Adelino Francisco de Oliveira
Com as eleições de 2022 o projeto totalitário do extremismo de direita foi derrotado por meio do voto popular e a democracia brasileira resistiu, mas foi mesmo por um triz. A questão fundamental consiste em entender como que o Brasil chegou a um ponto político tão dramático? Como a extrema-direita, mesmo articulando discurso de ódio e desagregação social, conseguiu convencer e arregimentar tantas pessoas país a dentro? Os atos de 8 de janeiro de 2023, com a depredação e vandalismo das Sedes dos Poderes da República, evidenciaram o quanto a democracia brasileira ainda precisa ser fortalecida, tornando-se um valor perene para o conjunto da população.
Importante entender o que a palavra democracia significa e representa, de fato, para a maioria das pessoas. O que o senso comum geralmente compreende quando se depara com o termo democracia? Por que a democracia não é um valor imprescindível e inegociável para uma parcela tão significativa da sociedade brasileira? Ainda, por que é tão importante se defender e preservar a democracia? O que ela tem mesmo a oferecer ao país em geral e para as pessoas mais pobres em especial?
Tenho insistido que a democracia não pode ser uma mera palavra, com sentido abstrato e até vazio para a grande maioria das pessoas. É necessário que ela seja real e tenha uma representação concreta, objetiva e efetiva para a vida das pessoas, particularmente para a camada mais pobre da população. Esse é um ponto fundamental: a democracia deve ter um sentido real, demarcando o cotidiano da vida em sociedade a partir dos princípios fundamentais de cidadania, de direito, de justiça e de liberdade. A questão é que tais conceitos, para a maioria das pessoas, são vagos e sem conteúdo prático.
A democracia precisa ser ensinada como um princípio ético universal, passando a ser assumida pela sociedade como um valor absoluto, sendo a grande referência para as decisões do dia-a-dia. Mas para isso, não basta que o conceito de democracia figure nos livros ou nos discursos políticos, a democracia precisa ser experienciada no cotidiano das relações interpessoais e também nas estruturas das institucionais. Isso significa que não se educa para a democracia apenas de maneira teórica, é necessário que o conceito de democracia alcance uma incidência na vida prática, tornando-se o critério básico para a tomada de decisões.
Democracia pressupõe participação popular. A democracia deve ir muito além do exercício de votar e escolher os representantes para as esferas de poder e decisão da sociedade. É urgente se criar mecanismos que ampliem a participação popular, compondo uma democracia de alta intensidade, que tenha como fundamento o pleno envolvimento e participação da grande maioria da população nos debates fundamentais da vida em sociedade. Formar para a cidadania política é uma das tarefas imprescindíveis para que a sociedade alcance uma democracia participativa, de alta intensidade.
A democracia não pode ser resumida a uma dimensão meramente formal. Não existe democracia de fato sem que haja justiça social e ambiental. Esse é um ponto em que as sociedades consideradas como democráticas ainda têm muito o que avançar. As injustiças sociais e a devastação ambiental são sintomas de sociedades antidemocráticas. A melhor maneira para se preservar e fortalecer a democracia consiste na construção de sociedades profundamente justas, estruturalmente comprometidas com os direitos de cidadania. É por meio da prática da justiça, em um mundo sem pobreza, livre de todas as formas de opressão e exploração, que se educa para a democracia.
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Adelino Francisco de Oliveira, professor do Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba, Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião; [email protected]