O crescimento evangélico, eleição e o pastor no STF

Rodolfo Capler

 

Hoje, no Brasil, nenhuma discussão política séria pode desconsiderar o crescimento massivo dos evangélicos. A fé evangélica tem se capilarizado em nosso país, estando visivelmente presente em todo o tecido social. Segundo estatística divulgada pelo Instituto DataFolha, um em cada três adultos no Brasil se identifica como evangélico.  Eu, que venho de tradição evangélica —  sendo apresentado e criado numa igreja Batista histórica no início dos anos 90, (quando os evangélicos eram apenas 9% da população), e que vivi o final da minha adolescência no começo dos anos 2000, quando já representavam 15,6% —, me surpreendo a cada nova pesquisa que aponta para o aumento numérico do grupo religioso no país.

Conforme uma pesquisa realizada em 2020 pelo Instituto DataFolha, os evangélicos representam 31% da população (mais de 65 milhões de pessoas). A adesão à religião evangélica no Brasil se dá predominantemente entre indivíduos das classes mais baixas; a maioria se filia as igrejas pentecostais e neopentecostais. De acordo com o Censo Brasileiro, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em 2010, 60% (25,3 milhões), dos evangélicos eram pentecostais.

Em uma projeção linear do cenário religioso no Brasil, o doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (CEDEPLAR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), José Eustáquio Diniz Alves, prevê que em 2036 os evangélicos chegarão a 40,3 % da população, ultrapassando os católicos, que cairão para 39,4%. Se essa projeção se cumprir, em 15 anos o Brasil se tornará uma nação predominantemente evangélica, com um número cada vez maior de jovens e crianças se juntando as suas fileiras.

Diante desse cenário a pergunta “Por que os evangélicos crescem tanto?” tem recebido olhares de sociólogos, antropólogos, pesquisadores e cientistas da religião. Dentre os diversos fatores desse crescimento, destaca-se a presença social das igrejas nas periferias e rincões do Brasil. Em “Povo de Deus”, o sociólogo Juliano Spyer descreve o modo como as igrejas evangélicas (sobretudo as pentecostais) estão abraçando as pessoas esquecidas pelo Estado. Segundo Spyer: “As igrejas evangélicas funcionam como estado de bem-estar social informal ocupando espaços abandonados pelo Poder Público”. As igrejas doam cestas básicas, mediam conflitos conjugais, cuidam dos doentes, acolhem os marginalizados, visitam os aprisionados e promovem a aculturação de uma massa de pessoas invisibilidades. Até mesmo o conservadorismo evangélico, em certa medida, conforme recentes pesquisas, impacta positivamente famílias, inclusive jovens que estão próximos ao crime organizado e vulneráveis ao uso de drogas.

Esse fator de crescimento das igrejas evangélicas é menosprezado ou ignorado pela grande mídia, assim como pela intelectualidade brasileira que costumam atribuir o êxito evangélico à manipulação religiosa conduzida por lideres e pastores com interesses escusos e à atração da lógica neoliberal que é reverberada nos púlpitos pela “teologia da prosperidade” que enfoca o individualismo e a meritocracia.

Enquanto a fé evangélica e os evangélicos não receberem um tratamento sério por parte da sociedade como um todo e a medida que forem estereotipados como fascistas, ignorantes e autoritários,  a “revolução silenciosa” (expressão utilizada por Eustáquio para denotar a transição religiosa na qual os evangélicos assumem a hegemonia no país), ocorrerá, distanciando-os de propostas políticas identificadas como progressistas e mais centristas e aproximando-os decandidatos populistas e reacionários. Isso aconteceu em 2018, na eleição de Jair Bolsonaro que angariou os votos de aproximadamente 21 milhões de evangélicos.

Muito provavelmente a próxima eleição presidencial será definida pelo voto do eleitor evangélico. Enquanto a eleição não chega, presenciaremos a corrida dos diversos setores do espectro políticopara conquistar o favor e o coração dos fiéis. Como se pode ver Bolsonaro já iniciou essa corrida acenando mais uma vez ao seguimento religioso com a indicação do pastor André Mendonça para a vaga do STF – um candidato que pode vir a ser um ministro terrivelmente evangélico.

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Rodolfo Capler, teólogo, escritor, pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP

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