Entrevista: “Posso dizer que nasci dentro da escola”

Professor de literatura, violino e viola clássica, Alexandre Mauro Bragion, o Alê, também é radialista e colunista de A Tribuna Piracicabana – Crédito: Divulgação

JOÃO UMBERTO NASSIF

Alexandre Mauro Bragion possui graduação em Letras pela Universidade Metodista de Piracicaba (2000), mestrado em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas (2007) e doutorado em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas (2013). Atualmente, é professor da Universidade Metodista de Piracicaba, onde leciona as disciplinas de Literatura Africana, Teoria Literária, Literatura Brasileira e Leitura e Produção de Textos e coordena também o curso de especialização, lato sensu, em “Literatura e Outras Linguagens Artísticas,” oferecido pelo curso de Letras Língua Portuguesa. Leciona também na Faculdade de Tecnologia de Piracicaba, onde ministra a disciplina de Comunicação e Expressão junto aos cursos de Engenharia Civil e Engenharia de Produção. É também professor de violino e viola clássica da Escola de Música de Piracicaba Maestro Ernst Mahle (EMPEM). É um dos produtores/apresentadores do programa radiofônico “Educativa nas Letras”, veiculado pela Rádio Educativa FM de Piracicaba e editor do site de cultura e opinião Diário do Engenho. Alexandre Mauro Bragion nasceu em Piracicaba a 11 de novembro de 1975 (Alexandre ressalta: “Dia e ano da independência de Angola”), é filho de José Mathias Bragion e Maria Dalva BrettiBragion que tiveram ainda os filhos: Amália, Miriam, Glaucia, Raquel e Sérgio. Alexandre é Casado com Tania Alessandra de Almeida Bragion.

Seus primeiros estudos foram feitos em qual escola?
Comecei a estudar na escola em que meu pai lecionava, no então Grupo Escolar Barão do Rio Branco, perto da minha casa.

Sua mãe também lecionou?
Minha mãe foi professora e diretora da Escola Estadual Professor José Martins de Toledo de Ártemis, onde ela trabalhou por muitos anos. Posso afirmar que cresci ali, acompanhando a minha mãe, na minha infância. Morávamos em Piracicaba e íamos todos os dias para Ártemis, a estrada era ainda de terra, íamos de “Fusquinha”. O carro ia com crianças, professoras! Minha mãe dirigia com valentia em uma estrada que quando chovia geralmente o carro atolava na lama. Naquelas condições era uma aventura! Nós, muito jovens, ficávamos por lá. Dormíamos na área destinada a fornecer a merenda. Rodava a escola inteira!

Você guarda muitas lembranças dessa época?
Sem dúvida! Lembro-me de muitas coisas! Até começar a vida escolar em Piracicaba. Passamos a infância em Ártemis, eu, meu irmão e uma das minhas irmãs, eu sou o filho mais novo de todos. Tinha amizade com os filhos das merendeiras, das faxineiras, com os professores, com os alunos. Acho que desde o começo a nossa era uma “Vida pedagógica! ” (Risos). De certa forma, posso dizer que “nasci” dentro da escola, a escola sempre foi uma casa.

Você chegou a conhecer o armazém do Seu Manoel Chaddad, pai do arquiteto João Chaddad?
Eu era muito novo, porém lembro-me de que havia dois armazéns. Um deles ficava onde era o ponto de ônibus que fazia o trajeto Piracicaba–Ártemis. Andava muito a pé naquele tempo, lembro-me da histórica ponte de ferro. O Roberto Carlos tinha um sítio nas proximidades, chegamos a ir até lá quando eu era moleque.

Você chegou a ver o Roberto Carlos?
Eu não, mas a minha mãe, uma vez em que precisou fazer uma campanha para a escola ela foi pedir uma verba para ele, ele atendeu, isso foi na década de 70.

Já com a idade escolar você passou a frequentar o Grupo Escolar Barão do Rio Branco, onde seu pai era professor. Você era um bom aluno?
Tinha que ser! Meu pai era referência! Se o filho do professor fosse mal as coisas iriam ficar complicadas para mim. Isso fez com que eu me voltasse para os estudos com afinco. Em casa vivenciávamos esse ambiente escolar, meu pai corrigindo provas, minha mãe corrigindo provas. Dando notas, preenchendo diários. Isso tudo era muito natural para mim. Na casa da Rua Governador Pedro de Toledo, que pertence à família até hoje, situada no centro, entre a Rua Floriano Peixoto e Rua Gomes Carneiro, onde morávamos, meu pai tinha uma boa biblioteca, em seu escritório. Éramos vizinhos do Dr. Oswaldo Cambiaghi, médico, escritor, historiador. Meu pai assinava muitos jornais, colaborava na imprensa piracicabana, colaborou muitos anos com “A Tribuna”, “O Diário”. Tive até uma passagem engraçada, uma vez entrevistei o Cecílio Elias Netto na Rádio Educativa, e o Cecílio sempre teve uma postura combativa, em dado momento, fora do ar, ele perguntou-me o nome do meu pai, quando disse-lhe, ele falou: “- Então você é filho do José e sobrinho do Geraldo Bragion!” Ele emocionou-se. Disse: “Seu pai e seu tio foram figuras importantes para “O Diário”. Ajudaram muito na escrita, revisão de textos”. Meu pai, meu avô, eram cursilhistas, assim como o Cecílio, eles se conheciam do cursilho. Foi o período de auge do cursilho. Eu até já escrevi na “A Tribuna”, na coluna semanal que mantenho, contando que o meu pai, à noite, ali nas proximidades da Rua do Porto ele ia revisar textos, eu ainda criança, devia ter uns oito anos, às vezes o acompanhava, ficava vendo as máquinas, linotipos, os jornais sendo impressos, foi um ambiente onde eu cresci vendo cada movimento, o meu pai revisando texto.

Nesse aspecto “A Tribuna” é um órgão de imprensa onde se faz jornalismo por amor, vocação. Dá oportunidade a todos, grandes nomes do jornalismo espalhados pelo Brasil, inclusive hoje ocupando cargos de destaque, iniciaram ali seus primeiros passos.
Faz um jornal de verdade! Pautado no jornalismo de origem, o jornalismo que dá voz a todo mundo, que mostra os dois lados, não é tendencioso, ao mesmo tempo em que permite a publicação de um texto mais voltado para a esquerda política seja publicado, irá dar a mesma oportunidade a um texto voltado mais à direita. Esse equilíbrio de espaços e opiniões que embora divergente entre si convivem em harmonia, a meu ver nesse sentido é o único jornal que faz isso.

Terminando o curso primário você prosseguiu estudando em qual escola?
O ensino médio fiz no Colégio Dom Bosco da Cidade Alta. Foi no início dos anos 90, já não existia mais a famosa fanfarra do Dom Bosco. Fui aluno do professor de geometria Toninho de Jesus, professor Bernardo. Alguns anos depois voltei como professor nesse colégio onde permaneci por 10 anos. Entrei na Unimep, cursei um ano de Administração, cheguei a trabalhar como estagiário do Banco do Brasil, trabalhei um pouco no comércio do centro, trabalhei na Libral, situada na Rua Boa Morte entre a Rua XV de Novembro e a Rua Rangel Pestana. Quando percebi que não tinha nada a ver com administração eu já tocava na noite, em casamentos, apesar de jovem já tocava profissionalmente, até que um dia um chefe meu no Banco disse-me: “Vai fazer outra coisa, seus dons são para outra atividade!”. Foi um chefe muito benquisto, muito generoso. Ele disse de forma muito respeitosa: “Alexandre! Você está perdendo tempo aqui no banco!”. Tranquei o curso de Administração e fui fazer Letras. Isso foi em 1996. Prestei vestibular de novo na própria UNIMEP, onde fiz o Curso de Letras, Português e Inglês. Tínhamos latim e outras disciplinas mais raras de se encontra em cursos atualmente. Foi uma formação muito boa em literatura norte-americana, literatura portuguesa, brasileira, todas as fases da linguística, é um curso completo. Depois vim a ser professor desse curso.

Como a música entrou em sua vida?
Nós não temos muito próximo alguém que fosse fonte de inspiração. Meu irmão também é músico. Comecei a estudar violino com nove anos, com o professor Valdir Belluco. Ele foi meu professor dos 9 anos até os 19 anos, foram 10 anos de estudo tendo aulas com o professor Valdir Belluco. Ele me levava para tocar junto em alguns lugares, com isso tive a alegria de conhecer a velha guarda da música piracicabana toquei com: Olênio Veiga, Romeu, compus o Conjunto Serenata, que era um conjunto tradicional de Piracicaba com Sérgio Belluco, Valdir, toquei com Justo Moretti, fundamos juntos a Orquestra de Câmara de Piracicaba, que tocou por três ou quatro anos, depois o maestro Joaquim Álvaro Bonillo faleceu, ele era maestro, professor, formado pelo Instituto Pró-Música de São Paulo, estudou regência com Koellreuter e Schnorrenberg e foi discípulo de vários músicos de renome, foi para mim um segundo pai, um amigo querido, chegamos a tocar até em São Paulo. Com o seu falecimento a orquestra acabou, acabamos fechando o estatuto da orquestra.

Você saberia dizer de quantas orquestras já participou?
Não saberia dizer, foram muitas, aos nove anos eu já tocava violino em casamentos. Por quatro anos fui musico concursado da orquestra sinfônica de Limeira, toquei por muito tempo na Escola de Música de Piracicaba, onde também fui professor.

Sempre tocando violino?
Basicamente violino e viola de orquestra, viola clássica. Toquei em muitos casamentos, formaturas, eventos.

No Brasil música é rentável?
Vivi de música por muito tempo, ainda vivo, representa parte significativa do meu orçamento. Acredito que sabendo fazer, sabendo tocar o resultado financeiro aparece. Eu tiro um pouco esse mito de que música não dá dinheiro. Talvez não dê o valor que seja merecido, mas ainda assim acho que é compensatório, eu acredito nisso. A música é um trabalho que possibilita ao musico manter-se. Vivi muito tempo de música.

Você só trabalhou com música clássica?
Trabalhei com música popular em casamentos, formaturas. Algumas gravações de CDs. Sou um músico que tenho uma entrada popular muito grande. O próprio Conjunto Serenata que eram músicas de serestas.

Quanto tempo durou o Conjunto Serenata?
Sei que durou décadas, fui da última safra!

Tinha quantos componentes?
Variava bastante. Normalmente eram dois violinos, uma flauta transversal, um clarinete e o violão do Sérgio Belluco, eram cinco normalmente.

Tinha alguma música que invariavelmente era pedida pelo público?
O Sérgio Belluco tem um arquivo imenso de arranjos que ele fazia. Muita coisa. A Semana Erotides de Campos, o show que nós fizemos com “Alvorada de Lírios”, com a Tereza Alves cantando, o Bolão, foi na época um evento marcante, isso foi por volta do fim dos anos 90.

Como funciona para você essa participação tão dinâmica envolvendo as atividades de professor, músico, radialista, colaborador regular de periódicos?
Sempre brinco que trabalho em três artes, uma complementa a outra, trabalho nas letras, na literatura, no ensino da língua portuguesa, na parte escolar propriamente dita. Este ano completo 24 anos de sala de aula. Já dei aula para escola pública, universidade, escola privada, universidade particular. Já dei aulas para todo tipo de aluno e lugar. A música sempre completou esse universo, acabei lecionando música, tocando. O terceiro elemento que apareceu em 2005 é a comunicação, a imprensa, dei aulas no curso de jornalismo por 10 anos. Fiquei por 15 anos na Rádio Educativa, tenho o blog que diariamente eu edito, trabalhei em editora como revisor de texto, são as três áreas que vão se complementando para mim. Não sou jornalista de formação, mas sou alguém que trabalha na imprensa. Trabalho com a música e com a literatura. O meu doutorado na música e na literatura acaba sendo um ponto de encontro dessas áreas. Sou Doutor em Teoria e História Literária pela UNICAMP Tenho o mestrado também na UNICAMP na mesma área, e tenho uma especialização em Estudos Literários pela UNESP.

Você chegou a lecionar nessas universidades?
Nessas universidades não, mas participei em bancas, bancas de doutoramento, lecionei no Instituto Federal, em Capivari, por dois anos. Como professor substituto, lecionando para o ensino básico, técnico e tecnológico. Tinha alunos do ensino básico e também de graduação.

Quando falamos em Língua Portuguesa estamos abrangendo a língua como um todo e não só a brasileira?
Sim, Língua Portuguesa em toda a sua abrangência.

As reformas que são feitas de tempos em tempos na linguagem são necessárias, úteis?
Acho que elas são na verdade uma tentativa de padronizar o que já acontece. A língua é mais viva do que as reformas! As reformas estão sempre atrás do que acontece. Elas tentam alcançar o que a língua já pratica. Por exemplo, o trema, ninguém usava mais o trema! Raríssimas vezes usava-se o trema. Como por exemplo, cinqüenta, outras palavras que precisariam de trema e nunca tiveram, como água, pela mesma regra teríamos que colocar o trema ou ficaria “agua”. A reforma tenta ajustar um pouco. Não acho que seja desnecessária, mas a reforma não é tão arrojada como parece ser, acho que há muito mito em cima da reforma. As reformas são muitas, elas acontecem desde 1913 se não me engano. Essa necessidade é mais pela imprensa, pelas publicações de livros, para tentar fazer com que os livros na medida do possível tenham um padrão semelhante nos países lusófilos. Não é tanto para mudar o cotidiano das pessoas.

Há dentro da mesma língua, variações extremadas?
A língua tem um aspecto variacional, varia de país para país, de estado para estado, de cidade para cidade, de bairro para bairro. Nunca teremos um português que seja falado de forma igual em todos os lugares, isso acontece com outros idiomas também. O inglês que se fala nos Estados Unidos é uma variante do inglês britânico, que também não é o mesmo que se fala na África do Sul. O português falado em Portugal tem estruturas diferentes das nossas. Desde a colocação pronominal. Um brasileiro não irá entender tão rápido um telejornal em Portugal! Tem variantes vocabulares, sintáticas. O português falado na África, em Angola, por exemplo, Moçambique, acaba tendo variações. Isso distancia-se um pouco do português que se fala no Brasil. Se pegarmos Piracicaba, temos o Dicionário Piracicabano! São variantes de um português falado em uma cidade! Se formos comparar o português que se fala em Piracicaba, com o português que se fala em Lisboa, ele é bem distante! A grande palavra é essa, a língua sofre variações. Ela se modifica e varia de uma região para outra no mesmo tempo.

Houve um período em que determinada emissora de televisão detinha uma audiência quase sempre em índices elevados, diziam até que ela estimulava a uniformização da linguagem brasileira. Até que ponto isso é um fato?
Isso é um mito. Existe até um trabalho dentro das grandes redes de comunicação para tentar usar uma língua neutra. Não temos um “carioquês” na televisão. Pode ocorrer em algumas telenovelas, dependendo do cenário. Os apresentadores de telejornais passam por sessões de fonoaudiologia para perder o sotaque. Seja carioca, sulista.

Você tem ideia do número de casamentos em que já tocou?
(Risos) Não faço ideia! Já tentei fazer essa conta, houve época em que cheguei a fazer 3 a 4 casamentos por fim de semana. Realizando uma estimativa de uma média se 12 casamentos por mês, seriam 130 casamentos por ano, em média, em 25 anos toquei em 3250 casamentos. Isso sem contar eventos, concertos de arte.

Músicos e fotógrafos, sempre têm histórias pitorescas sobre casamentos, você lembra-se de alguma?
Daria para escrever um livro sobre fatos inusitados. Já estive em casamento em que a noiva ao entrar na igreja deparou-se com o tapete em chamas. Já teve casamento em que a noiva teve problemas com o vestido, atrasou-se mais do que o normal, e os convidados passaram a imaginar que ela tinha desistido de casar, gerando um clima de expectativa, tensão, humor, enfim todo tipo de imaginação possível a respeito.

Ao som do seu violino o ambiente deve ficar muito sensibilizado.
Tem sempre essa comoção. A música de forma geral tem o poder de provocar emoções. O violino parece ser um elemento catalisador dessas emoções, elas se afloram mais rapidamente.

Nessa trajetória tão rica de realizações, ocorreu algum fato totalmente fora do normal?
Teve uma, em que não toquei. Foi a mais inusitada, a minha esposa não admitiu que eu tocasse. Tive um convite, queriam me contratar para tocar violino em um motel! (Muitos risos). Um rapaz que queria que eu fosse tocar no encontro dele com uma moça. Nesse dia quem atendeu o telefone foi a minha mulher, e ela disse: “Não, ele não faz esse tipo de serviço! ”. Esse foi o caso mais inusitado! As pessoas têm sonhos e desejos ocultos. Um evento muito marcante foi quando ocorreu o falecimento do maestro Joaquim Álvaro Bonillo, fizemos um ensaio de corpo presente. Deixamos o caixão no centro do palco, colocamos a orquestra na posição de costume, ele faleceu no dia em fazíamos ensaio. Fizemos a última apresentação com ele morto, ali no meio do palco, de corpo presente. Foi na Sociedade Italiana, o público assistindo, foi muito emocionante. Ele tinha uma peça que nós tocávamos a Ária da Quarta Corda de Bach. Tempos antes dele falecer ele acreditou que tínhamos chegado em uma interpretação bonita, que ele gostava, ele disse: “- Mesmo que eu morra vocês continuem tocando, não parem”.

A sua esposa é música também?
Ela é fonoaudióloga. Ela canta também, tocou violoncelo por um bom tempo. Atualmente ela canta em orquestras, corais, canta no grupo “Falando da Vida” já por muitos anos. Nós nos conhecemos na orquestra.

Como você vê a importância do Maestro Ernst Mahle para o desenvolvimento da música em Piracicaba?
Ele é fundamental! O Maestro Mahle tem importância local e mundial. A formação de público de orquestra que nós temos hoje é toda feita pela Escola de Música e pelo casal Mahle. A formação de músicos locais, de excepcionais qualidades, espalhados pelo Brasil e pelo mundo é fruto do trabalho do casal Mahle. O trabalho dele é grandioso, Piracicaba não deu conta ainda de entender a dimensão do Mahle. Ele é certamente muito mais reconhecido mundo afora do que aqui. Já teve concertos inteiros dedicados a ele nos Estados Unidos, em países da Europa, pelo Brasil. Esta semana mesmo uma universidade do Rio de Janeiro fez uma live com 15 violoncelistas tocando uma peça dele. Ele é um pedagogo da música. O casal Mahle e Cidinha merecem nossa gratidão. Mahle um vulto imenso que merecia um reconhecimento maior. Usando um adjetivo modesto podemos afirmar que a importância dele é gigantesca.

Rádio tornou-se uma paixão para você quando?
Tive um convite em 2005, indicado pelo Newman Simões, a Lucila Silvestre perguntou a ele se ele conhecia um professor que trabalhasse com literatura e com música. Ele disse: “Conheço o Alexandre, mas ele corre demais, não sei se ele vai ter tempo”. Passou o meu telefone, comecei, fizemos um piloto, foi bem, e aí não parei mais. Foram 15 anos de Rádio Educativa FM. Tenho uma coluna que é publicada toda terça-feira em “A Tribuna Piracicabana” e sou editor de um site que está completando 10 anos que é “O Diário do Engenho”. É um site que tem muito acesso, muita colaboração.

Um fato que chama muito a atenção do público é o sincronismo de uma orquestra, há um nível de entendimento musical tão perfeito que o maestro talvez até seja desnecessário?
Há até grupos que tocam sem a presença de um maestro, ainda sou da velha guarda, acho que a função dele ali é importante para ser um catalisador dessas energias. É ele que vai de alguma forma ajudar um grande grupo a interpretar aquilo de uma forma só. Apesar de todos estarem conectados, do ponto de vista interpretativo pode ficar muito perdido, se cada um interpretar do seu jeito. O maestro conduz o processo com o olhar com gestos, com movimentos do corpo. Ele é o guia desse coletivo, que está coeso, mas necessita de um guia.

Você recentemente realizou um trabalho muito interessante.
De fato, um amigo convidou-me para tocar a trilha sonora de um site judaico-alemão sobre cantores de sinagoga. Toquei viola. Esse meu amigo mora na Alemanha e estava aqui, portanto esse trabalho hoje está na Alemanha.

Diante das precariedades, inclusive de saneamento básico, necessidades básicas de sobrevivência, que são palpáveis em nosso país, como abrir espaço para a música clássica?
A música clássica tem que ser desmistificada em nosso país. Nós tentamos isso levando a música clássica para todos os lugares. Temos duas orquestras, por exemplo, com projetos em grandes centros carentes, como a favela de Heliópolis. Existe um trabalho social muito bacana feito por bons músicos para tentar desmitificar. Mas eu acho que o que é mais duro nesse sentido, não é tanto a diferença social e sim a indústria cultural. O que se veicula em televisão é um tipo de música que tem seu espaço, mas não oferece espaço para outras. Mesmo a música boa popular acaba perdendo o seu espaço. Se o Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, surgissem hoje não teriam espaço! A indústria cultural é um grande problema. Você cobra R$ 50,00 de ingresso para um rodeio vão 10.000 pessoas. Você faz um concerto de graça, não vai ninguém. Foi se criando uma cultura do comercial, ela domina e acaba criando um padrão de entendimento. Se me derem um vinho de 100 anos eu não vou saber apreciar como alguém que é um conhecedor de vinhos. Eu não tenho essa cultura. As pessoas na vida cotidiana acabam sendo bombardeadas pela indústria cultural. Outros tipos de música perderam espaço: o samba, o chorinho, tem nichos. Um bar no Rio que toca chorinho. Gosto muito das músicas que fazem na periferia, são músicas novas, outro estilo, mas eles resistem bravamente! Apesar de não terem nenhum apoio. Acho muito bonito esse movimento! A produção de uma música que trate a periferia.

A questão da boa música é muito complexa?
Muita gente vai falar que não existe música boa. Ela é boa para quem? É uma outra discussão que temos quando discutimos a música e a arte sob um critério mais teórico. Quais são os fatores, as condições. O que está na base por exemplo. De uma obra de arte que dá condições de ela ser uma obra de qualidade ou não. Vou dizer que uma música não é boa, a pessoa que gosta vai dizer: “- Mas isso é bom para mim!”. Me lembro que na UNICAMP uma vez levamos os Xavantes para assistir um concerto, falamos para os índios: “Isso é música boa!”. Eles ouviram, gostaram. Falaram: “Agora nós vamos tocar música boa para vocês ouvirem!”. Pegaram uns canos que eles tinham, não que fosse feio, para eles aquilo era bom.

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