Vitor Pires Vencovsky
O agronegócio exportador que conhecemos atualmente teve início na década de 1970. Foi um movimento motivado, principalmente, pela necessidade do Japão em encontrar novas áreas no mundo para a produção de soja. Até então dependentes da importação da soja americana, encontraram no Cerrado brasileiro o local ideal para expandir a oferta mundial dessa fonte de proteína vegetal.
A partir de um acordo bilateral, os governos brasileiro e japonês deram início a diversos programas e projetos estatais, como o Prodecer – Programa de Cooperação Técnica Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento do Cerrado, envolvendo grandes investimentos de bancos do Japão. Para coordenar esse programa, foi criada, em 1978, a empresa Campo – Companhia de Promoção Agrícola. A implantação do Prodecer foi realizada em etapas, entre 1979 e 2001. Diversas instituições de ensino e pesquisa, como a Embrapa, também contribuíram para o desenvolvimento da soja no país.
A partir da criação do Prodecer, o volume produzido de soja dobrou a cada 10 anos, passando de 9,5 milhões (1978) para 117 milhões de toneladas (2018). As exportações, entre 1998 e 2018, passaram de 9 milhões para 83 milhões de toneladas. Nas décadas de 1970 e 1980, já iniciavam as discussões sobre a construção da Ferronorte, pelo empresário Olacyr de Moraes, considerado à época o “rei da soja”, e da Ferrovia Norte Sul, pelo presidente maranhense José Sarney, duas obras voltadas para o transporte de soja produzida no Cerrado. A Lei Kandir, de 1996, também favoreceu o setor sojícola, já que passou a isentar as exportações de soja e seus derivados do imposto estadual ICMS.
Esse movimento, iniciado na década de 1970, mostra que o agronegócio é muito mais do que uma atividade que envolve produção, processamento e comercialização de produtos agrícolas. É uma realidade política, econômica e social que contribuiu para a mudança da participação do país na divisão internacional do trabalho. A partir desse momento, portanto, inicia-se um processo em que prevalece a exportação de commodities agrícolas e minerais, ou seja, de produtos de baixo valor agregado e alto volume. Verifica-se o início da primarização da pauta de exportação do país, ou seja, a exportação de produtos industrializados e de maior valor agregado passa a perder espaço para as commodities.
Alguns analistas, inclusive, estão questionando se o Brasil não está se tornando colônia novamente. A preferência pela exportação de commodities faz relembrar a discussão sobre o Sentido da Colonização de Caio Prado Júnior, assunto de seu livro Formação do Brasil Contemporâneo, de 1965. Para este historiador, a sociedade brasileira, de uma forma geral, se organizou, desde o seu descobrimento, de forma dependente para atender interesses externos através da produção e exportação de produtos primários.
A participação do país no comércio internacional passa a seguir um caminho contrário ao verificado nas principais economias mundiais, que são reconhecidamente exportadoras de tecnologia e conhecimento. O processo de industrialização no país, iniciado em 1930 a partir dos programas de substituição de importações, parece ter chegado ao fim.
Vitor Pires Vencovsky é presidente da Academia Piracicabana de Letras – [email protected]