Eleições Municipais: o fenômeno Pablo Marçal

Almir Pazzianotto Pinto

 

Desconheço algo mais imprevisível do que resultados eleitorais. A história está repleta de surpresas. O acontecido em São Paulo, neste último domingo, dia 6/10, ultrapassa, porém, as mais fantásticas expectativas.

Dois candidatos conhecidos foram surpreendidos por alguém surgido do nada, lançado por partido inexistente, sem dinheiro do Fundo Partidário e do Fundo de Financiamento de Campanha: refiro-me a Pablo Marçal.

Ricardo Nunes, no exercício do poder, tendo nas mãos a poderosa máquina da prefeitura, e contando com o apoio do governo do Estado, recebeu 1.801.139 votos, 29,48% do colégio eleitoral. Guilherme Boulos, apoiado por numeroso arco de alianças encabeçado pelo PSOL-PT, 1.776.127, ou 29,07%. O desconhecido Pablo Marçal, 1.719.274, isto é 28,14%. Alcançou votação majoritária em bairros populares, habitados por famílias das classes trabalhadoras, como no caso de São Miguel Paulista, Ermelino Matarazzo, Tatuapé, Sapopemba. Tábata Amaral teve 9,91% dos votos; José Luiz Datena, 1,84%; Maria Helena, 1,38%. Os demais não contam.

Antes de ser prefeito, Nunes era vereador; Boulos o turbulento organizador do Movimento dos Sem Moradia. Ambos velhos conhecidos. Novidade foi Pablo Marçal, uma espécie virada ao avesso do formal, calculista e frio, Geraldo Alckmin. Errático, irreverente, imprevisível, impulsivo, Marçal era desconhecido até surgir como pangaré, correndo por fora. Com assiduidade e competência já frequentava, porém, as redes sociais, atraindo seguidores entre jovens de todas as camadas, desiludidos das velhas lideranças e descrentes de falsas promessas.

Pablo Marçal foi derrotado por ínfima diferença. Com 9,3 milhões de eleitores, São Paulo reúne a nata do eleitorado brasileiro. Com o celular sempre às mãos homens, mulheres, brancos, negros, jovens e adultos, tratam de se manter bem-informados, e não apenas sobre futebol. As pessoas discutem política e têm as suas preferências. A derrota eleitoral não o desabona, tampouco obscurece o prestígio revelado pela surpreendente votação. Afinal, passou como trator sobe a deputada federal Tábata Amaral e o veterano apresentador de televisão, José Luíz Datena.

Entre as acusações que se lhe fazem, algumas verdadeiras, não se mencionam a compra de votos, e abuso de poder econômico. Dentro de dois anos, tudo indica que voltará ao cenário eleitoral, para disputar cadeira na Câmara dos Deputados, no Senado, ou a presidência da República. O tempo di-lo-á, como falaria Jânio Quadros, outra surpreendente personalidade da política nacional.

Quanto ao Partido dos Trabalhadores, temos a oportunidade de lhe acompanhar a decadência, como prenúncio da morte. O PT grevista, que alarmava empresários, classe média, pessoas de bom senso, já não existe. No ABCD, onde nasceu em 1980, não conseguiu eleger um único prefeito. O derradeiro líder de expressão é Luís Inácio Lula da Silva, o sindicalista reeleito presidente da República graças à decisão esdrúxula do Supremo Tribunal Federal. Candidato natural à reeleição, Bolsonaro foi derrotado por Lula, em 2022, por absoluta falta de competência.

Em eleições, a única coisa que se sabe, com absoluta segurança, é que o tempo passa em velocidade acelerada. Em contagem regressiva, o mandato começa a se extinguir no dia da posse. Dois anos, em termos eleitorais, são praticamente nada. Em 2025 terão início articulações visando as eleições presidenciais de 2026. As novas lideranças nacionais são o governador Tarcísio de Freitas e o presidente do PSD, Gilberto Kassab. A ambos os dois (como diria Rui Barbosa), os louros da vitória.

Outras lideranças emergirão de gerações jovens. Uma delas poderá ser o prefeito de Recife, João Campos. Outra, Tábata Amaral, se deixar de ser presunçosa. Quando a Pablo Marçal, é o enigma a ser decifrado. Se aprendeu com a derrota, e conseguir filiação em algum bom partido, talvez concorra, como sabe fazer, correndo por fora.

No Brasil, até o passado é inseguro, observou certa ocasião o professor Pedro Malan. Neste país continente prevalece a imprevisibilidade. Economicamente fraco, politicamente instável, militarmente secundário, vítima de Constituição prolixa, frágil e inaplicável, sofre os reflexos de crises externas, sobre as quais não tem a menor influência.

Os ponteiros do relógio continuam em marcha. Vamos aguardar.

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Almir Pazzianotto Pinto, advogado, foi deputado estadual, Secretário do Trabalho, Ministro do Trabalho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

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