Não mereço… mas agradeço

Luiz Nascimento

 

Ausente da imprensa por um longo tempo, compareço, agora, para comentar sobre a chamada “Terceira Idade”, conhecida também como “Melhor Idade” e “Feliz Idade”.

Usando esses nomes modernos, publicações de jornais e revistas têm mostrado atenção e respeito ao idoso, mas podem passar a ideia inexata de que a velhice é a melhor e a mais feliz das idades.

Como faço parte dessa terceira idade, posso afirmar que conheço a situação dos idosos, os muitos deveres que tiveram e cumpriram aos poucos direitos que receberam.

Também, por força do meu trabalho, tive contato com idosos (doentes e acidentados) durante onze anos, quando testemunhei, bem de perto, todo o mal que essa tal de injustiça causou àquelas humildes e necessitadas pessoas. Coisa abominável e até pecaminosa.

O difícil caminho do idoso começa quando ao requerer a tão sonhada aposentadoria, se vê em dificuldade, confuso e até amedrontado com tantas exigências, sem entender muito bem as explicações que a ele são dadas. Após alguns meses de angustiante espera, a aposentadoria finalmente é concedida. O valor não é grande coisa, mas vai ajudar nas despesas da casa e no pagamento de aluguel. Sim, idoso aposentado também paga aluguel de casa.

Com o passar do tempo, o aposentado sente que a importância que recebe mensalmente da aposentadoria já não está cobrindo todas as despesas. Parte, então, para um empréstimo que dará para saldar algumas dívidas e vai tirá-lo do sufoco que está passando. Grande erro, pois além de receber uma aposentadoria irrisória, ainda terá que pagar as parcelas do empréstimo.

Sua única saída é voltar a trabalhar e isso acaba acontecendo. Consegue emprego como porteiro em um edifício, mas por pouco tempo, porque sofre um acidente vascular cerebral. Está usando cadeira de rodas e pela situação crítica da família, não será possível contratar um cuidador.

Isso acontece com todos os idosos? É claro que não. O que o leitor acaba de conhecer, se já não conhecia, é apenas um episódio de um drama triste e verdadeiro, no qual muitos idosos são os protagonistas e o desfecho infelizmente é conhecido pelo obituário.

Há idoso com problemas de saúde próprios da idade, alguns progressivos e incuráveis. Mostra que o idoso faz parte de um grupo de risco, com grandes possibilidades de contrair doenças ou mesmo de sofrer dano físico. Quando internado em asilo ou casa de repouso, tem às vezes um agravamento do estado geral, não pelo tratamento que recebe, mas por sentir-se abandonado pela família.

Ontem, demente era o popularmente chamado de louco, agressivo, “usuário” da camisa de força, internado em um hospício, onde recebia até tratamento de choque elétrico.

Hoje, demente é o idoso acometido do Mal de Parkinson e Alzheimer, mesmo apresentando um quadro de serenidade e recebendo carinhosamente os cuidados dos familiares. Quando o idoso está incapaz para os atos da vida civil, a família pode requerer em juízo a interdição e a nomeação de um curador que ficará responsável pelos bens e pelos interesses do interditado.

 

A interdição, a meu ver, é como uma sentença condenatória, pela qual o idoso doente não é mais dono de si próprio e perde todos os direitos que possuía. Ainda que o interditado viva em estado vegetativo, alheio a tudo e a todos, trago comigo o sentimento de que a interdição é a suprema humilhação do ser humano.

Às vezes o idoso é “usado” quando tem o nome e o cartão bancário em prestados por alguma pessoa inescrupulosa, que faz empréstimo em financiadora e compras no comércio. É o inocente útil que só tem prejuízos.

Se de um lado, a vida parece não ser tão risonha para o idoso, de outro, a situação é completamente diferente. Há idoso que pratica esportes, frequenta bailes da terceira idade, viaja muito e até namora. Tudo isso é salutar, afasta a solidão e prolonga a existência. Mas não é a regra.

O idoso já adquiriu alguns direitos e vantagens: há o Estatuto do Idoso, que dá proteção para as pessoas com sessenta ou mais anos de idade, há o Conselho Municipal do Idoso, que é órgão de representação dos idosos, algumas entidades cuidam das atividades da terceira idade, tem remédios de graça ou com grandes descontos, não paga ônibus, entra sem pagar em diversos eventos e tem lugar reservado nos estacionamentos, isso quando a vaga reservada não está ocupada por qualquer desatento atrevido.

Desculpe-me se o leitor ficou surpreso com o que foi comentado sobre o idoso, mas as poucas situações descritas mostram, sem generalizar, uma realidade totalmente oposta ao que chamam de Melhor Idade e Feliz Idade. O tempo é implacável, e as marcas da velhice ocupam hoje os lugares da graça e da beleza de outrora. Há um provérbio italiano que diz: “La vecchia é brutta”. Novos comentários sobre o idoso ficarão para outra oportunidade, provavelmente.

Embora seja membro da confraria dos idosos, mas sem advogar em causa própria, desejo um mundo melhor para o idoso, esse quase esquecido, chamado de cidadão prestante só depois de morto.

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Luiz Nascimento, servidor público federal aposentado, autor do livro Memórias do Bairro Alto, sócio titular do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba (IHGP)

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