José Osmir Bertazzoni
A arte eternizou, registrando, descrevendo e pintando obras-primas, embalando nossa memória com músicas e poesias, e criando inesquecíveis sucessos que contam a história do Rio Piracicaba e da Noiva da Colina. Às margens desse rio, repousam os vestígios de uma antiga fábrica de tecidos que sustentou gerações de piracicabanos. Esses restos, serenos junto ao Piracicaba, ocupam um sítio arqueológico que abriga os Cemitérios dos Índios Paiaguás, os primeiros habitantes dessas terras. Estamos diante da possibilidade de profanar os mortos de nossa cidade através de um projeto que ameaça destruir uma parte significativa de nossa história.
Piracicaba, outrora conhecida como “A Pujante Paulista,” está perdendo sua rica história. Já perdemos para a demolição nosso Teatro Santo Estevão, Hotel Central, nossos bondes e suas vias férreas, nossos trens (Paulista/Sorocabana), entre outros. Nosso centro histórico está em ruínas, casarões estão sendo demolidos, árvores saudáveis estão sendo abatidas, e praças estão sendo desconfiguradas para dar lugar a estacionamentos rotativos. Estamos testemunhando a barbárie da destruição de nosso patrimônio.
A Companhia Boyes desempenhou um papel fundamental em nossa jornada de desenvolvimento. Muitos piracicabanos trabalharam naquela fábrica, incluindo minha mãe, Dona Meire Guastalli, e inúmeras outras mulheres e homens. Em 1876, Luís Vicente de Souza Queiroz estabeleceu a “Fábrica Santa Francisca” às margens do Rio Piracicaba, com máquinas inglesas, empregando inicialmente 450 operários.
Em 1898, a “Fábrica Santa Francisca” (Cia. Boyes) foi vendida a um sindicato carioca do qual fazia parte Manuel Buarque de Macedo, seu futuro proprietário. O engenheiro se mudou para Piracicaba e assumiu a gestão da fábrica, esforçando-se para criar estradas de ferro que beneficiariam o escoamento dos produtos industriais do município, ligando-o diretamente pelas ferrovias Paulista e Mogiana à Capital do Estado – São Paulo. No entanto, apenas em 1922 a Companhia Paulista de Estradas de Ferro chegou a Piracicaba.
Em 1902, Rodolpho Nogueira da Rocha Miranda adquiriu a fábrica, renomeando-a “Arethusina” em homenagem a sua esposa, Arethusa Pompéia de Miranda. Em 1918, a indústria passou a ser gerida pela “Boyes Irmãos e Cia.,” composta por Herbert James S. Boyes e Alfred Simenon Boyes. Nesse período, a “Boyes Irmãos e Cia.” empregava aproximadamente 2500 funcionários, tornando-se, à época, uma das maiores empregadoras de Piracicaba.
Registramos que a Boyes enfrentou uma grave crise em 1932, recuperando sua produção durante a Segunda Guerra Mundial, quando diversificou sua produção para sacarias. A Companhia Boyes é parte essencial do patrimônio herdado de Luís de Queiroz e constitui um capítulo crucial na história.
Com este breve histórico da importância deste patrimônio para nossa cidade, trago aqui meu apoio irrestrito contra esse ato de barbárie, que visa destruir um sítio arqueológico, patrimônio histórico e cultural, parte das memórias de um dos mais ilustres cidadãos, Luís de Queiroz, desfigurando a paisagem magnífica daquele rincão sagrado que representa os incansáveis esforços de nossa gente.
O projeto dará lugar à construção de edifícios (torres) colocando uma cortina sobre a paisagem mais nobre da Noiva da Colina, restringindo-a em privilégio aos que adquirirem o empreendimento milionário, sem considerar os malefícios da proximidade com o rio e seus canais, protegidos pela legislação ambiental.
Fonte bibliográfica:
(*) Hunther H., Patrícia. Conclusão Ciência Econômica: UNIMEP, 91.
(*) Vicentini, Beatriz. Palacete Boyes: “A Província”, Piracicaba – SP, 08/08/92.
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José Osmir Bertazzoni, jornalista, advogado