José Renato Nalini
Depois daquela generosa mensagem de Solange Vieira, assessora do Ministério da Economia, de que a pandemia aliviaria o peso da Previdência Social, parece que o preconceito contra os velhos mostrou sua cara.
Se a discriminação por idade já existia antes da Covid19, agora tudo indica seu recrudescimento. A ideia de que o coronavírus prefere os velhos vai intensificar a cultura “protetiva” a esses vulneráveis. É melhor que não se misturem aos jovens e, portanto, que permaneçam em casa. Para sempre.
É interessante ver o tom de voz dos apresentadores de noticiários na TV aberta, quando enfatizam que “74% dos óbitos são de pessoas acima de 60 anos”. Como a lembrar os sexagenários e os suprasexagenários de que eles estão na lista de favoritos da peste.
Antes da praga, esboçou-se uma tendência a desenvolver uma cultura que contemplasse a “melhor idade”, graças à longevidade gerada pelas descobertas científicas. Tudo isso agora deu marcha-a-ré. Já não haverá tantos interessados em ler o livro “A vida dos cem anos”, de Lynda Gratton e Andrew Scott. Os pesquisadores britânicos recomendavam àquele que chegasse aos 60 anos, que pensasse em produzir mais, porque ainda haveria mais um terço de vida pela frente.
Também já não fará tanto sucesso a frase de efeito: “Se existe uma palavra que precisa ser aposentada é aposentadoria”, pronunciada por Don Ezra, num artigo para o Financial Times.
Agora, os empregadores têm um argumento a mais para dispensar os idosos: “é para o seu bem”. É arriscado ficar circulando, se relacionando, apertando as mãos ou se abraçando, se o vírus está aí, pronto para abreviar a sua experiência vital.
Aqueles que já têm dificuldade em aceitar a inevitável passagem dos anos, terão um motivo a mais para se afligirem. Cuidarão de tingir cabelos, de fazer botox, de usar roupinhas de adolescentes e de assimilar a onomatopeia de boa parte da juventude. Para a qual existe uma perspectiva que pode parecer remota, mas chegará: o encontro com a velhice. E é melhor ser velho. A alternativa pode não agradar: é morrer ainda jovem.
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José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2019-2020.