Álvaro Vargas
A presença de entidades espirituais na roupagem de “pretos velhos”, em casas espíritas, tem sido criticada por alguns divulgadores do Espiritismo. Alegam, que temos milhares de reencarnações, e não há necessidade de apego apenas a uma delas, muitas vezes se comunicando de forma precária e quase ininteligível. Dizem, que esses espíritos não conseguiram se libertar dos atavismos da raça no período escravocrata, e continuam sendo explorados por nós, de forma indevida. Em suas alegações, muitas pessoas supõem que esses espíritos são atrasados, numa condição de serviçais, para lhes atenderem aos pedidos. Mas, entendemos, que esse ponto de vista não pode ser assim generalizado, pois teríamos de utilizar do mesmo raciocínio, para aqueles espíritos que se apresentam como padres, freiras, médicos, personagens do império romano etc. Em muitos casos, não é um atavismo. O espírito simplesmente mantém a expressão de apego às experiências de uma encarnação, a que foi a mais significativa para ele.
É de nosso conhecimento, que a maioria dos espíritos que regressam para a erraticidade levam algum tempo para conseguirem se libertar dos condicionamentos mentais, mas existem os que são mais evoluídos, que mesmo podendo alterar a forma perispiritual, preferem mantê-la, devido a questões de foro íntimo. Alguns, antes de reencarnarem como escravos, estavam no Umbral, devido a erros clamorosos, quando foram cruzados, inquisidores ou senhores feudais. Mesmo libertos do carma doloroso, mantém a aparência da última reencarnação, gratos pela oportunidade que tiveram de superar o orgulho, causa principal de suas desditas. Mas nem todos os espíritos que se assim se manifestam, foram escravos. É o caso de “Pai Jacó”, em episódio relatado por Herculano Pires (Ciência Espírita, cap. IX), que havia sido um médico holandês, em reencarnação anterior, mas preferiu manter a forma espiritual de sua última encarnação como preto velho, na qual ele aprendeu a desenvolver a humildade. Nessa obra, Herculano menciona a opinião de Cairbar Schutel sobre esse episódio: “Nunca gostei dessas manifestações de negros e índios, mas o Pai Jacó encheu-me as medidas, revelando um conhecimento doutrinário que me assombrou”. Existem casos, em que o espírito, mesmo que não tenha reencarnado como negro na sua última romagem terrena, assume essa forma, com o objetivo de servir em alguma atividade específica. Isso é relatado por Richard Simonetti, mencionando que o espírito Frederico Figner, dedicado diretor da Federação Espírita Brasileira do Rio de Janeiro, foi visto por um médium vidente atuando como um “preto velho”, em um terreiro de Umbanda. Segundo ele, esse fato foi posteriormente confirmado por Chico Xavier (Página Web, Associação Espírita Allan Kardec, São José do Rio Preto).
Sobre a questão da “roupagem” do espírito, a médium Yvonne Pereira (Recordações da Mediunidade) ao perguntar a uma entidade espiritual sobre a sua aparência como índio, foi informada por ele, que era preferível manter-se na forma da última reencarnação, um indígena brasileiro, do que recordar a personalidade de um déspota, um tirano ou celerado que fora, nas existências pregressas. Teria ainda de desempenhar longa série de tarefas nobres, nos setores obscuros que lhe coubessem, em desagravo aos males outrora causados no setor civilizado. Allan Kardec (O Livro dos Médiuns, Cap. 24), explica que a identificação do espírito é questão secundária; o importante é o teor da mensagem. De acordo com Terezinha de Oliveira (Reuniões Mediúnicas), “Não existe nenhum impedimento de um preto velho, ser um guia espiritual, se por suas palavras e atos mostrar que é digno desse título, que tem conhecimentos superiores para nos orientar e verdadeiro amor para nos exemplificar”.
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Álvaro Vargas, engenheiro agrônomo, Ph.D., presidente da USE-Piracicaba, palestrante e radialista espírita