Almir Pazzianotto Pinto
Reconheço em Tarcísio de Freitas, um dos líderes do movimento de renovação política do País, a qualidade de bom governador do Estado de São Paulo.
Temo, porém, que a falta de melhor conhecimento da história paulista o prejudique em algumas decisões, colocando em risco projetos políticos para 2026, como a reeleição.
Campinas é uma das maiores e melhores cidades do nosso vigoroso interior. Possui universidades, excelentes hospitais, empresas, dinâmico comércio, as melhores estradas de rodagem, e mais de um milhão de habitantes. Uma das instituições de que se orgulham os campineiros é o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), com mais de um século de bons serviços a São Paulo e ao Brasil.
Ao Instituto se encontra incorporada a Fazenda Santa Elisa, localizada na zona periurbana, com 693 hectares de área e 14 km de divisas. 55% se destinam às atividades de pesquisa, experimentação e produção de sementes melhoradas. O solo é fértil e o clima adequado ao cultivo de plantas perenes e anuais. A área urbanizada, correspondente a cerca de 10%, concentra sete centros de pesquisas, pátio com armazéns e galpões para a guarda de máquinas e equipamentos. A área ambiental, ocupando 35% da Fazenda, contém cerrados, várzeas, nascentes, matas ciliares originais, pássaros e animais. Ali nasce o Ribeirão Quilombo, afluente do Rio Piracicaba.
A população campineira encontra-se decepcionada com notícias de que o governador Tarcísio de Freitas foi convencido a colocar à venda parte da Fazenda Santa Elisa, à iniciativa privada. O motivo alegado teria sido a subutilização de fração dos 693 hectares.
Antes de tudo, o que se entende por subutilização? Se considerarmos que boa utilização ocorre quando determinada área é ocupada por grandes edifícios, será necessário concluir que a Fazenda Santa Elisa é socialmente nociva e deve ser oferecida à venda para incorporadoras. Em poucos meses, em lugar de pesquisas, estudos, árvores, pássaros, animais, frutas silvestres, teremos cinzentas torres de concreto, e veículos motorizados expelindo monóxido de carbono de possantes motores.
O argumento da subutilização, usado por pecuaristas, plantadores de soja, garimpeiros legais e ilegais de ouro, deu início à devastação da Amazônia e à dizimação de tribos indígenas. Sob o mesmo argumento, exclusivamente econômico, o Brasil se tornou vítima indefesa da destruição do cerrado e do pantanal mato-grossense. Exigências de natureza humanas foram abandonadas, para que hectares e alqueires, equivalentes a centenas de milhares de campos de futebol, fossem despojados de cobertura florestal de forma criminosa, diante da impotência, ou indiferença, de autoridades federais, estaduais e municipais.
No Estado de São Paulo pouco resta da outrora exuberante Mata Atlântica. Aqui e acolá alguém tenta poupar isoladas perobas, cabriúvas, jequitibás. O mogno, madeira tão nobre quanto o angelim, pau-ferro, e o pau-brasil, está extinto. Com a vegetação desapareceram nascentes, riachos, rios, aves e animais silvestres.
Capivari, banhada pelo rio do mesmo nome, teve as matas naturais derrubadas para plantio da cana-de-açúcar. Hoje, milhares de alqueires que não sejam canaviais, estão ocupados por plantações de eucalipto. Outrora caudaloso e piscoso, o Rio Capivari se transformou em vítima da poluição. Durante os meses de verão é foco de pernilongos e mosquitos.
O brioso povo campineiro tenta se opor aos desígnios do governador Tarcísio de Freitas. Na Câmara Municipal, Comissão Permanente de Ciência e Tecnologia procura levar a efeito trabalhos destinados a convencer o governo a abandonar a ideia da venda.
Afinal, quantas tragédias climáticas, alagamentos e incêndios serão necessários para convencer o ser humano de que natureza é vida, e da sua cuidadosa preservação depende a sobrevivência do homem neste pequeno planeta?
Governador Tarcísio de Freitas, não nos decepcione. Dedique alguns dias da apertada agenda para conhecer, sem pressa, Campinas, Santa Bárbara, Sumaré, Hortolândia, Americana, Piracicaba, Limeira, Capivari, Rafard, Elias Fausto, Cardeal, Mombuca, a SP 101, a inconclusa Rodovia do Açucar, universidades, hospitais, escolas. Consulte nas ruas a opinião do povo.
- Exa. retornará ao Palácio dos Bandeirantes com novas ideias sobre o Instituto Agronômico de Campinas. Tenho certeza.
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Almir Pazzianotto Pinto, advogado, foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)