Adelino Francisco de Oliveira
Com as intensas chuvas ocorridas no mês de fevereiro, muitas cidades, de diversos Estados do Brasil, têm sofrido com situações de alagamentos. As notícias chegam a ser assustadoras. Os alagamentos podem provocar sérios prejuízos materiais, além de propagar doenças e avançar em graves perdas humanas. A cidade de Piracicaba anualmente tem convivido com esse drama urbano, que as vezes parece não ter solução.
É natural que um rio, em períodos sazonais de maior quantidade de chuvas, passe por enchentes. Aliás é até bonito e inspirador ver um rio cheio, com suas águas caudalosas. O rio Piracicaba fica bem mais exuberante em seu tempo de cheia. O problema social é quando as cheias do rio, as enchentes, se transformam em alagamentos, gerando graves dificuldades para o cotidiano da vida na cidade.
As chuvas em excesso e fora de período é um dos resultados do aquecimento global. A grande concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, aliada a uma violenta dinâmica de desmatamento, é o que tem gerado o aumento da temperatura do planeta. A noção de progresso e desenvolvimento, sem cuidado e atenção ao meio ambiente, tem produzido resultados devastadores. O desequilíbrio climático pode tanto levar a temporais intensos e inesperados, causando alagamentos, quanto a períodos de terríveis secas. Com a perda da sazonalidade do ciclo da água, fica muito difícil implementar medidas preventivas, levando a uma situação delicada que pode ficar fora controle.
Ao processo de aquecimento global, soma-se o avanço de um modelo de urbanização que promoveu a expansão sem planejamento das cidades, destruindo as matas ciliares, retificando o curso e canalizando os rios. Diante de fortes e impetuosas chuvas, sem ter como escoar na impermeabilidade de asfaltos e estruturas de concreto, só resta às águas dos rios invisíveis avançarem pelas ruas, levando pessoas e animais, invadindo casas, arrastando carros, devastando tudo que encontram pela frente, provocando verdadeiro caos urbano.
A solução mais comum apresentada pelo poder público tem sido a construção de imensas estruturas de concreto, os chamados piscinões. Mas esta é uma falsa solução, pois além dos elevados custos de construção e manutenção, os piscinões acabam sendo, nos períodos de seca, espaços socialmente inutilizáveis e verdadeiros reservatórios de lixo, exigindo uma zeladoria constante, que nem sempre o poder público consegue efetivar. Os piscinões representam mais cimento e concreto, em uma paisagem já com tanta escassez de áreas verdes.
Apesar da gravidade do problema social dos alagamentos, existem soluções viáveis e interessantes, que inclusive podem promover uma melhora na qualidade de vida dos cidadãos. A recuperação dos espaços de natureza – criação de jardins de chuva; construção de canais para a infiltração de água; instalação de telhados verdes; implementação de estruturas de drenagem etc – é a base para se equacionar todo o problema. Há toda uma gama de estratégias tecnológicas produzidas, a partir de concepções ecológicas, com a finalidade de reduzir ao máximo o drama dos alagamentos urbanos.
É imprescindível se repensar o padrão de progresso urbano, de maneira a alcançar um desenvolvimento sustentável, minimizando ao máximo os impactos da ação humana sobre a natureza. A ecologia integral, ao estabelecer uma relação de equilíbrio, cuidado e complementariedade entre vida humana e meio ambiente, desponta como a referência fundamental para uma outra concepção de desenvolvimento. As condições objetivas que possibilitam a vida no planeta é que estão em jogo. A questão ambiental é imperativa, sem avançar para a transição ecológica a humanidade fatalmente encontrará seu ocaso. Fundamental é cuidar de um mundo onde todos – vida humana, flora e fauna – caibam de forma indistinta, solidária, cooperativa e fraterna.
Adelino Francisco de Oliveira, Doutor em Filosofia, Mestre em Ciências da Religião, professor de Ética e Filosofia, Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba; [email protected]