Duvido que você nunca ouviu essa expressão, não é mesmo?
A antiga expressão vem transcendendo no mundo dos negócios e ainda hoje é muito usada.
De origem duvidosa, a tradição nos conta que os negócios feitos “no fio do bigode” nos remontam há um tempo que precede o lacre, a assinatura e a rubrica.
Eram os tempos dos fios de bigode e a palavra valia tanto quanto um só fio. Afinal, homem que era homem, usava bigode e para usá-lo tinha que ser cumpridor de seus compromissos, custasse o que custasse. Tinha que ter na cara, além da barba, dignidade.
Bigodudos inspiradores
Claro que você também tem os seus bigodudos favoritos e eu vou citar os meus aqui: Charlie Chaplin; Freddie Mercury; Sócrates; Darcy Ribeiro; Belchior; Justo Verissimo e Prof. Raimundo (estes últimos são personagens bigodudos do icônico cearense Chico Anísio).
Especiais
Hoje quero escrever sobre os bigodudos Chico Anísio, Belchior e Darcy Ribeiro. O trio tinha em comum uma incrível análise e, até mesmo, crítica social, sempre com imensurável perfeição linguística.
Darcy Ribeiro, bigodudo I
Neste último 17 de janeiro, complementamos 25 anos sem Darcy Ribeiro. Filiado ao Partido Democrático Trabalhista – PDT, foi antropólogo, historiador, sociólogo, escritor e político brasileiro. Ocupou diversos cargos, entre eles o de vice-governador de Leonel Brizola no Estado do Rio de Janeiro e Senador.
Darcy é especialmente reconhecido por seu foco em relação aos indígenas e à educação no país. Ao lado de Leonel Brizola e Oscar Niemeyer constituiu, por exemplo, os mais de 600 CIEP’s (Centro Integrado de Educação Pública) e também o sambódromo na avenida do samba, a Marquês de Sapucaí.
Darcy x Colégio Militar
Por todo Estado do Rio de Janeiro, é possível perceber a presença das obras desenhadas com o traço do arquiteto Oscar Niemeyer e preferencialmente construídos em locais “inusitados”, como nos morros cariocas ou nas longínquas periferias.
Inconfundíveis, os edifícios de bordas arredondadas, são registros históricos de um pensamento que sempre estava à frente da sua realidade.
O histórico bairro do Catete, na capital fluminense, que também sediava o palácio residencial do ex-presidente Getúlio Vargas, foi escolhido para receber a primeira unidade. Inaugurado no dia 8 de maio de 1985, o Ciep Tancredo Neves, com seu simbolismo, agregava salas de leitura e de artesanato, uma quadra esportiva, consultórios médico e odontológico e até dormitórios para alunos em situação de vulnerabilidade social.
A Didática de Darcy
Para Darcy, as responsabilidades da escola eram educar em vez de instruir; formar homens com pensamento livre em vez de homens domados; preparar para um futuro incerto em vez de transmitir um passado errôneo e ensinar a viver com mais inteligência, mais tolerância e mais felicidade. Em síntese: para Darcy a função da escola é ensinar a pensar. E o que é pensar? Pensar é transformar o desconhecido em conhecido, é ensinar a questionar e a resolver problemas. E se a escola tem a função de ensinar a pensar, basta olhar para o Brasil para enxergarmos os problemas. Porque sim, nossa sociedade tem uma série de problemas sociais para serem resolvidos! Então, não há como ensinarmos a pensar se esse pensamento não for um pensamento essencialmente questionador. E as ditas escolas cívico-militares são instituições que tem como fundamento a disciplina, transformam alunos em robôs, em cumpridores de ordens sem questionamento. Soldados não pode questionar ordens porque a base do exército é hierarquia e a disciplina. Ou seja, cumpre-se ou seja punido.
Não aos colégios cívico-militares
Promessa de campanha de Bolsonaro, o modelo de escolas cívico-militares é o único projeto apresentado pelo MEC (Ministério da Educação) para a educação básica deste (des)governo trágico.
A proposta não tem nenhuma outra explicação que não seja atender a um interesse de posicionamento político-ideológico do grupo que está hoje (des)governando nosso Brasil.
O que verdadeiramente se pretende é incutir na população brasileira a falsa impressão de que os militares estão acima do bem e do mal ou que não existe nenhum caso de corrupção nos quartéis ou que são pessoas mais íntegras e qualificadas do que os civis. A generalização é inconsistente.
Como funciona?
Nas escolas cívico-militares, a gestão é compartilhada entre civis e militares. O decreto que institui o programa prevê que militares da reserva atuarão tanto na área administrativa como nas áreas pedagógica e educacional.
Cabelos bem amparados para os meninos, meninas de coques, uso de fardas e taxas cobradas dos pais ou responsáveis para os uniformes e para manutenção dos colégios; apesar de apresentadas como voluntárias, são impostas obrigatoriamente de maneira velada.
Processo de seleção
Para estudar num colégio cívico-militar, os estudantes devem se submeter a um processo de pré-seleção e somente os estudantes que tenham as condições necessárias para estar nessas escolas podem ser matriculados.
E, ainda, algumas outras escolas fazem reservas de vagas para estudantes filhos de policiais militares.
Direito a escola pública X segregação social
Darcy Ribeiro junto com Leonel Brizola e Oscar Niemeyer instituíram o maior projeto educacional do Brasil, a verdadeira revolução da educação pública, que foi a sua disponibilização da educação com qualidade para todos os estudantes.
E na contramão desta atuação estão as escolas cívico-militares, que já nascem sob o estigma de escolas públicas elitizadas, onde a condição profissional e socioeconômica das famílias de estudantes passam a ser critérios de corte para definir quem pode ou não estudar. Por que? Porque os números atestam que a maioria dos selecionados nos processos seletivos são oriundos de melhores acessos anteriores a educação, ou seja, frequentaram escolas ou cursos particulares, por exemplo.
Bigodudo II
Aí entra Chico Anísio: ao longo de 44 anos de carreira na Globo, o humorista interpretou mais de 150 personagens. Muitos estilos e bordões consagrados permanecem até hoje na memória dos brasileiros, como: “E o salário, ó” ou “Quero que pobre se exploda”. É impossível não nos recordarmos dos bigodudos Professor Raimundo ou do político corrupto Justo Verissimo.
A crítica social sempre foi presente nos muitos personagens do cearense Chico Anísio e é impossível não fazermos brincadeiras e adotarmos seus bordões. E neste momento de polêmica entre as escolas cívico-militares, o povo piracicabano se deleita com piadinhas usando os bordões de Chico Anísio diante dos defensores das escolas cívico-militares!
Made in Ceará I
Vem também do Ceará os melhores índices educacionais da educação pública: das 100 melhores instituições públicas de anos iniciais do Brasil, 82 estão no Ceará. A consagração vem de órgãos nacionais e internacionais.
Made in Ceará II
Vem também do Ceará, da cidade de Sobral, o outro bigodudo que quero citar neste artigo: o cantor e compositor Belchior.
Entre tantas canções inspiradoras, ‘Galos, Noites e Quintais’, pra mim, reina entre as melhores.
Esta era a música preferida de Chico Anysio, que chegou a cantá-la no programa Sr. Brasil, de Rolando Boldrin, que foi ao ar em dezembro de 2006.
Belchior, o bigodudo III
Nascido no Ceará, na cidade de Sobral, as músicas de Belchior tinham letra, contavam histórias, expressavam sentimentos, expunham ideias, faziam críticas sociais, enfim, tinham contexto. Eram poesias riquíssimas que enobreciam a língua portuguesa. As melodias eram sofisticadas e inovadoras.
Made in Sobral II
Vem também da cidade de Sobral as melhores avaliações positivas que lhe consagraram pelo Senado e pela ONU como a capital da educação do Brasil.
O modelo educacional executado em Sobral é tão bem-sucedido que virou base para projetos nacionais implementados em mais 5.300 municípios do país.
A cidade é também reconhecida por ser o município cearense com maior número de trabalhadores com carteira assinada e por apresentar um alto índice de desenvolvimento humano (IDH de 0,714).
Segundo o Índice de Governança Municipal, entre os anos de 2016 e 2018, Sobral atingiu nota máxima no desenvolvimento de políticas públicas para educação e segue com notas altas nas áreas de saúde (9,43 em 2018) e qualidade habitacional (9,85 em 2018). Uma medida determinante para alcançar tais resultados foi a criação do Programa de Alfabetização na Idade Certa, depois ampliado para todo o Ceará e que inspirou o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – série de estratégias de aprendizagem e alfabetização desde os primeiros anos escolares até o 2°ano do ensino fundamental.
Ano passado eu morri
Um trechinho de uma famosa canção de Belchior novamente nos faz refletir.
Estamos vivendo uma profunda crise ética. Os valores se confundem, virtudes e pecados trocam de lugar. Ser humilde é ser feio? Ser sonhador é ser patético? Ser pragmático é ser altivo?
Mas, este ano eu não morro
Precisamos, neste ano eleitoral tão decisivo para nosso país, nos reencontrar com os poucos líderes políticos que nos apresentavam um caminho, um projeto real. Líderes que podemos admirar, e que, mesmo discordando de algumas de suas propostas, sabemos que são idealistas e que acreditam no que dizem, que perseguem seus ideais de mundo, que estão na vida pública por altruísmo verdadeiro e não por interesses pessoais.
O novo sempre vem
Creio que essa nostalgia por militarização se deve por estarmos vivendo um grande vácuo. O “Velho” já se foi faz tempo e o novo ainda não está presente. Estamos parados num limbo ético e estético. À pobreza política, soma-se a pobreza cultural.
O novo sempre vem II
Quer dizer que o passado e o presente apresentam soluções eficientes para uma verdadeira revolução na Educação Pública Nacional?
Quer dizer que o Estado do Ceará conseguiu praticar a melhor educação pública do país?
Quer dizer que o Estado do Ceará e a cidade cearense de Sobral são administrados pelo grupo político do pré-candidato a Presidente da República Ciro Gomes?
Quer dizer que este ano temos eleições nacionais?
Quer dizer, então, que temos mais uma chance?
Encerro este artigo com uma frase que traduz a nossa missão: “Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. Mas nós conseguiremos, jovens amigos, não é verdade?” (Rosa Luxemburgo)
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Carolina Angelelli, presidente do PDT de Piracicaba