Quem defende o Príncipe?

Camilo Irineu Quartarollo

 

O livro de Exupéry foi citado informalmente pelo advogado que defendia o réu pelos atos golpistas Thiago Mathar, fora de contexto, assim também como o de Maquiavel. O livro O Pequeno Príncipe, na verdade, refere-se aos estados de alma sofrida, mais que a lugares físicos. O autor da obra, Exupéry, sobrevoou Florianópolis em 1920, mas nunca disse a frase referida, a de que “os fins justificam os meios”.

Tal ditado muito batido nem mesmo Maquiavel o disse ou o cunhou. O ilustre pensador florentino escreveu O príncipe, obra sobre a Política, tão realisticamente que chega a ser cruel com os sonhos de um Príncipe. Contudo, Maquiavel argumenta historicamente, conclui, embasa e aconselha do que aprendeu e, assim, percebeu que alguns meios podem ser aceitáveis quando se atingido alguns fins, especificamente. O pensador florentino não faz frases cola-tudo, é um estudioso.

Entretanto, o advogado usando de citações azedou o plenário do Supremo e a literatura mundial e, se quis cativar, ‘descativou’ os julgadores. Ali vemos advogados de notório saber, linguistas, eruditos, conhecedores do direito e de argumentação invejável. Um bom defensor consegue retirar da pedra da Lei o necessário para atenuar o prejuízo do seu cliente, diminuir a pena, os anos de prisão, etc.

Grandes julgamentos requerem convencimento de que na Lei os réus tenham guarida e dela o defensor retire o bom direito, o bom remédio, mesmo que não absolvam os réus, concorra para um benefício legal possível. Isso, porém, não se consegue fugindo dos fundamentos da ação e da observância Constitucional. Não há que se desqualificar o juízo.

Para defender um réu não bastam meras citações de autores, nem mesmo dos gregos ou latinos. Um advogado não diz “é só dá um google aí”, um político diria, mas não um causídico – o site de busca google não é plataforma jurídica nem relatório da Polícia Federal.

Há sites na NET com frases em aspas de papas, reis, cientistas, mulheres notáveis, filósofos, cantores, escritores que se usam em algumas postagens preguiçosas de facebook, instagram, youtube, descontextualizadas. Pior seria cair na armadilha do GPT, cuja ajuda é mais analógica que digital, e há erros por associações análogas como a dos livros O Pequeno Príncipe confundido com O príncipe, de autores e assuntos diferentes.

A Raposa do livro de Exupéry confabula ao pequenino príncipe o que é cativar, entretanto o ministro Alexandre Moraes explicita ao defensor de Thiago que: “…o réu aguarda que o seu advogado venha a defender tecnicamente, venha analisar tipo por tipo. O advogado ignorou a defesa, não analisou absolutamente nada…”. Por fim, diz aos jovens alunos de Direito presentes o que não se deve fazer.

A quem serviria uma defesa empenhada em ataques à própria Corte, em coro à ultradireita e de alguns que lá se sentarão. Seria o julgamento de outro príncipe?

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Camilo Irineu Quartarollo, escrevente e escritor, ensaísta, autor de crônicas, historietas, artigos e livros

 

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