José Bento Toledo Dias Ferraz
Há um ano, 04/08/19, morreu Juélio Ferreira de Moura. Para quem conviveu com ele, usufruindo a sua amizade e o seu afeto, nos últimos doze anos, não é difícil rememora lo, com a simples definição de que era um advogado exemplar.
A frase – embora pareça expressar apenas um lugar comum, refletir uma dessas orações escondidas na memória para ser pronunciada em ocasiões protocolares, frase de expediente convencional, contém, entretanto, uma verdade universal, quando resume, com sinceridade, o que se pensa de alguém.
Juelio Ferreira de Moura era um advogado exemplar, porque poucas vezes veem se reunidas em uma só pessoa tantas qualidades. No seu generoso coração, coabitavam a bondade, a dignidade, o amor à Justiça, a independência, a simplicidade e a coragem.
No exercício da bondade, dividia, com todos que o procuravam para um aconselhamento, a sua invulgar sabedoria, cultura e experiência.
A dignidade se expunha, para a réplica, rápida como um raio num céu apagado, se fosse, de alguma forma, ameaçada. Era espantoso vê- lo, nesses momentos, sempre lhano no trato, dominar com maestria as armas da dialética e da ironia. Nessas horas fogosas, transparecia, claramente, que não viera para esse mundo, com o destino dos lacaios. Mas sua altivez não era amesquinhadora. Jamais serviu para impor humilhações ou agravar os mais humildes.
Detestava a prepotência, a empáfia, a presunção. Por isso, sabia ser tolerante com os fracos, compreensivo e bom com os necessitados.
O seu amor à Justiça, confundia se com uma pletora de valores: a honradez e eficiência com que exercia a profissão, a dedicação excessiva ao cliente e à causa, a seriedade do trabalho, que lhe consumia infindáveis vigílias, cedidas ao estudo e à pesquisa; a postura profissional, ao mesmo tempo esculpida pelo deslevo da atenção, sempre vigilante, e pela consciência tranquila que tinha da importância e do valor do advogado na relação processual; a imensa capacidade de luta, fomentadora de seu incansável entusiasmo, em busca de vitórias forenses que lhe pareciam justas.
Cultuava a independência, porque a sua personalidade parecia cinzelada, misteriosamente, por um imensurável amor à simplicidade e à coragem. Simplicidade, sem ares de sucumbência. Coragem que não perseguia a façanha, porque não era a coragem da
força física. Era a coragem intrépida da energia, da resistência, a coragem moral. A coragem de falar, de escrever, de protestar, de advogar causas impopulares, desde que o tribunal supremo de sua consciência o convocasse para esses embates.
Juelio Ferreira de Moura sempre trilhou segundo os ensinamentos do imortal Thetônio Negrão: “Nunca tive outro Juiz em toda minha vida, senão a minha consciência. Não me curvei aos poderosos, nem tripudiei sobre os fracos. Nunca abdiquei da minha independência pessoal. Sempre fui fiel a mim mesmo. A riqueza e o poder jamais me fascinaram porque a vida é muito curta e bela demais para que eu a desperdiçasse correndo atrás desses dois impostores.”
Esse era Juelio Ferreira de Moira. Nasceu em Anhembi, dia 18 de setembro de 1.946, onde foi sepultado. Faleceu em Piracicaba no dia 4 de agosto de 2019, aos 72 anos de idade. Exerceu ininterruptamente a advocacia cível, empresarial e de família, por mais de 40 anos, com o mesmo brilho, em sociedade com o Dr. Boaretto.
Foi professor de Processo Civil na Unimep, onde lecionou por mais de trinta anos. Formou-se pela centenária Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC), se não me falha a memória no ano de 1.972, há quarenta e oito anos.
Ao me despedir de Juélio Ferreira de Moura, um advogado exemplar, tomo a liberdade de invocar a belíssima mensagem do filósofo Gibran, insuperável humanista deste século, em sua obra “O Profeta”, ao se referir à alegria e à tristeza, diz com inigualável beleza:
“Quando estiverdes alegres, olhai no fundo do vosso coração e achareis que o que vos deu tristeza é aquilo mesmo que vos está dando alegria.
E, quando estiverdes tristes, olhai novamente no vosso coração e vereis que, na verdade, estais chorando por aquilo mesmo que constituiu o vosso deleite.
Alguns entre vós dizeis: ‘A alegria é maior que a tristeza e outros dizem: Não, a tristeza é maior’.
Eu, porém, vos digo que elas são inseparáveis. Vêm sempre juntas e, quando uma está sentada à vossa mesa, lembrai-vos que a outra dorme em vossa cama”.
Invoco hoje a bela lição de Gibran, para lembrar que uma imensa tristeza invadiu nossos corações com a partida para a vida eterna do Professor Juelio, como era carinhosamente chamado e conhecido.
Entretanto, para compensar o desconforto da tristeza, Deus nos deu o conforto da alegria por nos ter permitido o privilégio de tê-lo deixado viver entre nós por 72 curtos, profícuos e queridos anos, confiando-lhe a sacrossanta missão sacerdotal do magistério, que ele exerceu com exemplar dignidade.
E, por certo, todo esse tempo que Deus no-lo emprestou, não foi em vão porque ele, obediente à missão confiada, não foi apenas um grande mestre, mas foi também filho exemplar, irmão solidário, pai extremoso, avô carinhoso, amigo confiável, cidadão respeitável, deixando a todos parentes e amigos, uma belíssima lição de vida, que permanecerá indelével em nossos corações.
Ele não viveu em vão, nem passou como o vento que anuncia a tempestade, mas viveu como a brisa suave que refresca e traz o perfume colorido do frescor da manhã. Sua cadeira jamais estará vazia porque estará cativa em nossos sentimentos.
Como os legendários guerreiros da antiguidade, os grandes advogados, como Juélio Ferreira de Moura, não morrem. Apenas desaparecem. A sua gesta sobrevive. O seu exemplo transcende a morte, porque revive a saga inspiradora de muitas ressurreições.
Até breve, professor.
Para Ana, Fabio, Fernando, Camila e Fabricio, minhas saudades do inesquecível amigo.
Do colega, “compadre nas caipirinhas” e amigo.
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José Bento Toledo Dias Ferraz, advogado militante em Tietê/Cerquilho