Vai acabar a Mata Atlântica

José Renato Nalini

 

O descompasso entre o que se proclama e o que se pratica é um dos maiores pesadelos da República Federativa do Brasil.

A Mata Atlântica é patrimônio nacional, ao lado da Floresta Amazônica, do Pantanal, da zona costeira, como prevê o § 4º do artigo 225 da Constituição da República. Só que dela restam fragmentos. O ataque ao verde prossegue inclemente. Ocupação desordenada, destruição, poluição, todos os males provenientes de uma ganância que anda de braços dados com a ignorância.

A Revista Science divulgou há pouco uma característica ainda mais complicadora da situação da Mata Atlântica. Descobriu que as reservas menos sacrificadas por desastres naturais e por ação humana ao longo de milênios, são aquelas cujas espécies animais se tornam mais vulneráveis. É o conceito de “filtros de extinção”.

Os animais expostos a maiores ameaças durante seu passado evolutivo se tornam menos suscetíveis a sucumbir com os novos desafios. Já atravessaram o “filtro de extinção” e sobreviveram. Enquanto isso, aquelas que não sofreram essa escalada de destruição tornam-se mais débeis. Incapazes de resistir.

É o que acontece com a Mata Atlântica. Nela, os animais que dependem de um núcleo intacto de mata são 80% menos comuns. São espécies exigentes, que não subsistem se houver destruição de seu habitat. Não se adaptam a ambientes degradados. O problema é que a Mata Atlântica é uma colcha descosturada de pequenas propriedades, na maioria com menos de dez hectares. Seria preciso investir com urgência em corredores ecológicos, para a conexão de fragmentos. Você conhece alguém que esteja cuidando disso?

Prestamos muita atenção aos incêndios criminosos na Amazônia, no derramamento de óleo que atingiu praticamente mil cidades em todo o litoral brasileiro, mas, muito perto de nós, vai acabar o tesouro que levou os portugueses a acreditarem que haviam chegado ao Jardim do Éden no ano 1500. Em termos de história, outro dia mesmo. Todavia, a insensatez humana consegue acabar, em algumas décadas, com o que a natureza edificou durante milênios.

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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-Graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL)

 

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