Almir Pazzianotto Pinto
Ouço cientistas políticos e jornalistas se esforçando à procura de explicações para a derrota de Guilherme Boulos, candidato do PSOL-PT, para Ricardo Nunes, candidato do PMDB.
Como simples eleitor, preocupado, porém, com o futuro de São Paulo, do Estado e do País, entendo que a palavra segurança bastará para esclarecer. O cidadão honesto, trabalhador, proprietário, pequeno, médio ou grande empresário, está em permanente procura de segurança para si próprio, para a família, para os seus bens.
Guilherme Boulos, autodeclarado representante da esquerda radical, significa o oposto daquilo a que aspiram as pessoas de bem. Tentativas desesperadoras, após o resultado do primeiro turno, no sentido de ser visto como representação do centro, ou da esquerda com temperos de direita, não surtiram os resultados esperados, porque desmentidas pelo passado e pelo perfil do candidato.
Ainda que se esforçasse, Boulos não conseguiria renegar ligações com o Movimento dos Trabalhadores sem Moradia (MTS), milícia clandestina destituída de personalidade jurídica, organizada com o manifesto objetivo de ignorar o direito de propriedade em violentas invasões. A jogada de Lula, apelando para a aristocrata Marta Suplicy como candidata a vice, colaborou para o fracasso.
Não bastasse, analistas políticos e jornalistas, bem remunerados e distantes da realidade, se recusam a admitir que o Partido dos Trabalhadores deixou de ter a força e o prestígio de que se beneficiou no passado. O povo, em sua maioria, não se esqueceu do escândalo da Lava Jato, da condenação e prisão de Lula e de grandes empresários, pela prática contumaz de corrupção, apropriação e desvio de dinheiro público.
Como seu mentor, o populista Lula, Guilherme Boulos depositou todas as fichas nas massas. Políticos experientes buscam o apoio entre pessoas. Entre massas e pessoas as diferenças são enormes. A massa é irracional, volúvel, inconfiável e colérica. “Odeia de morte o que não é ela”, escreveu Ortega Y Gasset. Confunde-se, de certo modo, com o lumpemproletariado, “essa putrefação passiva dos estratos mais baixo da velha sociedade”, como escreveram Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista. As pessoas buscam a racionalidade, a análise, a reflexão. Algumas eleições correm perigo de ser decididas pelas massas. Compete à classe política estimular os eleitores a pensar, antes de decidir. Foi o que aconteceu, dando a vitória a quem lhes pareceu mais prudente, equilibrado e conservador.
O eleitorado paulistano conhece as limitações de Ricardo Nunes. Sabe que dele não deve esperar grandes realizações. Bastará, porém, que governe com prudência, que não seja corrupto, zele pelo dinheiro público, e não admita a corrupção, como ensinava o saudoso dr. Ulysses Guimarães.
Nada falha como o êxito, escreveu Kenneth Bulding, citado por Anatole Rapoport no prefácio à monumental obra Da Guerra, de Carl Von Clausewitts. São palavras sábias, que o vitorioso em política deve gravar na memória, para não se iludir e se deixar surpreender. Afinal, a vitória é apenas o primeiro passo em longa caminhada de quatro anos, cabendo-lhe estar prevenido para superar dificuldades, surpresas e traições.
Acredito que a derrota do Partido dos Trabalhadores (PT) é irreversível. Envelheceu. Permanece preso à década de 1980. Com Lula em idade avançada, não dispõe de quadros novos, jovens e robustos, em condições de o conduzirem na tarefa da reconstrução. Seu destino deve ser o mesmo do Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), que, em gesto de desespero, lançou a candidatura de José Luís Datena, derrotado com ínfima porcentagem de votos, para voltar àquilo que melhor sabe fazer: programa policial de televisão.
Para encerrar, devo dizer que desacredito da artificial divisão dos partidos em esquerda e direita. O arco partidário não é estático. Permanece, como pêndulo, em constante oscilação, na tentativa nem sempre bem-sucedida de acompanhar as variações sociais e da economia, hoje, mais do que nunca, sob a força irreversível da globalização e da informatização. Volto a Ortega Y Gasset, para quem “ser de esquerda é, como ser de direita, uma das infinitas maneiras que o homem pode escolher para ser imbecil”.
Almir Pazzianotto Pinto, advogado, foi Ministro do Trabalho e Ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST). OrbisNews, ed. jornalista Fausto Camunha, 29/10/2024.