O fariseu e o publicano

Tarcisio Angelo Mascarim

Hoje vou falar aos nossos leitores de alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam aos outros.

O fariseu, posto em pé, orava dentro de si dessa forma: “Ó Deus graças te dou que não sou como os demais homens, que são ladrões, injustos, adúlteros, nem ainda como este publicano, jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho”.

O publicano, porém, estando a alguma distância, não ousava nem ainda levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: “Ó Deus sê propício a mim pecador”.

Dando continuidade ao tema deste artigo, aproveito uma mensagem do nosso Papa Francisco publicada no site Aleteia.org em 27 de outubro de 2019, com o título “Papa: peçamos a Jesus que nos cure de criticar e queixar dos outros”:

“Que nos cure ‘de desprezar seja quem for: são coisas que desagradam a Deus’.

O Papa Francisco indicou que cada um de nós peça a Jesus que nos cure de criticar e queixar dos outros, e também nos cure de desprezar seja quem for, pois essas são coisas que desagradam a Deus.

O Papa falou tais palavras na homilia da missa de encerramento do Sínodo Amazônico, neste domingo (27/10), na Basílica de São Pedro.

O Pontífice iniciou sua homilia dizendo que, neste domingo, ‘a Palavra de Deus nos ajuda a rezar por meio de três personagens: na parábola de Jesus, rezam o fariseu e o publicano; na primeira Leitura, fala-se da oração do pobre’.

Em sua oração: ‘o fariseu vangloria-se porque cumpre do melhor modo possível preceitos particulares, mas esquece o maior: amar a Deus e ao próximo. Transbordando de confiança própria, da sua capacidade de observar os mandamentos, dos seus méritos e virtudes, o fariseu aparece centrado apenas em si mesmo’.

O drama desse homem é que vive sem amor. Mas, sem amor, até as melhores coisas de nada seriam, como diz São Paulo. E, sem amor, qual é o resultado? No fim das contas, em vez de rezar, elogia-se a si mesmo. De fato, não pede nada ao Senhor, porque não se sente necessitado nem em dívida, mas com crédito. Está no templo de Deus, mas pratica outra religião, a religião do ‘eu’. Muitos grupos ilustres, cristãos católicos, vão por esta estrada.

E, além de Deus, o fariseu esquece o próximo, o despreza, ou seja, não lhe dá valor. Considera-se melhor que os outros designados por ele como ‘o resto, os restantes’.

Em outras palavras, são ‘restos’, descartados dos quais manter-se à distância. Quantas vezes vemos acontecer esta dinâmica na vida e na história! Quantas vezes quem está à frente, como o fariseu relativamente ao publicano, levanta muros para aumentar as distâncias, tornando os outros ainda mais descartados.

Ou então, considerando-se atrasados e de pouco valor, despreza as suas tradições, cancela suas histórias, ocupa os seus territórios e usurpa os seus bens. Quanta superioridade presumida, que se transforma em opressão e exploração, ainda hoje! Vimos isso no Sínodo quando falamos sobre a exploração da Criação, das pessoas, dos habitantes da Amazônia, do tráfico de pessoas e do comércio de pessoas!

Segundo o Papa, ‘os erros do passado não foram suficientes para deixarmos de saquear os outros e causar ferimentos aos nossos irmãos e à nossa irmã terra: vimos isso no rosto desfigurado da Amazônia’.

A ‘religião do eu’ continua hipócrita com os seus ritos e as suas ‘orações’, porém, muitos são católicos, se confessam católicos, mas se esqueceram de ser cristãos e humanos, esquecida do verdadeiro culto a Deus, que passa sempre pelo amor ao próximo. Até mesmo os cristãos que rezam e vão à missa aos domingos são seguidores dessa ‘religião do eu’. Podemos olhar para dentro de nós e ver se alguém, para nós, é inferior, descartável… mesmo só em palavras.

Rezemos pedindo a graça de não nos considerarmos superiores, não nos julgarmos íntegros, nem nos tornarmos cínicos e escarnecedores. Peçamos a Jesus que nos cure de criticar e queixar dos outros, de desprezar seja quem for: são coisas que desagradam a Deus. Provavelmente, hoje nos acompanham nesta missa não apenas os indígenas da Amazônia: mas também os pobres das sociedades desenvolvidas, os irmãos e irmãs doentes da Comunità dell’Arche. Estão conosco.

A oração do publicano nos ajuda a compreender o que é agradável a Deus. Ele não começa pelas suas virtudes, ‘mas pelas suas faltas; não pela riqueza, mas pela sua pobreza: não uma pobreza econômica, os publicanos eram ricos  e cobravam também injustamente às custas de seus compatriotas, mas uma pobreza de vida, porque no pecado nunca se vive bem’.

Segundo Francisco, ‘aquele homem reconhece-se pobre diante de Deus, e o Senhor ouve a sua oração, feita apenas de sete palavras, mas de atitudes verdadeiras. De fato, enquanto o fariseu estava à frente, de pé, o publicano mantém-se à distância e ‘nem sequer ousava levantar os olhos ao céu’, porque crê que o Céu está ali e é grande, enquanto ele se sente pequeno. E ‘batia no peito’, porque no peito está o coração’.

A sua oração nasce do coração, é transparente: coloca diante de Deus o coração, não as aparências. Rezar é  deixar-se olhar dentro por Deus sem simulações, sem desculpas, nem justificações. Porque, do diabo, vêm escuridão e falsidade; de Deus, luz e verdade. Foi bom, e lhes agradeço, queridos padres e irmãos sinodais, termos dialogado, nestas semanas, com o coração, com sinceridade e franqueza, colocando fadigas e esperanças diante de Deus e dos irmãos.

O Papa sublinhou que através do publicano, ‘descobrimos o ponto de onde recomeçar: do fato de nos considerarmos, todos, necessitados de salvação. É o primeiro passo da religião de Deus, que é misericórdia com quem se reconhece miserável. Considerar-se justo é deixar Deus, o único justo, fora de casa’.

Jesus faz um confronto entre as atitudes da pessoa piedosa e devota de então, o fariseu, e o pecador público por excelência, o publicano. ‘E a sentença final inverte as coisas: quem é bom, mas presunçoso, falha; quem é deplorável, mas humilde, acaba exaltado por Deus. Se olharmos para dentro de nós com sinceridade, vemos os dois em nós: o publicano e o fariseu. Somos um pouco publicanos, porque pecadores, e um pouco fariseus, porque presunçosos, capazes de nos sentirmos justos, campeões na arte de nos justificarmos! Isto, com os outros, muitas vezes dá certo; mas, com Deus, não’.

Peçamos a Deus ‘a graça de nos sentirmos necessitados de misericórdia, pobres intimamente. Por isso, faz-nos bem frequentar os pobres, para nos lembrarmos que somos pobres, para nos recordarmos de que a salvação de Deus só age num clima de pobreza interior’.

O Livro do Eclesiástico fala que a oração do pobre ‘chegará até as nuvens’. ‘Enquanto a oração de quem se considera justo fica por terra, esmagada pela força de gravidade do egoísmo, a do pobre sobe, direta, até Deus. O sentido da fé do Povo de Deus viu nos pobres ‘os porteiros do Céu’: são eles que nos abrirão, ou não, as portas da vida eterna; eles que não se consideraram senhores nesta vida, que não se antepuseram aos outros, que tiveram só em Deus a sua própria riqueza. São ícones vivos da profecia cristã’.

Neste Sínodo, tivemos a graça de escutar as vozes dos pobres e refletir sobre a precariedade de suas vidas, ameaçadas por modelos de progresso predatórios. E, no entanto, precisamente nesta situação, muitos nos testemunharam que é possível olhar a realidade de modo diferente, acolhendo-a de mãos abertas como uma dádiva, habitando na criação, não como meio a ser explorado, mas como casa a ser protegida, confiando em Deus. Ele é Pai e ‘ouvirá a oração do oprimido’. Quantas vezes, mesmo na Igreja, as vozes dos pobres não são ouvidas, acabando talvez desprezadas ou silenciadas porque incômodas.

Francisco concluiu, dizendo que devemos rezar ‘pedindo a graça de saber ouvir o grito dos pobres: É o grito de esperança da Igreja. Assumindo nós o seu grito, temos a certeza de que a nossa oração atravessará as nuvens.’”

          Aí estão, portanto, os ensinamentos para ganharmos a vida eterna.

 ______

Tarcisio Angelo Mascarim é sócio e administrador da Mascarim & Mascarim Sociedade de Advogados (mais artigos no tarcisiomascarim.blogspot.com)

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima