Adelino Francisco de Oliveira
A religião, ao longo da história, sempre foi utilizada como um dos mais poderosos e eficazes instrumentos para a manipulação e controle das massas. Este tema começou a ser enfrentado com mais densidade no século XVIII, com a crítica filosófica à religião. Pensadores como Friedrich Nietzsche, Ludwig Feuerbach, Karl Marx e Sigmund Freud elaboraram as mais densas análises sobre o sentido da religião.
Talvez a mais conhecida crítica à religião esteja sintetizada na celebre frase de Karl Marx, presente em seu livro Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, de 1844, quando o filósofo afirma que a religião é o ópio do povo. A dura crítica de Marx procura denunciar a utilização da religião como meio para produção de uma consciência fragmentada e alienada de mundo. A religião seria uma espécie de entorpecente, com o poder devastador de suplantar das pessoas o senso crítico, a capacidade de perceber as contradições da realidade.
A crítica filosófica à religião ganha contundência e atualidade quando nos deparamos com os desdobramentos políticos e sociais oriundos da visão fundamentalista, que tem embasado diversas concepções religiosas no contemporâneo. O fundamentalismo, de modo geral, consiste em uma compreensão religiosa deformada, débil no discernimento teológico e incapaz de alcançar a profundidade da mensagem religiosa.
Sem dúvida a visão fundamentalista é um grande mal, tanto para as religiões quanto para as sociedades no contemporâneo. O fundamentalismo limita as perspectivas da religião, reduzindo os fiéis a meros fanáticos, sem o mínimo discernimento teológico. A experiência religiosa passa a ser cooptada para servir a interesses de poder.
No caso do cristianismo, o fundamentalismo acaba propondo compreensões literais sobre a revelação bíblica, carecendo do estudo analítico próprio da exegese e das ponderações críticas da hermenêutica. O conhecimento teológico mais elaborado, decorrente do avanço da ciência bíblica, encontra-se totalmente ausente das percepções e conclusões fundamentalistas. O resultado é um cristianismo corrompido, diminuído, muito distante e em profunda contradição com os ensinamentos mais genuínos e centrais do movimento de Jesus.
A saída para esse complexo caos social está no fortalecimento do Estado laico, livre da tutela das religiões. Mas é fundamental também o aprofundamento da democracia cultural, possibilitando que os bens culturais sejam acessíveis ao conjunto da sociedade. A formação crítica, visando à cidadania política, é um importante antídoto contra uma concepção religiosa que pode alienar, manipular e justificar sistemas de opressão e exploração.
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Adelino Francisco de Oliveira, professor no Instituto Federal, campus Piracicaba. Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião; [email protected]; @Prof_Adelino