Aprender com o colibri

José Renato Nalini

 

O beija-flor é diferente de todas as demais aves. Sua plumagem iridescente não é fruto de pigmentação, como nos outros pássaros. Suas células primáticas que formam parte das penas possuem camada de ar interna que decompõe a luz incidente e a transforma em múltiplas cores. Uma perfeita ilusão de ótica.

Outra particularidade: a asa das aves possui estrutura que lembra o braço humano. Para nós, humanos, a mão tem dimensão diminuta. Mas para o beija-flor, as mãos são ampliadas. E ele consegue fazer tudo o que quer com sua asa: voa de lado, para a frente e para trás, consegue ficar paralisado no ar, dar marcha-a-ré. Tudo em pleno ar. É a única espécie de ave que não anda. Consta existir uma espécie dos Andas que pula sobre a grama.

O maior estudioso do colibri no Brasil foi o professor Augusto Ruschi (1915-1986), etnólogo e biólogo, titular de botânica da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ele criou o Museu de Biologia Mello Leitão, em Santa Tereza, no Espírito Santo. Ali viviam na década de setenta 3.500 colibris de duzentas espécies diferentes. O objetivo era permitir um estudo pioneiro das relações entre o colibri e o homem no ambiente em que vivemos. Ele se propôs a fazer um viveiro junto ao hotel do Anhembi, ideia que não vingou.

Até então, nunca se conseguira criar beija-flor em cativeiro. Não se sabia como alimentá-los. Eles morriam de fome. Ruschi inventou um aparelho para extrair o alimento de dentro do estômago do filhote e estuda-lo ao microscópico. Cientista devotado, dominou a técnica e o engenho criativo e o viveiro se converteu numa das verdadeiras novas maravilhas do mundo moderno.

Teríamos muito a aprender com o beija-flor. Sua extrema resistência ao frio e ao calor, pois vive nos trópicos e no alto dos Andes, sua aparente fragilidade – algumas espécies pesam dois gramas! – é um exemplo de resiliência. Adapta-se a qualquer meio-ambiente.

A tragédia é que Ruschi profetizou o que aconteceria com o Brasil: “Com seu espírito belicoso, o homem vulgarizou a natureza, transformou regiões férteis e maravilhosas em desertos. Talvez transforme este planeta maravilhoso num deserto inabitável”. Alguém duvida disso, vendo o que se faz hoje na Amazônia, no cerrado e na Mata Atlântica?

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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL)

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