Ricardo Viveiros
Se ele roeu mesmo, ninguém sabe. Mas que a fonoaudiologia usa a palavra para trabalhar a fala das pessoas que têm problemas com a pronúncia da letra “R”, isso é verdade. Como também é certo que ninguém gosta de ser chamado de “rato”, sinônimo de ladrão. E da pior espécie, pequeno e furtivo, que ataca de noite.
Por outro lado, se você é conhecido como “rato de livraria”, isso já significa um outro status. Condição sofisticada, atraente, que remete à intelectualidade. Camundongo, ratazana, rato-preto, rato-de-esgoto, rato-branco o que importa o tipo? São, todos, ratos que assustam até mesmo os elefantes, um dos maiores animais do planeta.
Quando, entretanto, estamos falando de Mickey Mouse, da dupla Bernardo e Bianca, do Remy (do “Ratatouille”), de Little Stuart ou, até mesmo, do Topo Gigio (lembra dele?), tudo se torna mais inteligente, terno, afetuoso e engraçado. São alguns dos ratos que, sem entrar em considerações sobre as agruras causadas por sua espécie, tornaram-se famosos e queridos em todo o mundo.
Os ratos, segundo os limites da ciência, são originários da Ásia e há mais de 1.700 espécies. O rato-preto, por exemplo, invadiu a Europa à época das Cruzadas. A ratazana, por sua vez, apareceu nas cortes do Velho Mundo apenas no século XVIII. Todos trazendo muitos males, graves enfermidades ao homem: peste bubônica, tifo, leptospirose, febre do rato, hantavirose e por aí vão. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), ratos podem transmitir aproximadamente 200 doenças.
Em contrapartida, o rato-branco (uma variedade albina) e os ratos cinzas já velhos têm — com o sacrifício da própria vida —, salvado os humanos de inúmeras doenças. São cobaias de laboratório, usados por cientistas para inocular os vírus e pesquisar a melhor maneira de combater seus próprios estragos à saúde humana. E por sua atuação no Camboja, uma rata africana gigante acaba de ser premiada com honras e glórias por, “corajosamente”, farejar minas deixadas pela guerra. A medalha de ouro foi entregue pela Associação Veterinária Britânica (PDSA). Magawa, a rata, já “limpou” com segurança o equivalente a 20 campos de futebol.
Ratos se amam de maneira intensa, um casal pode ter mais de 200 filhotes em apenas um ano. Ratos adultos podem alcançar 50 cm de comprimento e pesar até 1 kg. Um casal de ratos em um celeiro, apenas durante duas estações, pode consumir cerca de 14 kg de grãos. Ratos causam 45% dos incêndios tidos como de origem desconhecida, 20% dos danos em linhas telefônicas, 31% dos rompimentos de cabos elétricos.
Como tudo na vida tem um outro lado, ratos mantêm a cidade limpa. Ágeis e flexíveis entram pelo esgoto, correm por apertadas tubulações que são suas rodovias, promovendo necessária desobstrução. Sem eles, haveria ainda mais entupimentos e enchentes.
Em uma entrevista que nos tempos de repórter fiz para a mídia, ouvi do veterinário italiano Angelo Boggio, um dos maiores “ratólogos” deste planeta então contratado pelo Metrô de São Paulo e carinhosamente apelidado pelos colegas como Doutor Ratão, a seguinte máxima: “Ratos integram o equilíbrio ambiental. Escorpiões matam e comem ratos. Galinhas comem escorpiões. E nós comemos galinhas.”
Quem “come” o corrupto que come os recursos do povo?
Essa espécie de rato está no topo da cadeia alimentar, causa doenças crônicas como a raiva, move-se com agilidade pelos canais burocráticos do sistema e rói a dignidade. Começou a campanha política para as eleições deste ano em todo o País. Não deixe o seu voto ser roído pelos ratos, escolha bem os seus candidatos.
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Ricardo Viveiros, jornalista e escritor, autor de vários livros, entre os quais “Justiça Seja Feita”, “A Vila que Descobriu o Brasil” e “Educação S/A”