Gregório José
O recente levantamento do Monitor RGF sobre Recuperação Judicial revela um cenário sombrio para o setor empresarial brasileiro. O número de empresas que buscaram esse recurso legal segue uma escalada inquietante, registrando o maior índice absoluto desde que o monitoramento começou, em 2023. No terceiro trimestre de 2024, vimos o aumento da proporção de empresas em recuperação judicial para 1,90 a cada mil, um dado que reforça o que muitos preferem ignorar: a saúde financeira das empresas está em estado crítico.
Os números são claros, mas as causas, nem tanto. Na superfície, muitos empresários ainda estão administrando os sintomas da crise – renegociando dívidas para aliviar o sufoco imediato – sem tocar na raiz dos problemas. Rodrigo Gallegos, especialista em Recuperação Judicial, vai direto ao ponto: as empresas estão tratando a dor, não a doença. Ao invés de uma revisão séria de estratégia e operação, optam por postergar dívidas e continuar em um ciclo vicioso de juros e aperto financeiro. É a mesma receita de sempre, agora à moda empresarial: manter as aparências enquanto a estrutura se deteriora por dentro.
A análise por estados só confirma que a crise é profunda e geograficamente desigual. Minas Gerais e Rio Grande do Sul, por exemplo, viram suas empresas em recuperação judicial aumentarem de forma expressiva, enquanto São Paulo experimentou uma leve redução. Mas, se formos honestos, isso pouco atenua o cenário. A piora em estados como Minas mostra que, mesmo fora do eixo mais evidente, as empresas estão afundando em um ritmo que não encontra resposta nas ações de política econômica.
Com a taxa Selic elevada e sem perspectiva de alívio, temos uma verdadeira “tempestade perfeita” prestes a desabar sobre os negócios. O que veremos nos próximos meses será, provavelmente, uma nova onda de empresas em dificuldade, arrastadas por uma política de juros que aprisiona o crédito e enfraquece a sobrevivência de qualquer empresa que dependa dele.
É difícil conter a ironia diante de tanta negligência e autopreservação: as empresas seguem ignorando a necessidade de mudanças estruturais, e o governo segue amarrado à taxa de juros como único antídoto, como se o país fosse um experimento eterno em austeridade econômica. A realidade é que, sem mudanças sérias e amplas – tanto no governo quanto no setor privado –, a recuperação judicial deixará de ser um recurso e passará a ser a regra. E quem paga o preço por essa miopia? Todos nós, inevitavelmente.
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Gregório José, jornalista, radialista e filósofo