Quão ilusória é a glória!

José Renato Nalini

 

Os humanos proclamam sua racionalidade como se isso conferisse indenidade a todas as vicissitudes. Esquecem-se da celeridade com que o único tesouro com que não se pode contar se esvai. O tempo é algo irrecuperável. Não se consegue acrescentar um minuto, uma hora, um dia a uma existência que atingiu seu termo.

Tivéssemos em alerta a certeza de que este pode ser o último dia de nossa passagem pela Terra e talvez nos comportássemos de maneira diversa. Mas somos cegos e surdos a essa realidade irreversível. Comportamo-nos como se tivéssemos um estoque de anos pela frente. E tudo pode acabar no minuto seguinte.

Aqueles que se iludem com as gloríolas terrenas se decepcionam. Acreditam serem insubstituíveis, quando ninguém o é. O mais poderoso, o mais rico, o mais talentoso, o mais inteligente, o mais erudito. Não fazem falta ao mundo que continuará a existir, a despeito de sua partida.

O que é a imortalidade, senão uma ficção? A permanência na lembrança de alguns que sentirão a morte. Fato corriqueiro para tantos outros. Ignorado pela imensa maioria dos viventes.

Quando Machado de Assis foi solicitado a falar sobre Fagundes Varela, escreveu que não seria tarde, pois “não o é  nunca para as homenagens póstumas, se aquele a quem são feitas as merecem por seus talentos e ações”. À maioria dos mortos se reserva a memória sujeita a condições de oportunidade. Por mais intensa tenha sido a vida, fugaz é a sua permanência na lembrança dos que sobreviveram.

Ele negava que a plena justiça só tem início depois da morte, pois haveria enorme abismo entre o desdém dos contemporâneos e a admiração da posteridade. Para Machado de Assis, “digno de inveja é aquele que, transpondo o limite da vida, deixa alguma coisa de si na memória e no coração dos homens, fugindo assim ao comum olvido das gerações humanas”.

Muito poucos são aqueles que escapam ao esquecimento das gerações que os sucedem. Quantas glórias não jazem mergulhadas na noite perpétua, como se nunca de fato tivessem ocorrido?

Infeliz aquele que espera gratidão e reconhecimento, por maior tenha sido sua generosidade em relação aos que um dia dele necessitaram. A ingratidão, o esquecimento, a insensibilidade são os sentimentos mais abundantes no comércio em que os interesseiros se abastecem de víveres com os quais continuam a perseguir o poder e a cultivar os seus transitórios exercentes.

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José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-Graduação da Uninove, presidente da Academia Paulista de Letras (APL)

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