O Brasil quer prefeitos verdes

José Renato Nalini

 

O mundo civilizado acordou para a ameaça ambiental, mais séria do que a pandemia. Os eventos climáticos resultam da inclemência com que o ser humano trata o Planeta, do qual é transitório hóspede. Inacreditável que o Brasil conviva com esse maltrato deliberado, com a destruição das coberturas naturais, com o incêndio estimulado, com a criminosa exploração de garimpo em áreas protegidas.

O alerta internacional só ecoou porque o foco foi aquilo que move a maior parte dos que detêm o poder: dinheiro! Quando se fala em economia, encontram-se ouvidos prontos a ouvir. Se o discurso fosse a ecologia, seria ignorado, estigmatizado e objeto de escárnio.

O importante é que o zelo pelo ambiente não está restrito ao governo. Todos têm o dever de assegurar sobrevivência para as futuras gerações. E assim como acontece em outras partes do mundo, o protagonismo deve ser repartido entre as pessoas sensíveis e angustiadas ante o descalabro geral.

Aqueles que têm condições de promover transformações em suas cidades são os prefeitos. O lema primitivo da ecologia era “pensar globalmente, agir localmente”. A cidade é o local em que as pessoas nascem, desenvolvem suas atividades, criam laços e raízes. É a instância onde as coisas mais importantes acontecem. Mais uma vez, invoco Franco Montoro: ninguém nasce na União, nem no Estado. As pessoas nascem no município.

Os prefeitos que vão ser eleitos têm um enorme desafio: garantir a sustentabilidade local. É uma forma de se afastar do nefasto modo com que aqueles que têm obrigação de proteger o ambiente, estão se comportando e renegando a tradição brasileira de pioneirismo ecológico.

As próximas gestões deverão ser verdes. E isso é perfeitamente possível. No cenário macro, a regularização fundiária é pressuposto a que o território mereça tratamento ambientalmente correto. Há inúmeras ideias factíveis, já experimentadas e exitosas. Por exemplo: criar viveiros de mudas, com a coleta das sementes que as árvores já existentes perdem a cada ano. Ocupar os espaços ociosos com o plantio de árvores. Incentivar a arborização, premiando as melhores soluções em ruas e logradouros restaurados. O mesmo pode ser feito em relação aos jardins residenciais e às hortas.

Educação ambiental em todas as escolas e também informal, para atingir àqueles que não se encontram vinculados a estabelecimentos de ensino. Concursos para promover a flora local, fazer ressurgir espécies que estão quase extintas. Recuperar córregos e cursos d´água, muitos dos quais cederam espaço para o asfalto e estão sepultados. Mas podem ressurgir, se houver vontade política.

Ampliar as reservas naturais, incentivar a formação das RPPN – Reservas Particulares de Proteção Natural, divulgar o que significam as APAS – Áreas de Proteção Ambiental e as APPs – Áreas de Proteção Permanente. Premiar as iniciativas particulares de quem, espontaneamente, adotou praças, recuperou jardins, distribuiu mudas e procurou conscientizar a população de que a natureza é componente vital para a subsistência de qualquer espécie de vida no planeta.

Há projetos que convergem com a necessidade de assegurar aos invisíveis chances de sobrevivência digna. A agricultura orgânica é um deles, assim como o cultivo de flores e de plantas ornamentais. A proliferação de árvores frutíferas pode ensejar a retomada de uma atividade artesanal devotada à produção e comercialização de compotas, geleias, doces, biscoitos e outros produtos diretamente gerados pelo cultivo.

Não menos importante, o adequado destino dos resíduos sólidos. O Brasil é um campeão na produção de lixo. A reciclagem é um investimento gerador de renda e a cidade que tiver uma bandeira ecológica atrairá visitantes, fazendo com que a indústria do turismo seja levada a sério. Foi assim que países como a Espanha saíram de gravíssimas crises no passado recente.

Basta procurar por bons exemplos e o mundo inteiro tem um variado cardápio de boas práticas, porque os seus governos investiram numa educação ambiental para valer. Ambiente é assunto a cada momento mais sério e, infelizmente, mais grave.

Enfim, o Prefeito que incluir uma agenda verde em seu plano de trabalho será um predestinado a transformar sua cidade, algo imprescindível no momento em que a peste deixou as pessoas desanimadas, sem perspectivas e desesperançadas. Não é por coincidência que a esperança é verde. E verde terá de ser o Brasil daqui por diante, se quiser reassumir a sua vocação de celeiro do mundo e oásis de tranquilidade.

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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL); foi presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

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