Rodolfo Capler
Segundo os pesquisadores da Universidade de Harvard, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, autores de “Como as democracias morrem”, estudo recente sobre o fenômeno de desintegração democrática mundial, são duas as normas fundamentais da democracia: tolerância mútua e reserva institucional. Conforme os autores, “a tolerância mútua diz respeito à ideia de que, enquanto nossos rivais jogarem pelas regras institucionais, nós aceitaremos que eles tenham direito igual de existir, competir pelo poder e governar”.
Não quero aqui incorrer na pretensão de fazer análise política conclusiva sobre a atual conjuntura nacional, porém exprimo minha sincera preocupação com o modo que conceito de alteridade tem sido tratado em nosso país. Conforme o pensamento dos autores citados, a democracia se fundamenta na tolerância e na convivência com o diferente. O que temos visto no atual momento de efervescência política, é exatamente o contrário do princípio democrático. Quem pensa diferente é visto como um inimigo a ser abatido! Portanto, não há debate de ideias, tampouco diálogo sincero. Ninguém mais ouve ninguém.
Hoje o país está dividido entre quem é de “direita” e quem é de “esquerda”; é o famoso e antigo “nós” contra “eles”. Esse maniqueísmo ideológico tem afetado relacionamentos interpessoais e minado as forças democráticas de nossa nação. Se, por exemplo, alguém se manifesta a favor da família tradicional e dos “bons costumes” é tachado de reacionário, neofascista e intolerante. Já quem se levanta em defesa das minorias, em prol dos direitos humanos e da igualdade social, é achincalhado como baderneiro, defensor de bandido e imoral. Lamentavelmente, há um grande obscurantismo pairando sobre nós. Nos falta equilíbrio nas análises conjunturais. Há pouca ou quase nenhuma sobriedade na avaliação dos fatos e apenas um resquício de racionalidade no debate público – debate que é travado no novo espaço coletivo que são as redes sociais.
Não tem como, diante disso, não refletirmos sobre algumas questões. Qual o é caminho e quais são os descaminhos de uma nação onde a tolerância aos que pensam diferente é quase nula? Aonde iremos chegar como civilização, em meio a tanto ódio e polarização?
Penso que o remédio para essa surdez e falta de sensibilidade ao próximo, é o bom e velho diálogo, onde um fala e o outro escuta. Assim, faço uso das palavras do psicanalista Contardo Calligaris, que em artigo recente disse: “Quando as pessoas se falam, descobrem que concordam mais do que discordam […], por exemplo, que sejamos de esquerda ou de direita, queremos que todos tenham uma vida decente, a discórdia é sobre os meios para chegar lá”. Precisamos nos falar mais; ouvir o que o outro tem a nos dizer. Só assim construiremos uma sociedade democrática, menos desigual e mais livre. Dessa forma, eu o conclamo ao diálogo. Ouça as pessoas e não se esqueça de que quem pensa diferente de você não é seu inimigo.
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Rodolfo Capler é teólogo, colaborador da Revista Veja e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP.