avanço.
As resiliências nos fazem ganhar experiências e condições de assumirmos cada dia mais o nosso destino. No inicio, a vida nos escolheu. Agora somos nós que devemos escolhê-la para continuarmos o nosso caminho e seguir em frente.
Somos todos guardiões do nosso próximo. Somos parte de um corpo vivo e possuímos uma alma (animus) que abriga o Espirito Divino. A vida é, pois, um presente. É uma dádiva de amor pela qual vale a pena fazer de tudo para que vingue, floresça, e se realize.
O Mestre dos Mestres, Jesus Cristo, veio até nós assumindo um corpo humano para nos ensinar a valorizar a Vida. Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância (Jo,10-10). Quem ama cuida, defende e salva. E, se for preciso, entrega a sua própria vida para salvar outra vida.
Há sempre uma luz de esperança no caminho, uma mão que se estende e um ouvido que escuta o chamado: EU PRECISO DE AJUDA!
Pe. Luiz Roberto Teixeira Di Lascio – Vigário Paroquial da Basílica Nossa Senhora do Carmo
Arquidiocese de Campinas – SP. e-mail: [email protected]