Acusações — Ofício do procurador aprofunda crise entre Prefeitura e Câmara

A Procuradoria Legislativa da Câmara Municipal de Piracicaba emitiu nota de repúdio contra ofício assinado pelo procurador-geral do município, Guilherme Mônaco de Mello, no qual o representante do Executivo acusa de “parcialidade” e “evidente prática de advocacia administrativa” pareceres exarados pelo departamento do Legislativo sobre o pedido de cassação do prefeito municipal.

Com uma relação cada mais instável, acentuada por conta da tentativa de abrir processo para cassação do chefe do Executivo, a atitude aprofundou ainda mais a crise com a Câmara. Diversos vereadores – entre eles, até alguns da base do governo, como Gustavo Pompeo (Avante) – reagiram de forma negativa à posição tomada pelo representante do corpo jurídico da Administração.

O documento foi lido na noite desta segunda-feira (3), durante a 17ª Reunião Ordinária, e é assinado pelas quatro advogadas que integram a Procuradoria Legislativas. Elas classificam as acusações como “gravemente ofensivas” e “caluniosas”, e também acrescentam que o conteúdo “viola a separação de poderes e consubstancia tentativa de usurpação das funções das servidoras”.

A nota de repúdio recorda as funções da Procuradoria Legislativa, conforme previsto na Resolução 5/2021, onde compete a ela a assistência, o assessoramento e o controle da juridicidade dos atos da Câmara, conferindo ao departamento autonomia técnica e independência institucional para manifestação jurídica, consultiva e judicial em defesa dos interesses públicos municipais. Salienta também que conta com quadro próprio de procuradores, sendo o procurador-chefe escolhido dentre os membros da carreira.

O documento cita ainda o Estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o qual estabelece a inviolabilidade do advogado no exercício da profissão e define, como direito, o exercício de suas prerrogativas com liberdade, e classifica o ofício do procurador-geral do município como tentativa de violação à prerrogativa da procuradora, ao tentar impedi-la de se manifestar e dar pareceres. “O pedido é incabível, posto ser inerente ao cargo de procurador legislativo a manifestação jurídica, via parecer, seja por determinação legal ou a pedido de vereador, integrante ou não da Mesa Diretora”, destaca.

As procuradoras legislativas classificam como inadequado o pedido para que os pareceres exarados pelo departamento se tornem nulos e argumentam que são de cunho opinativo e orientativo, não vinculantes, sendo de exclusiva competência do presidente da Casa a decisão pelo acatamento.

No caso da entrada do pedido de cassação do prefeito, que chegou a ser lido na reunião ordinária do último dia 30, mas acabou sendo retirado de votação por força de uma decisão liminar da Justiça, as procuradoras legislativas ressaltam que “a Presidência da Câmara acolheu os pareceres, deliberando por dar prosseguimento à denúncia”, escreve, “logo, se nulidade houvesse, seria da decisão que acolheu o parecer, mas jamais dos pareceres em si”.

Elas argumentam que, tendo o documento dado entrada na sessão e sido posto à apreciação dos vereadores – com sua leitura realizada pela 1ª-secretária da Mesa Diretora –, fica eliminado o arquivamento da denúncia por ato individual do presidente da Casa, e só poderia ser concluído naquele momento ou por decisão da maioria simples ou por ordem judicial.

“A tentativa de constranger a autonomia e a independência da Advocacia Pública do Poder Legislativo deve ser absolutamente combatida”, acrescentam as procuradoras legislativas, e concluem o documento afirmando o “amplo e irrestrito repúdio à acusação abjeta de ‘advocacia administrativa’ e total contrariedade aos pedidos formulados pelo procurador-geral do município”.

Vereadores repudiam acusações e apoiam Procuradoria Legislativa

Durante a 17ª Reunião Ordinária, na noite desta segunda-feira (3), vereadores da Câmara Municipal de Piracicaba repudiaram acusações feitas pelo procurador-geral do município, Guilherme de Mônaco, contra a Procuradoria Legislativa da Casa e manifestaram solidariedade às servidoras que atuam no departamento. Na ocasião, foi lida nota de repúdio ao ofício do procurador.

“O Executivo resolveu ir a caça-bruxas. Já intimidam o vereador de fazer o seu trabalho, agora vão intimidar o Jurídico desta Casa, os funcionários de carreira serão oprimidos”, questionou o vereador Cássio Luiz Barbosa (PL), Cassio Fala Pira. “Essa Casa não vai aceitar isso, não”, acrescentou.

O vereador Gilmar Rotta (PP) disse que “é lamentável a atitude do procurador” e classificou como “falta de respeito com a Câmara, especialmente com as servidoras da Casa”. Ex-presidente do Legislativo, ele disse que a atitude do procurador-geral do município é “uma palhaçada” e lembrou, ainda, que o servidor de confiança do prefeito “enviou um projeto de lei inconstitucional para reajustar os salários dos agentes públicas da Administração”, em referência ao projeto de lei 51/2023, votado no último dia 24 de março.

“É lamentável o que está acontecendo hoje. Cada um tem que cuidar da sua vida, do seu departamento. Não venha se meter aqui. Nossos servidores têm total responsabilidade, comprometimento com o que é legal. Respeito é bom e os nossos servidores merecem. Exijo que ele respeite esta Casa, principalmente os servidores. Nunca vimos isso na cidade”, reclamou o vereador Pedro Kawai (PSDB).

O vereador Laércio Trevisan Jr. (PL) disse que a proposta do procurador-geral do município é inconstitucional e viola os princípios básicos da Casa. No ofício, o representante da Prefeitura pediu anulação de pareceres e proibição da procuradora-chefe em analisar novas proposituras. “Eu deixo o meu repúdio por essa tentativa de coação”, concluiu.

Presidente em exercício, Rerlison Rezende (PSDB), o Relinho, disse que a Mesa Diretora está buscando todas as providências cabíveis. “Defenderemos, si, os funcionários desta Casa”, acrescentou.

“Fica a minha total solidariedade. Isso é uma tentativa de cercear o direito e colocar a advogada desta Casa em uma situação de suspeição, de que ela estaria impedida de se manifestar. Fica o meu repúdio ao procurador do município por tentar violar a liberdade do advogado”, disse o vereador Paulo Campos (Podemos).

A vereadora Rai de Almeida (PT) definiu como “erro crasso” a atitude do procurador-geral do município. “Ele não leu o artigo 2º da Constituição Federal, quando diz da independência dos poderes, que são, além de independentes, são também harmônicos. Eles não se subordinam um ao outro, e nem tem uma hierarquia entre um e outro”, disse a parlamentar.

“Me solidarizo com as advogadas. Li com tremendo desgosto essa carta. Fazemos por obrigação. O advogado é indispensável e inviolável em suas manifestações. Achei soberba do procurador-geral do município querer ingerir na Câmara”, disse o vereador Gustavo Pompeo.

O vereador André Bandeira (PSDB) disse que as procuradoras legislativas “responderam à altura” o ofício do procurador-geral do município e classificou o ofício como “absurdo”. “Tenho certeza que se ele consultasse os procuradores concursados da Prefeitura, eles seriam contrários a essa manifestação”, disse.

A vereadora Ana Pavão (PL) também se solidarizou com as advogadas e lembrou que, como ex-integrante da Mesa Diretora, “posso dizer que elas não fizeram nada do que não tenha sido solicitado ou seja rotina da Casa”, disse.

A vereadora Silvia Morales (PV), do mandato coletivo A Cidade é Sua, classificou como “lamentável” o que definiu a ingerência do procurador-geral do município. “Cabe o encaminhamento deste documento à OAB e, talvez, a gente possa fazer uma comunicação mais formal”, considerou.

O vereador Josef Borges (Solidariedade) manifestou solidariedade à procuradora-chefe Patrícia Kimura, mas salientou eu “houve, sim, um erro”, disse o parlamentar. “Quando recebeu a certidão negativa eleitoral, não se atentou que o cidadão não estava de acordo com o sistema eleitoral”, disse o líder do governo na Câmara. “Hoje a política é a de confronto. Mas em confronto, ninguém ganha. Por isso, espero que a gente possa conversar e chegar a um acordo, tanto do Executivo quanto do Legislativo”, concluiu.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima