Professora Bebel
Nós, professoras e professores, não aceitamos o cerceamento de nossa liberdade de cátedra, medida adotada pela Secretaria de Estado da Educação, por meio de sua Coordenação Pedagógica, que publicou no dia 27 de julho portaria que permite a diretores de escolas, supervisores e coordenadores entrarem nas salas de aula para monitorarem as atividades dos professores e das professoras nas escolas estaduais. Qual é, afinal, a intenção da SEDUC com essa medida?
Em primeiro lugar, a liberdade de cátedra – ou liberdade acadêmica – que se traduz em liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o saber, o pensamento, a arte, é inerente à função do professor. Esse princípio é estruturante da educação nacional e como tal está insculpido no artigo 206 da Constituição da República Federativa do Brasil. De tão importante que é, o mesmo princípio é garantido no Artigo 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/1996).
Em segundo lugar, a capacidade profissional dos professores e das professoras é a eles atestada pelos concursos públicos aos quais são submetidos e por outros mecanismos de seleção estabelecidos pela própria SEDUC, quando se trata de docentes contratados por tempo determinado, os chamados professores da categoria O. Não há justificativa para que docentes sejam, portanto, fiscalizados em suas aulas.
O diretor ou a diretora de escola deve ter em mente que também foi professor ou professora e que nessa condição teve preservada a sua liberdade de cátedra. Por que deveria, na atual função que exerce, cumprir um papel de vigilância, censura e cerceamento sobre os professores e as professoras da escola que dirige.
Na minha concepção, o papel do(a) diretor(a) é semelhante à de um maestro, que conhece profundamente o ofício e rege uma orquestra, respeitando e valorizando cada integrante da orquestra, que detém saber e executa com competência o seu instrumento. Assim também são os professores. O professor é sujeito do processo ensino-aprendizagem e não pode ser reduzido a mero executor de determinações ou simples transmissor de conteúdos, programas e planos de aula definidos de cima para baixo.
A busca, a produção e a transmissão do conhecimento requer dentro das salas de aula um ambiente livre, isento de interferências externos e de cerceamentos. Professores e estudantes devem ter a liberdade de debater, questionar, pesquisar, trocar experiências em sua cotidiana apropriação do conhecimento visando não apenas a continuidade dos estudos – objetivo fundamental – como também a formação para a vida e para o exercício da cidadania.
Na sala de aula, o professor é a autoridade máxima. Cabe a ele estabelecer com seus estudantes uma relação de respeito e confiança mútuos e de trabalho conjunto em torno do processo ensino-aprendizagem. Como poderá fazê-lo se passar a ser monitorado em sua própria sala de aula pela direção da escola ou pela coordenação pedagógica?
Como preservar a autoridade do(a) professor(a) e o respeito de seus alunos(as), frente a tantos casos em que estudantes são avaliados(as) com conhecimentos insuficientes em determinada disciplina pelo(a) professor(a), que, no entanto, recebe ordem da supervisora ou supervisor de ensino para que promova tais estudantes à série seguinte?
Hoje se avolumam casos de desrespeito e até de violência contra professoras e professores nas escolas estaduais e se buscam as razões deste quadro, mas elas podem ser encontradas, em parte, nas políticas de “aprovação automática” adotadas na rede estadual de ensino a partir de 1995. O monitoramento docente em suas aulas poderá agravar ainda mais uma situação que já é dramática.
Liberdade de cátedra, caro leitor, cara leitora, não é um privilégio do professor e da professora, mas é condição para ensino de qualidade. Sem ela não há aprofundamento dos conteúdos, não há questionamentos, e sem questionamentos não existirá troca de saberes nas escolas estaduais; apenas estagnação e a eterna repetição dos mesmos conhecimentos ou das ordens produzidas nos escalões superiores. Ao mesmo tempo, nas boas escolas privadas, estudantes providos das classes mais abastadas continuaram recebendo formação de qualidade. Mais uma vez se aprofundará a precariedade das escolas destinadas aos filhos e filhas das classes trabalhadora.
Por isso, como deputada estadual e como segunda presidenta da APEOESP, buscarei todos os meios possíveis para defender a liberdade de cátedra dos professores e para que essa medida da SEDUC seja cancelada.
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Professora Bebel, deputada estadual pelo PT e segunda presidenta da Apeoesp