Polícia, a letalidade é do Estado e da sociedade

Dirceu Gonçalves

 

Sob o pretexto de vivermos num regime democrático, tornou-se hábito discutir o que se chamou de letalidade policial. Políticos outrora proscritos, transgressores legais e outros inimigos declarados da instituição policial conseguiram criar um discurso fácil que brutaliza a polícia e vitimiza o criminoso. Por conta disso, já se cometeu muita desobediência civil, como o toque de recolher, queima de ônibus e outros veículos, destruição de patrimônio público e privado e uma série de crimes em nome do falso pacifismo. Mesmo assim, a instituição policial não descuida do controle e, ela própria, através das ouvidorias e corregedorias, apura os possíveis excessos e os apresenta para as punições e reparações administrativas e judiciais.

O aumento da criminalidade e da reação policial tem razões complexas. Uma delas é o antagonismo natural entre aqueles que vivem à margem da lei e os que têm o dever de ofício de cumpri-la e, mais que isso, de defendê-la. Quando ocorrem os crimes, há a repressão estatal e muitas vezes o resultado é a morte, tanto de criminosos como de policiais e até de terceiros que nada têm em relação à contenda. Para cada caso há a devida apuração. Os registros policiais e judiciais são testemunhas disso. Noticia-se, agora, por exemplo, que no primeiro semestre desse ano aumentou em 21% o número de mortos pela Polícia Militar de São Paulo em relação a igual período do ano passado e, também, mais policiais perderam a vida tanto em serviço quanto de folga. Em 2020 morreram 436 confrontantes e no ano passado 358, ao mesmo tempo em que no lado dos policiais foram mortos 63 em 2020 e 56 em 2019.

As causas da escalada são diversas, mas a própria PM lembra – através do secretário executivo, cel. Álvaro Camilo – que, em decorrência da pandemia, policiais antes empregados em atividades de baixo confronto, como a ronda escolar, foram remanejados para o policiamento ostensivo, e o menor fluxo de tráfego nas cidades  facilita que as viaturas cheguem ao local quando o crime ainda está em andamento, ocorrendo o confronto e o resultado morte. Não esquecer, também, que os criminosos (especialmente os do crime organizado) estão cada dia mais ousados, armados e empoderados. Quando agem, as quadrilhas costumam colocar atiradores de elite nas proximidades com a tarefa de atacar as viaturas a caminho e até as instalações policiais da região para evitar a repressão ao ilícito em andamento. Parte dos óbitos decorre desse ataque dos criminosos e reação dos policiais.

A polícia, como braço armado do Estado, tem o dever de combater o crime e, quando ocorre o confronto, a morte é uma das possibilidades. O ideal seria ter a polícia apenas como garantidora da ordem, sem a necessidade de repressão. Mas, para isso, não poderiam ter ocorrido as insólitas e irresponsáveis campanhas de desconstrução da imagem da instituição junto à população, realizadas por anos a fio. O Estado teria de investir mais em inteligência policial para em vez de reprimir, prever e impedir o crime; e o ordenamento jurídico – temerariamente abrandado em nome da sui-generis democracia em que vivemos – deveria, através de exemplos, levar aos transgressores à crença de que o crime não compensa. Todo ataque às forças do Estado, entre elas as polícias, deveriam ser considerados crimes hediondos, com o aumento da pena e sem progressão de pena, decadência de flagrante e outros favorecimentos carcerários que, aplicados genericamente, escandalizam a sociedade…

___

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da Aspomil (Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo); e-mail: [email protected]                 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima