José Renato Nalini
Decretou-se a morte da natureza no Brasil. Em acelerada marcha-a-ré, o governo brasileiro despreza o conceito de sustentabilidade e renega compromissos assumidos com a comunidade internacional, além de revogar o artigo 225 da Constituição da República.
Ignorando o fato de ser detentor do maior tesouro florestal do planeta, passa ao mundo a certeza de que assumiu postura suicida. É a Nação que dizima seus biomas e só responde com discursos vazios.
Até os mais renitentes produtores rurais, que acreditam nas explicações “científicas” de que existe mais proteção ecológica do que território, tantas as estratégias preservacionistas, enxergam o perigo de se matar a “galinha dos ovos de ouro”. O agronegócio perde espaço no mercado global, porque o governo vilão orquestra a destruição do verde e da biodiversidade.
O Observatório do Clima constatou que o decreto de “terra arrasada” foi bem assimilado pelos especuladores de terras públicas. De cada dez hectares de floresta, seis devastados viram pastagens, três são abandonados e apenas um é dedicado à lavoura. O INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e o IMAZON – Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, em conjunto com o Global Land Analysis & Discovery, da Universidade de Maryland, comprovam, cientificamente, a devastação. Foram destruídos 12.187 quilômetros quadrados de mata natural em 2019. O equivalente a oito áreas da cidade de São Paulo. Não se tem notícia de tamanha tragédia em qualquer período anterior, desde que Portugal começou a colonização. A cada dia é exterminado o verde em relação a 3.339 hectares de mata nativa, ou seja: 139 hectares por hora!
Aquilo que aparentemente não desperta o brasileiro da letargia foi pressentido pela comunidade internacional. 29 Fundos de investimento que têm sob sua responsabilidade US$ 4,1 trilhões, ou o triplo do PIB brasileiro em 2019, enviaram carta de advertência aos embaixadores de grandes países. Não investirão mais no Brasil, se não houver contenção nessa marcha assassina. Também 40 empresários nacionais alertaram o governo sobre o risco real de prejuízos para o Brasil, tão necessitado de capital alienígena, se não houver cobro a essa inacreditável insanidade.
É insuficiente responder com discursos. A falácia retórica da política nacional não engana mais ninguém. O desmanche das estruturas fiscalizatórias foi um fator que incentivou a criminalidade a incendiar o Brasil. Nada indica mudança brusca de rumos, pois a opção contra o ambiente está entranhada justamente em quem só existe e é remunerado para protege-lo.
Resta à sociedade agir. Invoque-se o lema inicial da caminhada ecológica: “pensar globalmente, agir localmente”. A resposta que os brasileiros podem oferecer a essa tragédia vão desde o uso racional das redes sociais para fortalecer o Congresso, onde há vozes sensatas e parlamentares que amam o País e se preocupam com as futuras gerações, até a medidas singelas, mas expressivas de que o povo não concorda com o ecocídio de nossa natureza.
Na contramão do que faz o governo, a cidadania tem o dever de se converter na maior guardiã do ambiente. Ocupar todos os espaços ociosos com árvores. Fazer a coleta das sementes dos exemplares vegetais que estão nos lugares públicos e formar viveiros. Estimular as boas práticas que são pouco numerosas, mas expressivas. Aqueles que recuperam espaços degradados. Intensificar projetos como o “Nascentes”, para devolver matas ciliares a todos os cursos d’água.
Promover a educação ambiental em todos os níveis, principalmente de maneira informal. Premiar as ruas mais arborizadas. Repor as árvores que o tempo ou os cataclismos destroem. Uma iniciativa que não é impossível e tem carga imensa de simbologia é plantar uma árvore para representar cada brasileiro que a Covid19 levou. Algo que já se prometeu em relação à capital paulista e que pode ser disseminada, como excelente providência redutora dos traumas de um luto não cultuado, em qualquer cidade brasileira.
Mostrar que o Brasil ama o verde e se preocupa com o amanhã, é o recado que a comunidade internacional poderá receber e rever a sua opção de nunca mais investir no País e de boicotar a nossa produção agrícola. Não se pode perder de vista que, no Estado de Direito, o único titular da soberania é o povo, não o governo.
Um governo é transitório. A Nação é permanente. Incutir nas crianças o amor pela Pátria e o respeito pelo verde, cor da maior parcela de nossa bandeira, o mais significativo símbolo nacional.
Tenha-se enfim presente, como dizia Mário Quintana, “eles passarão; eu, passarinho”.
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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL); foi presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo