Existem contradições nos ensinamentos de Jesus?

Álvaro Vargas

 

Nos evangelhos existem citações atribuídas a Jesus que se interpretadas em seu sentido literal não condizem com a conduta e ensinamentos que Ele nos legou que sempre foram a de amor, caridade e perdão. Como Jesus nada deixou escrito, todas as informações são baseadas em interpretações de seus seguidores que relataram fatos que nem sempre presenciaram. Além disto, a limitação de linguagem e traduções ao longo dos séculos embora tenham mantido o aspecto moral dos ensinamentos do Mestre, apresentam possíveis contradições que necessitam ser mais bem interpretadas. Por exemplo, quando Jesus mencionou que “é mais fácil um camelo passar por um buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus” (Lucas, 18:24-25) nitidamente podemos entender que é mais razoável Ele ter se referido a uma corda (de pelo de camelo) do que o próprio animal. Ciente das limitações da linguagem, em duas oportunidades o apóstolo Paulo ressaltou a importância de ser evitada apenas uma visão literal (baseada no formalismo das letras) das escrituras e disse “A letra mata e o espírito vivifica” (2 Coríntios 3, 6) e “Para que sirvamos em novidade de Espírito e não na velhice da letra” (Romanos, 7:6), um aspecto ainda pouco explorado pela maioria das correntes religiosas que seguem o cristianismo.

Outro ponto a ser considerado é que para compreender as escrituras apenas à análise racional não é suficiente. Em um diálogo de Jesus com Nicodemos (fariseu, membro do Sinédrio) conforme registrado pelo espírito Humberto de Campos (Boa Nova, médium Chico Xavier), o doutor da lei perguntou qual recurso ele deveria usar para conhecer o Reino de Deus. Jesus o orientou deveria antes de raciocinar deveria sentir os textos analisados. Assim, a interpretação das escrituras deve ir além da letra e ser considerado o espírito da mensagem que foi transmitida, sendo, portanto, necessário o desenvolvendo dos nossos sentimentos além do conhecimento sobre a matéria. Desta forma, citações como “aquele dentre vós que não renunciar a tudo que tem não pode ser meu discípulo” (Lucas, 14;33) está se referindo ao apego excessivo que a maioria da humanidade demonstra aos bens materiais em detrimento da transformação moral. Todos nós temos responsabilidades profissionais e familiares que devem ser respeitadas, e abandonar tudo isto seria uma irresponsabilidade. Em outra citação “Se alguém vem a mim e não odeia seu pai, sua mãe não é digno de mim” (Lucas, 14:26), a palavra “odiar” deve ser substituída por “gostar menos” o que deixa este ensinamento coerente com o primeiro dos “dez mandamentos” (amar a Deus sobre todas as coisas). Na passagem “Deixe que os mortos enterrem os seus mortos e você vá e anuncie o Reino de Deus” (Lucas, 9:59-60) Jesus com certeza respeitaria o dever de um filho em enterrar o pai, mas aproveitou para fazer uma exaltação sobre a necessidade de despertamos a nossa espiritualidade em contraste com o “mortos” (sem ideais nobres).

Em outras duas citações atribuídas a Jesus que se forem interpretadas “ao pé da letra”, soam como de um guerreiro indo para uma batalha: “Não penseis que eu tenha vindo trazer paz à Terra; não vim trazer a paz, mas a espada. Vim para lançar fogo à Terra; e o que desejo senão que ele se acenda” (Mateus, 10:34-36). A história demonstra que as ideias renovadoras sempre encontram resistências e o caso do cristianismo, mesmo se tornando uma religião difundida em todo o mundo a interpretação equivocada dos ensinamentos de Jesus gerou muitas guerras (cruzadas, guerras entre católicos e protestantes), com a perseguição e tortura de muitos inocentes (inquisição). Sabendo das limitações humanas Jesus na antiga Palestina prometeu que enviaria o Consolador (João, 14:16-28) que no tempo devido iria corrigir e esclarecer melhor os Seus ensinamentos que é justamente o Espiritismo, conforme codificado por Allan Kardec. De fato, o estudo da doutrina espírita permite compreender de forma correta mensagem de Jesus.

 

Alvaro Vargas, engenheiro agrônomo, Ph.D, presidente da USE-Piracicaba, palestrante e radialista espírita

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