Vitor Pires Vencovsky
A visita da ministra da agricultura Tereza Cristina em Piracicaba para a formatura de alunos da Esalq no início do ano teve grande repercussão na mídia por conta do pronunciamento crítico de uma aluna ao atual governo. Este acontecimento indica que a sociedade brasileira não entende o real significado do agronegócio. O senso comum procura simplificar o assunto numa frase, destacando os pontos positivos relacionados à participação do setor no PIB nacional, na geração de empregos e na pauta de exportações. Mas o agronegócio é uma realidade muito mais complexa. Uma de suas características mais marcantes é a desigualdade de situações e relações, com particularidades regionais que dificultam afirmar que existe apenas um agronegócio no país.
Dados apresentados no Censo Agropecuário de 2017, por exemplo, mostram que 2% dos estabelecimentos agropecuários no país representa 58% da área total e 50% do valor total da produção. Uma busca pela palavra agronegócio no Google Imagens apresenta muitas fotos de plantações, agricultores e tratores trabalhando a terra. Apesar disso, o PIB do agronegócio, elaborado pelo Cepea/Esalq-USP, mostra que apenas 24% desse indicador está relacionado a atividades dentro da porteira. A maior parte deste PIB está nas atividades da indústria, transporte, comercialização e fornecimento de insumos e serviços, ou seja, fora da porteira. Os 5 milhões de estabelecimentos agropecuários, portanto, não participam da fatia maior do PIB do agronegócio.
O sistema Comex Stat, elaborado pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), apresenta uma série de dados sobre a participação do agronegócio na balança comercial brasileira. A soja, com 12% do total, foi o produto mais exportado pelo país em valor em 2019. Desse total, 78% teve como destino a China. O que estes números não mostram, no entanto, é que a participação do país no comércio internacional é insignificante, por volta de 1,2%, e o mercado nacional é fechado e restrito às trocas comerciais. Nas últimas décadas, o país tem privilegiado a exportação de commodities e a importação de produtos de alto valor agregado. É mais ou menos desta forma que está definido o acordo de livre comércio firmado recentemente entre Mercosul e União Europeia.
Dados da série Produção Agrícola Municipal, organizada pelo IBGE, mostram a realidade da agricultura brasileira quanto à área plantada e colhida e quantidade produzida de praticamente todos os produtos agrícolas. Verifica-se, por exemplo, que, nos últimos anos, os produtores brasileiros estão deixando de produzir produtos agrícolas da cesta básica brasileira, como feijão, arroz e mandioca, para dar preferência à produção de produtos exportáveis, como cana-de açúcar (açúcar), soja, milho e algodão. Essa preferência coloca em dúvida o papel do agronegócio para o país.
As considerações apresentadas acima procuram mostrar que o agronegócio é uma realidade complexa que só pode ser entendido quando analisado através de diversas perspectivas e áreas do conhecimento. As discussões não podem ficar restritas a dados simplistas e limitados a determinados interesses.
Vitor Pires Vencovsky, presidente da Academia Piracicabana de Letras; [email protected]