Alvaro Vargas
O aborto de crianças vítimas de violência sexual, é um tema árido para ser analisado sob qualquer aspecto, filosófico ou ético. As mulheres que sofrem esse crime hediondo, podem adquirir sequelas psicológicas, que talvez requeiram várias reencarnações para a sua plena recuperação. Sob o aspecto legal, no Brasil o aborto é permitido em caso de estupro da mulher. Na visão espírita, compreendemos que esse crime, envolve três indivíduos diretamente (gestante, nascituro e estuprador), além dos espíritos obsessores que participaram desse crime. Sendo uma doutrina cristã, o Espiritismo condena o aborto. “Uma mãe, ou quem quer que seja, cometerá crime sempre que tirar a vida a uma criança antes do seu nascimento, por que isso impede uma alma de passar pelas provas a que serviria de instrumento ao corpo em formação” (Livro dos Espíritos, Q-358). Entretanto, entendemos que o codificador da doutrina espírita se referia particularmente ao aborto praticado voluntariamente por mulheres imprevidentes, que tiveram uma gravidez não programada e desejavam se livrar do feto para praticar a sexualidade desregrada, ou aquelas, coagidas pelo parceiro a praticá-lo.
No caso do estupro de uma mulher adulta, o ideal é que a vítima aceite o nascimento deste filho, criando-o normalmente, ou que permita, pelo menos, a sua adoção, preservando uma vida. Quem é o espírito reencarnante? Pode ser um dos obsessores, que por vingança relacionada às mágoas decorridas de acontecimentos pretéritos, induziu o estuprador. Compelido a reencarnar, conforme as leis maiores da vida, reencontra a mulher, seu algoz em existência passada, de modo que consigam o perdão mútuo, como mãe e filho. Segundo o espírito Emmanuel (Vida e Sexo, cap. 17, Emmanuel e Chico Xavier), “caso o feto seja abortado, ele pode voltar-se contra a mãe e todos aqueles que se envolveram na interrupção da gravidez”. Pode também ocorrer, de o nascituro ser um espírito amigo, na missão de ajudar a mãe a superar essa expiação tão dolorosa. O Espiritismo esclarece que não existe uma programação espiritual para esse crime. São as nossas mazelas morais, acumuladas durante as iniquidades praticadas em existências pregressas, que criam um magnetismo negativo, atraindo as almas afins. Podemos eliminar essas energias no curso das experiências reencarnatórias, mas quando não trabalhamos em nossa reforma íntima, vivenciado o amor conforme nos ensinou Jesus, nossas vibrações atraem indivíduos e espíritos atrasados para junto de nós, originando essa transgressão.
Existem relatos de estupro de meninas, com pouco mais de 9 anos, cuja violência sofrida acabou resultando em uma gravidez indesejada. Se para uma mulher, o processo de recuperação para esse delito já é difícil, no caso de uma criança, devido à estrutura física e psicológica ainda em formação, esse impacto é quase insuperável. É uma gestação de risco, e caso seja mantida a gravidez, isso poderá ocasionar danos severos a sua saúde física e mental. Os espíritos sugerem o uso do bom senso nessa análise, conforme resposta à Allan Kardec (O Livro dos Espíritos, Q-359): “No caso de o nascimento da criança colocar em perigo a vida a gestante, haverá crime em sacrificar a criança para salvar a mãe? É preferível sacrificar o ser que ainda não existe a sacrificar o que já existe.” No estupro de uma criança, a situação diverge totalmente da violência praticada contra uma mulher apta para a procriação. Os riscos existentes durante a gravidez de uma menor, considerando o corpo físico em formação e sem maturidade psicológica, não recomenda uma gestação completa, principalmente depois do abuso sexual. Existe grande possibilidade de ocorrerem danos físicos e mentais irreparáveis. Nesse caso, o aborto é preferível, sendo um mal menor. Devemos realizar uma análise séria e fraterna dessa questão, que seja desprovida de fanatismo religioso. A criança que sofreu essa lesão, tem o direito a uma infância saudável, associada à assistência médico-terapêutica, de modo a evitar maiores danos físicos e psicológicos à sua saúde.
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Alvaro Vargas, engenheiro agrônomo, Ph.D., presidente da USE-Piracicaba, palestrante e radialista espírita