Adelino Francisco de Oliveira
Pode até parecer estranho para alguns, particularmente para aqueles que já se convenceram que estamos no território de uma Itália remota, mas, para além do que é mais imediato, Piracicaba profunda é marcada pela diversidade étnico-cultural. É uma cidade que retrata o sentido maior e existencial do povo brasileiro, com toda sua história de miscigenação e sincretismo.
A miscigenação constitui-se a partir da mistura entre tantos povos: para nós, a herança indígena, africana e europeia é o que nos marca. As matrizes fundamentais do povo brasileiro se fazem também presentes na formação da nossa gente piracicabana. O sincretismo se traduz no ecletismo de diversas culturas, compondo um complexo caldeirão cultural, com muita beleza, criatividade, pujança, cheia de cores e muita originalidade. As dimensões da miscigenação e do sincretismo dão o tom de um povo novo, aberto e com uma beleza única.
Nos diferentes bairros da cidade, essa diversidade étnica e cultural vai revelando seus traços e suas características mais marcantes e peculiares. Há a comunidade de mineiros, com quase todos os conterrâneos oriundos da mesma cidadezinha de Minas Gerais. Encontramos os baianos, com sua culinária cheia de temperos e muitos sabores. Conhecemos também todos que vieram de Pernambuco, da Paraíba e ainda do Ceará. Elencar é sempre um risco, pois Piracicaba contempla talvez a força de todas as regiões do país.
Quando se abordam as heranças culturais de Piracicaba, é justo destacarmos os bairros rurais de Santana e Santa Olímpia, que abrigam as comunidades tirolesas e trentinas, guardando a memória das regiões do Tirol e de Trento. Mas há uma Piracicaba profunda, que se projeta para muito além do que comumente se imagina, pronta a ser descoberta.
Interessante seria fazer esse itinerário cultural e regional pelos recantos de Piracicaba. Percorrendo os bairros mais periféricos da cidade, é possível se deparar, principalmente, com a forte presença do nosso Nordeste. O bairro Bosques do Lenheiro, por exemplo, com a presença marcante de nordestinos de tantos Estados do país, particularmente da Bahia. Lá reinam os sotaques típicos – não de um caipiracicabananismo – e também os temperos e sabores culinários do Nordeste. O restaurante Cheiro Verde, situado no coração do Bosques, é uma referência para quem aprecia a culinária baiana e nordestina.
É fundamental retirar da invisibilidade essa Piracicaba profunda, a partir do conhecimento de um cotidiano ainda escondido. Cada bairro da cidade, com sua gente, traz uma rica história de luta por uma vida mais plena em dignidade. É urgente fomentar o sentimento de pertencimento, através da valorização de cada território. A cidade é constituída de muitos bairros, com suas identidades especificas, prontos para serem amados.
É fácil experimentar pratos típicos, tradições de danças, musicalidades e muita religiosidade nas periferias da cidade. Conhecer essa Piracicaba plural é mergulhar na identidade do povo brasileiro. É preciso estar aberto para a diversidade. Reconhecer diferenças, coloridos, alteridade do nosso povo é o primeiro caminho para entender, com tolerância e orgulho, que há uma cultura que se constrói única, rica e heterogênea, estilizando uma cidade que para o mundo mostra o que é o Brasil profundo.
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Adelino Francisco de Oliveira, professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião; e-mail: [email protected]