Proposta foi apresentada ao final da audiência que teve a presença da secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres
O Parlamento Metropolitano de Piracicaba vai buscar articular-se com os prefeitos de seus 24 municípios membros para pleitear junto ao governo federal a instalação de uma Casa da Mulher Brasileira na região. A possibilidade ganhou força com a presença da titular da Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, Denise Motta Dau, em audiência pública realizada no salão nobre da Câmara na tarde desta terça-feira (17).
O evento, promovido pela Comissão da Mulher do PMP, presidida pela vereadora Rai de Almeida (PT), reuniu políticos do Legislativo e do Executivo de cidades da Região Metropolitana de Piracicaba, além de autoridades de órgãos de segurança e assistência social e integrantes de entidades e movimentos ligados a direitos e proteção da mulher.
Denise detalhou as medidas que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vêm adotando para o que ela chamou de “reconstrução das políticas para as mulheres no Brasil”. Um dos principais eixos é o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, lançado em 16 de agosto, que atualiza o Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio, de 2021.
Trata-se de um conjunto de ações governamentais coordenadas pelo Ministério das Mulheres com os objetivos de prevenir as mortes violentas de mulheres, em razão da desigualdade de gênero e da violência doméstica, e garantir os direitos e o acesso à Justiça às vítimas da violência e aos seus familiares.
“Os feminicídios podem, sim, ser prevenidos. Queremos ministérios, Estados, municípios e a sociedade civil engajados nesse pacto”, disse Denise, acrescentando que a iniciativa envolve ações para a mudança da “cultura de violência contra a mulher” e ampliação de serviços como as Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher (Deams), os Centros de Referência de Atendimento à Mulher (Crams) e as Casas da Mulher Brasileira (CMB).
Denise informou que a retomada do Programa “Mulher, Viver Sem Violência”, que havia sido extinto pelo governo Jair Bolsonaro, prevê a implantação de 44 unidades da CMB, contemplando todas as capitais de Estado —o que já era o propósito de quando a iniciativa foi lançada, em 2013— e expandindo-se a outras cidades de grande porte, com abrangência regional.
Os recursos virão da parcela de 5% do Fundo Nacional de Segurança Pública com aplicação obrigatória em políticas de segurança para as mulheres. “Precisa ter um enraizamento, não ficar só nas capitais. A ideia agora é implementar as CMBs em cidades do interior com mais de 500 mil habitantes ou que sejam polo geopolítico de referência. Também são requisitos ter Secretaria Municipal de Políticas para as Mulheres e indicadores altos de violência contra as mulheres”, explicou a representante do governo federal.
As CMBs a serem implantadas no interior exigirão terreno de 3.500 metros quadrados (metade das unidades das capitais), para uma área construída de cerca de 1.600 metros quadrados —embora menores, elas contarão com os mesmos serviços. “As Casas da Mulher Brasileira preveem atendimento multidisciplinar para mulheres em situação de violência: dentro delas há as Deams, Defensoria Pública, Ministério Público, Vara de enfrentamento à violência doméstica, atendimento assistencial, abrigamento por até 48 horas e trabalho na área de autonomia econômica”, disse Denise, acrescentando que a implantação também dependerá do apoio dos governos municipais e estaduais.
Rai de Almeida defendeu que o Parlamento Metropolitano de Piracicaba tome a frente de um movimento para que a região seja contemplada com uma unidade da CMB. Ela propôs que a articulação seja feita junto aos prefeitos dos 24 municípios que integram a RMP e tenha o apoio da Associação dos Municípios de Pequeno Porte do Estado de São Paulo, liderada pelo prefeito de Cordeirópolis, José Adinan Ortolan (MDB), cuja vice, Fátima Celin (PT), participou da audiência pública.
A vereadora enalteceu a presença da secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres em Piracicaba. “O ódio contra as mulheres cresce no nosso país, por isso chamamos esse debate, que extrapola a Câmara de Piracicaba e as da Região Metropolitana. É um marco na cidade e no Parlamento termos aqui a representação do governo federal, com a pauta do combate à violência contra a mulher.”
“Tivemos um período de escuridão, em que a violência contra a mulher foi legitimada pela autoridade máxima do nosso país e também contra a população negra e LGBTQIA+. Estamos no momento de resgatar a democracia do país e restabelecer as políticas públicas na nossa sociedade contra o preconceito, a discriminação, a misoginia. Sem essas políticas, não teremos uma democracia plena e, sem ela, não teremos direitos nem igualdade de oportunidades”, completou Rai de Almeida.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, justificou a ausência em razão dos preparativos para as ações alusivas aos “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, em novembro. Em mensagem gravada em vídeo, ela disse que audiência pública em Piracicaba reflete “um debate tão caro ao Ministério das Mulheres no enfrentamento à violência e à misoginia”.
“Cada dia mais, a crueldade e a violência têm aumentado. No dia 25 de outubro, o Ministério das Mulheres lançará a Marcha contra a Misoginia, em que estamos chamando empresas, governadores e prefeitos para assinarem termo de adesão para ajudar a enfrentar o ódio contra as mulheres no país”, detalhou Cida Gonçalves.
Denise complementou que a iniciativa visa “iniciar um amplo debate na sociedade”, dentro de um “processo longo de mudança da cultura machista patriarcal que está enraizada”. “Violência contra a mulher é uma construção cultural, resultado de um sistema de opressão, patriarcal, vinculado a uma visão de organização da sociedade que acaba colocando a mulher numa posição de inferioridade.”
A representante do governo federal na audiência pública também refletiu sobre a violência política de gênero. “O que temos visto é que as mulheres que ganham voz na política são discriminadas e assediadas, como se não fosse lugar dela o espaço público. Acontece no mundo do trabalho e na vida política, porque é aquela visão conservadora de que o lugar da mulher é cuidando dos filhos, da família, limitado ao papel de mãe, esposa. Portanto, tudo o que sai do estereótipo —como uma mulher com carreira exitosa— está fora da ordem conservadora, que prega que as mulheres têm um papel inferior ou submisso ao homem.”
A secretária municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Euclidia Fioravante, reportou como a pasta está se reconstruindo após o período de 2021 a 2022. “A assistência social estava bastante precarizada, tivemos um governo federal que contribuiu para a precarização de todo a assistência social. Passamos dois anos bem difíceis, com falta de estrutura e servidores.”
Ela destacou que agora a Smads conta com a Superintendência de Desenvolvimento Social, responsável por tratar de políticas intersetoriais, e destacou os serviços oferecidos pelo município, como o Cram e o abrigo para mulheres vítimas de violência com risco iminente de morte. Euclidia também apresentou o perfil das 55.108 mulheres que integram o CadÚnico, que reúne beneficiados por programas sociais.
Do total, 22.261 mulheres são mães solos, 3.704 residem em comunidades, 51 estão em situação de rua, 6.019 são pessoas com deficiência, 693 têm algum familiar no sistema carcerário e 720 sobrevivem de recolher material reciclável. Em relação à renda, 21.733 estão abaixo da linha de pobreza, com renda per capita inferior a R$ 218 mensais.
Entre as 55.108 mulheres do CadÚnico, 24.965 recebem o Bolsa Família, 4.388 o Vale Gás, 827 o auxílio gestante, 1.844 o BPC (benefício de prestação continuada) pago a idosos e 1.359 o BPC pago a pessoas com deficiência. “As vulnerabilidades têm aumentado e este é um universo maior que temos de olhar”, comentou.