Estado mínimo, neoliberalismo e o abandono aos pobres

Adelino Francisco de Oliveira

 

O contexto de crise, tanto no âmbito político quanto no cenário econômico, tem fomentado debates sobre o papel que cabe ao Estado na organização da vida em sociedade. O cerne de toda discussão, quando embasada em discernimento ético, deveria estar na busca por uma sociedade voltada para todos, profundamente includente, capaz de delinear estruturas que respondam, com justiça e equidade, às necessidades humanas mais básicas. Aliás essa é a grande tarefa da política, apontar soluções para que todas as pessoas possam viver com plena dignidade. Fora disso, está a barbárie, que defende dinâmicas de exclusão e abando social.

Os defensores do Estado mínimo logo se apressam em proclamar as virtudes do livre mercado, sedimentado no velho – agora travestido de novo – liberalismo econômico. Em linhas gerais o que se advoga é a noção de uma autorregulação econômica a partir do princípio da livre concorrência do mercado. Nessa concepção, na iniciativa privada estaria a solução para todos os problemas sociais. O fato inconteste é que mesmo nos países mais alinhados com o consenso neoliberal os desequilíbrios sociais e ambientais persistem e até se agravam, revelando a importância e imprescindibilidade da atuação do Estado sob a economia.

O grande avanço do mundo democrático talvez esteja justamente na sua preocupação com a coletividade, perspectivando a vida em sociedade a partir do critério do bem comum. O bem estar das pessoas deve ser a preocupação de toda decisão no campo da economia. Neste ponto, a política econômica, longe de ser concebida como uma entidade natural, passa a contemplar uma clara dimensão ética, sendo planejada e pensada para atender aos anseios de todo cidadão. A economia torna-se a base material tão necessária para o afloramento das potencialidades mais humanas. Sem essa base material a vida, a existência singular se torna escassa, reduzida, muito limitada e sem perspectivas.

Aliás esse é o ponto central: a política econômica deve assumir como baliza inegociável a construção do bem coletivo, tendo a dignidade humana como critério ético de toda e qualquer decisão e iniciativa. A produção dos bens materiais e culturais e toda riqueza acumulada devem ser socialmente repartidas, de maneira a suprir as necessidades de cada cidadão. Uma economia voltada para o desenvolvimento das pessoas, de cada ser humano em particular e de toda sociedade em geral.

Esse deve ser o debate de nosso tempo: qual o caminho para se estruturar uma sociedade que caiba todos, que preserve e defenda o direito de cada indivíduo desenvolver plenamente sua humanidade? Conceber um mundo sem pobreza não deve ser um desafio tão difícil assim. O atual modelo econômico é uma construção histórica, não é uma realidade natural, insuplantável. É possível se reconstruir as relações econômicas agora em outras bases, tendo a justiça social e a preservação ambiental como dimensões fundamentais para uma nova e diversa dinâmica de estrutura social.

O Estado, a partir de uma concepção radical de democracia, atento aos direitos de cidadania, deve dar a direção para o desenvolvimento dessa nova economia, solidária e profundamente fraterna. Livre de compreensões mágicas, que naturalizam o ideário do mercado global, a economia voltaria a ser a ciência que guarda a função de equacionar, com justiça e equidade, a divisão dos bens produzidos pelo conjunto da sociedade. Cabe à luta política projetar o Estado como grande guardião e garantidor de direitos, capaz de forjar uma economia a serviço da cidadania.

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Adelino Francisco de Oliveira, Doutor em Filosofia. Mestre em Ciências da Religião, professor do Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba; e-mail: [email protected]

 

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