Camilo Irineu Quartarollo
Votou está votado, não pode ficar revoltado, ara!
Acabou a febre, fim de jogo, passa a vassoura, passa o bastão, o gari vai varrer todos os santinhos das ruas e praças. No dia seguinte é ver o que vai piorar, enquanto o candidato perdedor some, às vezes pode ser reconhecido passeando pela França, Suíça ou EUA e, ao voltar, alguns ganham um carguinho de consolação.
A cada quatro anos votamos para escolher alguém que, de posse do nosso voto, faz o que quiser.
Acho que votamos errado, “votamos em alguém que vai resolver os nossos problemas, alguém que sabe administrar a nossa cidade, alguém que é honesto para lidar com nossos impostos, que vai cobrar o nosso IPTU, nossa tarifa de água, privatizar nossos patrimônios, alguém que é competente para fazer obras públicas, alguém que vai implantar isso e aquilo”. Demos tudo que “é nosso” à eleita ou ao eleito!
Nos omitimos nas reuniões de condomínios, de pais e mestres, do bairro, nas sessões de câmara de projetos polêmicos, etc., consentindo sempre sem opinar, quer seja sobre mobilidade urbana, saúde, educação, ecologia e outros. O exercício da cidadania requer isso: ouvir, falar e, assim, possamos aprender a política que mexe com nossa vida. O prefeito ou vereador não é um demiurgo que pode dar uma cadeira de rodas, mas alguém que vai prevenir o acidente, não são pessoas que vão ajudar a “minha família”, mas vão dar condições a todos, e por obrigação do cargo.
Precisamos de gente para cuidar da cidade, de gente que use tão bem uma caneta como se usa uma vassoura, pilota um carrinho de gari ou manuseia a colher de pedreiro, pontuais nas reivindicações, que mexam na pauta rígida dos eleitos.
A democracia é a construção da pátria. A maioria sem detrimento da minoria não é uma competição voraz, mas uma composição. Os perdedores cedem ao vencedor todo o apoio e deferência, consentindo na vitória para o bem comum, das empresas, dos ministérios, do serviço público, enquanto emanação das urnas.
Importante que mesmo ganhando o candidato avesso ao nosso gosto vai ter de respeitar certas pautas, incorporar certas demandas que seu programa de governo não previu e, assim, se constrói a democracia. Muitos veem ora otimistas demais com suas “apostas”, ora descontentes como perda num turfe. Alguns ainda ressentem de arrumar uma “colocação” para sobrinho ou parente. Porém, as coisas não mudam de um dia para outro ou de uma eleição para outra, num concurso próprio da história.
Precisamos sim de mais reuniões de condomínios, bairros, escolas, mais empregos e menos indicações de padrinhos, mais jardins e menos prédios, menos hospitais e mais médicos atendendo e orientando, menos remédios e mais cuidados com a saúde, mais futebol e menos brigas, mais gentileza e menos brutalidades, mais inteligência e menos burrice, ara!
Afinal, a democracia emana do povo, não é mesmo?
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Camilo Irineu Quartarollo, escrevente e escritor independente, autor de A ressurreição de Abayomi dentre outros