Mais tolerância, minha gente!

José Renato Nalini

Vive-se uma era de ira e intolerância. Todos têm nítida noção de seus direitos, nem sempre de suas obrigações. Julga-se o próximo como o Tribunal da Inquisição e perdoa-se qualquer falta própria, seja qual for a sua dimensão. Entretanto, uma sociedade humana se destina a propiciar a todos o integral desenvolvimento de suas potencialidades, até que a integralidade das criaturas atinja a plenitude possível.

Conviver é perdoar. É relevar as falhas, que não são exclusivamente alheias, mas também são nossas. Os indivíduos bem formados até compreendem esse discurso. Querem ser exemplos éticos, quase perfeitos, longe da podridão dos demais. Só que a turba é surda à ponderação e inimiga da prudência. Leva ao patíbulo sem titubear. À menor suspeita assume feições de polícia investigativa, polícia judiciária, Ministério Público e Poder Judiciário.

É um daqueles paradoxos de que se impregna a humanidade. Um discurso, outra prática. Proclamação edificante, conduta miserável. Ninguém escapa a esse tribunal implacável, o do leviano julgamento pelos coetâneos. Dante, o incomparável artista, católico e florentino, sabia disso, tanto que escreveu: “Fastidium etenim est in rebus manifestissimis probationes adducere”, ou “É coisa enfadonha querer demonstrar o que é bastante claro”. E não escapou à maledicência.

Quando Giovanni Papini se propôs a escrever “Dante Vivo”, para resgatar o ser humano, e não o cultuado autor da “Divina Comédia”, ocupou-se das fragilidades e dos vícios de seu personagem, lembrando que é justamente isso o que o aproxima de nós e o torna irmão nosso.

Correta a assertiva de que “Em cada homem, grande ou pequeno, há uma mistura, como dizia o poeta, de fogo e esterco. Porém, só poderão ser grandíssimos, como Dante, aqueles homens que souberam livrar-se dos elementos ignóbeis ou souberam queimá-los para tornar mais viva a chama”.

E nós todos, assumamos com humildade nossas falhas para, antes de nos posicionarmos quais carrascos do próximo, primeiro nos indaguemos qual a nossa capacidade de compreender, tolerar e perdoar aquilo em que também poderíamos incorrer.

A intolerância fere o semelhante, mas transmite imagem nossa muito diversa daquela que costumamos nutrir a respeito de nós próprios. Para conforto nosso, é mais conveniente começar a cultivar uma dose especial de tolerância.

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José Renato Nalini é Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras

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